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Capítulo 03 - O início de tudo (Parte 3)

ALANA

Estava com ele há dois anos, e a cada dia que passava, ele parecia sugar um pouco do que restava da essência da minha alma. Nos dias seguintes, apenas me colocava em modo automático: qualquer alteração de voz dele me assustava.

Resolvi ligar na rodoviária para perguntar o valor da passagem para Minas Gerais e, após ficar sabendo, tive a ideia de tentar vender o máximo de cosméticos que tinha para juntar o valor. Depois de andar bastante debaixo de um sol extremamente quente, finalmente consegui o valor da passagem, mas não podia ir naquele dia, pois ele já estava prestes a chegar do trabalho; precisava esperar por apenas mais uma noite, e foi o que fiz.

Continuei agindo naturalmente, escondendo cuidadosamente meus planos de fuga. Naquela noite angustiante, ele buscava um ato íntimo, e eu sentia nojo e desprezo. Não queria aquilo, e ele me forçou; senti-me violentada, abusada de forma literal.

Na manhã seguinte, encarei minha imagem no espelho, uma visão de uma mulher física e psicologicamente destruída. Assim que ele saiu para o trabalho, reuni o máximo de roupas, colocando-as em sacos de lixo, pois não possuía uma mala. Escrevi uma carta de despedida, deixando uma explicação para minha partida. Envolta na dor, buscava forças para recomeçar longe desse pesadelo.

Embarquei em um ônibus, carregando sacos sobre os braços, parecendo uma pessoa que morava nas ruas. O alívio me dominou ao embarcar, o fim do sofrimento se aproximava. Estava livre, mas um novo medo surgiu: e se ele fosse até a casa dos meus pais? E se algo terrível acontecesse com eles? Não podia arriscar tirar a paz deles. Desembarquei rapidamente, lamentando não obter reembolso da passagem. Permaneci na rodoviária, pensando no próximo passo; talvez devesse abrir o jogo com minha prima e pedir que guardasse segredo.

Segui para a casa da Bruna, em um dilema ao avistar o imóvel. Tinha receio de que ela contasse aos meus pais. Enquanto pensava, ouvi um ruído no portão. A Bruna apareceu, surpresa por não ter sido avisada.

— Alana? O que aconteceu? Por que não avisou que estava vindo? — Bruna perguntou, e a única resposta foi o choro.

Incapaz de explicar, precisava de amparo, de amor, algo que não recebia há tempos. Bruna pegou alguns dos sacos e me conduziu para dentro. Após muitas lágrimas, detalhei toda a situação. Ela ficou horrorizada por eu não ter contado desde o início. Adentrei o quarto indicado como meu, tentando não pensar em como seria quando Jonathan percebesse minha ausência. Tomei um banho relaxante e finalmente desfrutei de uma noite tranquila de sono, algo que me era negado há muito tempo.

Dias depois, já me sentia renovada. Minha prima havia inaugurado sua própria lanchonete, e decidi ajudar enquanto recebia o seguro-desemprego. Duas semanas após me libertar do relacionamento tóxico, minha aparência começava a mudar para melhor, mas a dependência que sentia dele era extraordinária, chegava a ser assustadora. Ainda não havia falado com a Daniela, tentava criar coragem para contar sobre o inferno que vivi.

Enquanto cuidava das tarefas na lanchonete, uma voz familiar chamou meu nome. Era a voz de Jonathan, e minha alma parecia deixar o corpo naquele instante.

— Quero um X-salada e um refrigerante! — Ele pediu, e eu concordei com a cabeça. Minha prima, ao perceber quem era, o empurrou, pronta para chamar a polícia.

— Calma, Bruna, sou apenas mais um cliente. Descobri que minha mulher trabalhava aqui e aproveitei para dar uma palavra com ela. Afinal, ela praticamente fugiu de mim, e isso não está certo! — Arqueou as sobrancelhas, suas palavras mexeram comigo, e acabei queimando as mãos na grelha enquanto preparava o lanche.

— Vou chamar a polícia para você! — Bruna gritou.

— Não precisa fazer isso, não quero confusão, só quero conversar! — Ele observava enquanto cuidava das queimaduras nas minhas mãos.

— Tudo bem, Bruna, vou falar com ele, será rápido! — Tirei o avental e o pendurei no gancho na parede. — O que quer? — Perguntei ao me aproximar.

— Podemos conversar lá fora? Não me sinto à vontade com sua prima me pressionando! — Pediu gentilmente, e acabei concordando. Seguimos até a área externa, onde cruzei os braços, esperando que ele dissesse o que queria.

— Precisa voltar comigo, não posso ficar sem você, tenho passado dias difíceis, sinto sua falta! — Murmurou.

— Não quero voltar, tudo que fez foi demais pra mim. Dei meu melhor e mesmo assim fui tratada daquele jeito, eu não merecia nada daquilo! — As lágrimas escorreram pelo meu rosto.

— Vamos dar uma volta, por favor! Eu quero passar um tempo com você, a gente conversa numa boa e, depois dessa conversa, se realmente não quiser voltar, juro que te deixo em paz! — Implorou.

— Sinto muito, mas não posso, não consigo confiar em você! — Suspirei.

— Por favor, Alana, me dê uma oportunidade, vou fazer tudo diferente, eu prometo! Eu sei que errei, admito isso, preciso que me perdoe! — Implorou com os olhos marejados.

