Capítulo 3
Operação na Favela
*Dante*
Sou despertado pelo barulho infernal do meu celular. Tapo os ouvidos com o travesseiro, xingando:
— Droga, que despertador insuportável!
Levanto rápido e verifico a hora. Estou com uma dor de cabeça desgraçada, consequência das doses de whisky que bebi na noite anterior. Depois daquela transa incrível com aquela mulher, peguei um carro de aplicativo e voltei pra casa. Não comi nada desde a noite passada, e minha barriga ronca como um leão faminto.
Entro no chuveiro e, enquanto a água escorre pelo meu corpo, penso nela. Imagino-a aqui comigo, cada curva, cada toque. Sem nem perceber, minha mão desliza pelo corpo, e meu membro desperta novamente só de pensar nela. Balanço a cabeça, tentando afastar a tentação, e desligo o chuveiro.
Escovo os dentes e vou até a cozinha. Esquento um café e me sirvo de uma xícara. O líquido amargo ajuda a me manter desperto. Pego minha mochila e minha arma, tranco o apartamento e desço pelo elevador. Cumprimento o porteiro com um aceno rápido, entro no carro e, antes de dar partida, tomo um comprimido para aliviar a dor de cabeça.
Poucos minutos depois, chego à sede da PM. Estaciono na garagem e vou direto para o vestiário masculino. Troco de roupa rapidamente e sigo para a minha sala. Assim que entro, dou de cara com Juliano, que me encara como se quisesse me matar.
— Cara, você é doido? — dispara.
— Bom dia para você também.— Dou uma risada.— Agora me diz: por que sou doido? — Juliano cruza os braços irritado.
— Você sumiu no meio de um evento suspeito!
— Quando eu te explicar, você vai entender.— Dou de ombros, tentando não dar muita importância.— Relaxa, não tem graça se estressar agora.
Juliano balança a cabeça, claramente impaciente.
— Nosso alvo estava naquela droga de leilão, e você sumiu!
— Eu estava com uma gata... que também estava na festa.—Sorrio de canto— Mas depois te conto essa parte. Agora, o que temos para hoje?
Ele vira o monitor para mim e aponta no mapa os locais suspeitos onde faremos a ronda.
— Certo, vamos nessa.
Pegamos nossas armas e saímos para a operação. Depois de algumas horas, chegamos ao nosso destino e começamos o trabalho. Durante a ação, conseguimos fazer algumas prisões importantes. No meio da confusão, um suspeito tentou fugir, mas foi capturado a tempo.
De volta à sede da PM, por volta do meio-dia, parabenizo a equipe pelo trabalho bem-feito e sigo com Juliano para almoçar.
Chegando no restaurante, sentamos em uma mesa afastada, fazemos nossos pedidos e enquanto esperamos a comida, ele não aguenta a curiosidade.
— Agora fala aí, Dante. Como foi a história dessa gata no leilão?—Sorrio, lembrando-me de cada detalhe.
— Cara, foi diferente — começo, e já vejo o brilho de curiosidade nos olhos dele. — Não sei explicar. Ela não é como as outras, entende? A mulher tem personalidade.
— Ihh, isso está com cara de encrenca. — Juliano solta uma gargalhada, batendo a mão na mesa. — Fala aí, o que ela fez para mexer contigo?
Rio junto, balançando a cabeça enquanto lembro da cena.
— Primeiro que ela me deu um fora logo de cara. Não aceitou eu pagar uma bebida para ela e nem aceitou dançar comigo de primeira. Acredita?Juliano cai na gargalhada, se divertindo às minhas custas.
— Ah, já gostei dela. O grande Dante Mendonça é rejeitado pela primeira vez, essa é muito boa.
— A cara vou parar de falar, se vai ficar tirando sarro da minha cara. — Ele logo pára de gargalhar e pede para eu continuar.
— A gente dançou como se não existisse amanhã. Cara, que química maluca foi aquela... — solto o ar, como se ainda estivesse tentando entender. — Depois fomos para o motel e foi quente, mano. Uma química fora do normal. Desde o toque até o jeito dela falar no meu ouvido.
— Parabéns, parceiro. Tá lascado.— Juliano sacode a cabeça, sorrindo.— Nunca vi você falar desse jeito de uma mulher.
— Foi só uma noite, só isso.— Dou de ombros, tentando minimizar.
— Só uma noite, é? — Ele arqueia a sobrancelha, cheio de ironia. — Não pareceu “só uma noite” pra você.
— Foi diferente, tá? Ela me rejeitou e eu tomei isso como um desafio. E você sabe que eu adoro um desafio. Foi gostoso, nos curtimos e é isso. Não sei nada dela e ela não sabe nada de mim, apenas um nome e uma profissão. — Dou um gole na água tentando encerrar o assunto.
— Como assim vocês não trocaram número?— Juliano me encara, claramente duvidando.
— Como falei para você cara, foi só uma noite, nada além disso. Você sabe muito bem que meu coração está fechado para esses sentimentos. Agora vamos almoçar que eu estou com muita fome.
Encerro o assunto, mas sei que essa ruiva gostosa não vai sair assim fácil da minha cabeça.
