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Um tempo depois

Parte 3...

* Cinco anos depois...

— Como você pode ficar tão calma, Carla?

— O que posso fazer, Vanessa? – ela passou o braço pelo braço da amiga que estava muito nervosa — Se forem nos despedir não há muito a fazer, a não ser procurar outro emprego.

— Você diz isso porque ainda é jovem. Eu já tenho cinquenta e dois anos e três filhos.

— Não esqueça de que também sou mãe.

— Eu sei, mas seu trabalho é mais importante que o meu.

— Discordo disso – ela balançou a cabeça — A agência precisa de todos para funcionar.

— Mas você tem mais chances de ficar do que eu. Além disso, você arranja um bom casamento em um estalar de dedos.

— Não, obrigada! – ela riu enquanto iam em direção ao auditório.

Vanessa se tornara uma excelente amiga desde que se conheceram, três anos atrás. Mudou para um condomínio de pequenas casas logo que começou a trabalhar na agência de propaganda. Foi difícil conseguir essa vaga e teve que fazer um estágio antes.

Um dos problemas era a distância de seu antigo apartamento, por isso se mudou. A casa era pequena, porém aconchegante.

Conseguiu uma vaga na creche próxima do trabalho e eles eram muito cuidadosos com Leonardo.

Seu filho lindo, perfeito e tão amado.

O pai nem sabia de sua existência e talvez se soubesse não fosse querê-lo.

Luís a abandonara para nunca mais. Quando ele se foi dizendo que ligaria para ela foi uma mentira.

Ficou triste quando tentou encontrá-lo e soube que nem mesmo existia. Tinha sido uma tola, mas não podia reclamar de tudo, afinal ela tinha seu Leo.

— Dizem que o novo dono é um pedaço de mau caminho – Vanessa deu uma risadinha.

— Você está por dentro de tudo – riu baixinho, passando por um grupo.

— Claro! Assim eu sei que você tem pretendentes aqui na empresa.

— Dispenso – balançou a cabeça — Não preciso de marido. Minha vida está boa do jeito que está.

— Poderia pelos menos namorar – insistiu.

— Não! – disse firme — Minha dedicação e meu tempo é com meu filho. Sabe disso.

— Você é uma excelente mãe. Poucas mulheres consegue fazer o que você faz. Poderia relaxar um pouco.

— Obrigada, eu tento ser uma boa mãe – suspirou — E só isso já está bom pra mim.

— Vamos meninas, estão nos esperando no auditório – um colega passou rápido.

— Uh, obrigada pelo menina – Vanessa riu.

Carla estava concentrada em analisar como faria, caso o novo dono mudasse algo na agência ou até mesmo a demitisse. Leonardo já estava tão habituado à vida que tinha, aos coleguinhas na escola e nos vizinhos que brincavam com ele. Era uma criança maravilhosa, inteligente e feliz. Não queria que isso mudasse. Gostava da vida que tinha agora.

Se as coisas mudassem muito na empresa, talvez fosse necessário rever seus planos de novo e recomeçar.

*** ***

— Lá vem ele – Vanessa a cutucou.

Carla ouviu vozes de um grupo que se aproximava e olhou para trás. Deu graças a Deus por estar sentada.

O homem que entrava no auditório era ninguém menos que Luís Amparo, o pai do seu filho. Sentiu o coração apertar com o susto e segurou a mão de Vanessa com força.

— O que foi? – olhou a amiga — Você está pálida, Carla.

— Acho... Acho que não vou ficar para ouvir o discurso – engoliu em seco.

— Mas é importante para nós – cochichou.

— Eu sei que é – respirou fundo — Mas... Eu me sinto mal.

— Eu vou com você – pegou a bolsa.

— Não... não precisa – olhou para o palco montado — Já começaram a falar. Vou beber água e me sentar para tomar um pouco de ar. Daqui a pouco estou bem de novo.

— Certeza? – perguntou preocupada.

— Claro. Preste atenção e depois me conta tudo - tentou sorrir, sem sucesso.

Marco estava no início do discurso de apresentação das novas mudanças que seriam implantadas na agência, quando viu uma pessoa se levantar e deixar o auditório.

Chamou sua atenção o cabelo e o modo de andar. Hesitou um instante e a mulher olhou para trás. Seu corpo inteiro estremeceu.

Era Carla quem deixava o local.

Piscou os olhos para se certificar de que não estava vendo um fantasma do passado. Seu coração gelou.

Sua mente quase perdeu o foco do assunto e terminou o discurso como um robô, apenas lendo o que tinha escrito para a ocasião e depois aguardou ansioso até que o final chegasse para poder sair.

Seus pensamentos voltaram aos dias em que passou ao lado dela e em tudo o que o fez sentir.

Foi a única vez em que foi realmente feliz, antes de tudo virar de cabeça para baixo e ele ser obrigado a deixar sua vida pessoal em terceiro plano. Como sempre.

Quando voltou às pressas para casa, abandonou a única mulher que o quis por ele mesmo e não por sua herança.

Sentiu remorso durante anos por nunca ter procurado por ela de novo, mas se enfiou de cabeça nos problemas da família.

Não pôde nem mesmo se despedir do pai. Quando chegou ao hospital na Itália ele já havia morrido, apesar de todo esforço da equipe médica.

Os ferimentos causados pelo acidente foram muito profundos e não conseguiram salvá-lo, infelizmente.

Sua mãe também estava em cirurgia há horas. No final ele teve que cuidar da mãe que ficou em coma durante longos oito meses e mais um período de recuperação no hospital e em casa.

Somado a isso teve que assumir a direção dos negócios e lidar com todo o estresse e problemática causada pelo falecimento do seu pai. Muitas coisas aconteceram ao mesmo tempo.

Foi um período pesado em sua vida e tudo o que ele tinha eram as lembranças boas ao lado de Carla.

Contudo ele nunca voltou a procurá-la, não se sentia o mesmo de antes e não queria que se envolvesse na bagunça que se tornara sua vida, ainda que soubesse que tinha perdido a melhor coisa que lhe acontecera. Foi doloroso demais.

Quando tudo acabou e os funcionários deixaram o auditório ele chamou o gerente geral da agência e pediu os arquivos dos funcionários.

— Busca alguém em especial? – Ricardo perguntou.

— Não realmente – mentiu — Gosto de conversar com alguns funcionários para me enturmar com o que eles esperam da nova direção.

— Ah, isso é ótimo! Muitos deles ficaram com medo de perder o emprego.

— Não pretendo despedir ninguém. A agência trabalha muito bem.

— Obrigado. Será bom que ele saibam disso direto por você.

— Vi uma mulher sair do auditório no começo da apresentação.

— Carla. Infelizmente se sentiu mal – fez um gesto com a cabeça — É uma pessoa maravilhosa e uma excelente funcionária. Ela é muito querida aqui. Trabalha como assistente de imagens e vídeos. Quer que a chame?

— Sim, por favor. Mande-a até minha sala – se fez de calmo, mas estava com os batimentos a mil por hora.

Ele precisava se explicar para ela, mas sabia que talvez não o quisesse mais.

Mas essa chance surgiu sem que ele esperasse e agora estava nervoso, mas ao mesmo tempo, feliz por poder reencontrar a pessoa que fez seu verão ter sido o melhor de todos, ainda que ele tivesse cortado isso.

Mas a vida é assim, as coisas acontecem sem que a gente espere e nem sempre temos o controle de tudo.

Se ele entendeu isso, ela poderia entender também.

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