— Preciso de um tempo para pensar nisso! — Evitei encará-lo.

— Bom, vou te dar alguns dias para fazer isso, talvez possa mudar de ideia! — Entrou no carro e foi embora. Voltei à lanchonete, e minha prima rapidamente veio até mim.

— Não está pensando em perdoá-lo, está? — Ela perguntou.

— Não, isso não vai acontecer! — Arregalei os olhos, mas no fundo, bem lá no fundo, estava, sim, pensando em perdoá-lo. O problema era que o amava demais, e a saudade que sentia dele estava acabando comigo.

Terminamos de organizar o local em silêncio. Naquela noite, havia combinado com a Daniela de ir ao cinema com ela, decidida a compartilhar tudo que vinha acontecendo comigo. Corri até em casa para tomar banho e me arrumar. Pouco tempo depois, já estava no ponto de ônibus, pois tínhamos acertado de nos encontrar na frente do shopping. No ponto, não havia ninguém, e o relógio se aproximava das oito da noite quando um carro bastante familiar encostou; o motorista era o Jonathan.

— Vai passear? — Ele perguntou com a voz amigável.

— Vou ao cinema com uma amiga! — Murmurei.

— Entre no carro, te dou uma carona! Estou indo a um encontro entre amigos também! — Abriu a porta.

— Obrigada, mas prefiro esperar o ônibus! — Sentei-me no banco que havia no ponto.

— Qual é, Alana? O ônibus vai demorar, e eu não pretendo fazer nada com você! — Insistiu, e acabei concordando com a cabeça.

Mesmo com certo receio, entrei no veículo. Logo ele deu partida, e seguimos adiante. Tudo era muito estranho; o silêncio no carro era assustador, e eu não tinha qualquer assunto agradável para tratar com ele. Uma música dos anos 80 tocava ao fundo no som do veículo, tornando o ambiente bastante aconchegante. Minha paz foi interrompida quando notei que ele passou da entrada que levava ao shopping e pegou outra rua.

— Jonathan, o shopping é para lá! — Apontei com o dedo.

— Calma, só vou abastecer o carro! — Mostrou um posto de combustível logo à frente.

— Desculpa, pensei que tinha outras intenções! — Murmurei.

— Eu vou mudar, Alana! Vou te provar que sou capaz disso! — Acariciou meu rosto, e por puro instinto, me afastei. Ele abasteceu o veículo e, em poucos minutos, já estávamos na porta do shopping. Despedi-me dele e fiquei à espera da Dani, que chegou logo em seguida.

Compramos o ingresso do cinema e assistimos a um filme de comédia. Quando terminou, ficamos dando voltas pelo shopping, enquanto eu contava a ela tudo o que havia acontecido no meu relacionamento.

— Ele é um tremendo filho da puta! Nunca fui com a cara daquele desgraçado, eu estava certa a respeito dele! Não acredito que ainda está pensando em voltar com ele, ele vai te matar, Alana! — Ela segurou forte no meu braço.

— Ele parece estar arrependido, nunca havia admitido que estivesse errado. Acho que ele merece uma chance, eu o amo, estou destruída por dentro! — Acabei revelando.

— Não, você não o ama, isso é impossível. Lembre-se de tudo que ele te fez! — Ela gritou.

— De qualquer forma, vou pensar no assunto. Não cabe a ninguém decidir isso por mim! — Falei completamente irritada, já estava me sentindo arrependida de ter contado a ela.

— Bom, eu não posso fazer nada a respeito. Se a sua vida não significa nada pra você, o problema é seu, mas lembre-se de que você foi avisada. — Ela me observava com semblante sério enquanto falava, mas tentei não deixar que aquele assunto acabasse com o nosso passeio. O shopping já estava prestes a fechar, voltamos para casa e, naquela mesma noite, Jonathan me ligou.

— Oi, eu estava com dificuldade para dormir e precisava falar com você! — Ele disse assim que atendi meu celular.

— John, estou confiando em você pela última vez! Juro que será a derradeira tentativa de viver contigo. Espero que saiba aproveitar essa oportunidade! — Acabei pronunciando.

— Você não vai se arrepender, eu te prometo! Estou indo te buscar! — Notei que ele estava animado com a decisão que tomei.

— Vou pegar as minhas coisas! — Encerrei a ligação. Enquanto retirava todas as roupas do guarda-roupa, a Bruna surgiu na porta do quarto.

— O carro do Jonathan está parado aqui na frente! — Ela arqueou a sobrancelha.

— Eu voltei com ele, vamos tentar nos acertar! — Falei em voz baixa.

— Você só pode estar brincando, mesmo depois de tudo que ele fez com você? — Ela cruzou os braços, e eu permaneci em silêncio. — Você está cega por esse homem, Alana! Eu espero, de verdade, que ele não te mate! — Ela bufou, e resolvi sair sem responder nada.

Eu já estava decidida, e nada que ela ou qualquer outra pessoa dissesse me faria mudar de ideia. Entrei no carro, e John me ajudou a colocar meus pertences no mesmo. Chegamos em casa, e ele me auxiliou a guardar toda a bagunça. Os meses seguintes foram maravilhosos: ele realmente havia se tornado outra pessoa, e notava-se que ele vinha se esforçando para fazer tudo diferente. Naquela mesma época, consegui um emprego em outro escritório,uma extrema felicidade me invadiu, pois finalmente tudo estava começando a dar certo na minha vida.

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