Rayana
O som de batidas fortes na porta me desperta de repente. Pego o celular e vejo a hora. Droga, já são quase duas da tarde. Inferno!
Levanto apressada, visto uma camisola de seda e abro a porta. Dou de cara com Pedro, que me encara com um sorriso irônico.
— Eita, coisa boa é ser chefe, hein? Acorda a hora que quer... — Faço uma careta e tento me desculpar.
— Desculpa, Pedro. Aconteceu alguma coisa? Acabei perdendo a hora.— Ele balança a cabeça.
— Nada grave, mas os tiras fizeram algumas prisões agora há pouco aqui na área.
— Vixe... Pegaram algum dos nossos? — pergunto, apreensiva. Pedro faz que sim com a cabeça.
— O Coringa rodou. Tentou fugir, mas não deu tempo.
Olho ao redor, observando o luxo que me cerca. Cada detalhe deste lugar foi bancado com o dinheiro do tráfico de armas, volto à realidade pela voz de Pedro:
— Ei, tô falando com você!
— Ah... Perdão, estava pensando. — Respondo, tentando disfarçar. — E meu pai? Onde ele está?
— Saiu cedo, mas disse que não vai demorar.
— Eu vou fazer o almoço agora, se quiser pode almoçar aqui. — Falo indo para a cozinha.
— Hoje não gata, vou resolver umas paradas, depois conversamos.—Digo para ele fechar a porta quando sair.
Sozinha na cozinha, começo a preparar meu almoço. Nada chique: só uma salada rápida e um frango grelhado. Enquanto mexo a panela, os pensamentos voltam pra ontem à noite sem que eu queira. Lembrar do Marcelo é automático. É como se ele ainda estivesse, grudado em mim.
O toque firme das mãos dele, a boca quente explorando cada pedaço do meu corpo, e aquelas palavras baixas no meu ouvido... Puta que pariu, era impossível não arrepiar. O jeito como ele me tocava parecia coreografado. Como se soubesse exatamente onde e como mexer pra me deixar sem ar. Foi tudo intenso demais, cada movimento encaixado como uma dança.
— Putz, Rayana... Para com essa porra. — Resmungo, balançando a cabeça, como se eu pudesse desligar meus pensamentos na marra.
Ele não sabe meu nome. Pra ele, eu sou só a Núbia. A advogada misteriosa que apareceu do nada, dançou, teve uma transa e foi embora como quem não queria nada. E é isso que vai ficar. Não tem por que ficar me remoendo por causa de um cara que nem sabe quem eu sou de verdade. Foi só uma noite. Uma noite diferente, sim, mas ainda assim... Só uma noite.
Dou mais uma garfada na comida, tentando me convencer, mas minha mente insiste em imaginar se ele tá pensando em mim também. Ou será que eu fui só mais uma pra ele? Talvez ele nem lembre mais.
Levanto da mesa com um suspiro irritado. Preciso parar com essa viadagem. Nunca fui de me apegar a macho nenhum e não é agora que vou ficar emocionada por causa de uma transa. Que porra é essa, Rayana? Acorda pra vida, mulher.
Enquanto estou organizando a cozinha penso na minha vida, minha casa fica no topo do morro, olho ao redor, a decoração é impecável, os móveis caros, as paredes de vidro que deixam a vista da cidade à mostra... Tudo isso é resultado do mundo em que vivo. O luxo proporcionado pelo crime.
Pergunto-me, como já fiz tantas outras vezes, se vale a pena continuar. Tudo parece perfeito por fora, mas, por dentro, sinto um vazio que o luxo não preenche.
É engraçado. Tanta gente daria tudo pra ter uma vida assim: cercada de luxo, poder e conforto. Mas, pra viver nesse mundo, tem que estar preparado pra qualquer coisa. Às vezes, você dorme e não acorda, e em outras, nem sequer consegue dormir. Quando fecho a porta do meu quarto e fico sozinha, a sensação é sempre a mesma: um vazio desgraçado, como se nada disso realmente fizesse diferença.
Termino de arrumar a cozinha, olho o celular e caraca já são quase cinco da tarde. O tempo passou voando, e eu nem percebi. Subo para o quarto, troco de roupa e desço para a minha academia no subsolo. Preciso me mexer, suar e expulsar esses pensamentos para fora da minha cabeça.
Na academia, coloco meus fones e ligo a esteira. A música começa a tocar, e logo me perco no ritmo da corrida. O corpo se movimenta, mas minha mente vai para ele, “Marcelo”.
Corro mais rápido, como se isso pudesse afugentar a memória do toque dele.
— Esquece ele, Rayana. Foi só uma noite. — Falo pra mim mesma, o som da minha voz abafado pela música nos fones.
Eu não sou dessas que se emociona por qualquer coisa. Não nasci pra isso. Viver no topo do morro me ensina a ser prática, a não me deixar levar por sentimentos que só fazem a gente se ferrar. Não vou dar espaço pra ele na minha cabeça.
Corro mais um pouco, sentindo o suor escorrer e o corpo leve de novo. Quando eu terminar aqui, a lembrança dele vai ser só mais uma entre tantas. E a vida segue.
