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04

D E A N

Eu conto meus passos até a porta, coordenando minha respiração até ter certeza que pareço normal o suficiente para entrar e encará-la. Nenhuma criança deveria ter de assistir a própria mãe se matar, principalmente quando ela está prestes a se formar e todas as suas amigas estão lidando com assuntos superficiais de bailes e garotos, mas Lily parece não perceber o dano que está causando a filha e continua indo mais fundo no abismo do vício por comida.

Vício.

A palavra parece amarga na minha boca depois de todos esses anos.

Ela disse que eu estava exagerando, e que continuaria comendo o quanto quisesse. Eu não percebi na época o quão doente ela estava, mas a psicóloga me alertou a gravidade da situação.

" Você é um facilitador". Ela disse, enquanto explicava a mente da minha mulher. Aparentemente existem muitas lacunas na infância de Lily que podem ter desencadeado o distúrbio alimentar, mas o acidente e a separação foram como um gatilho conjunto.

— Você voltou. — eu pisco ao som da voz suave, suspirando quando seus olhos de águia seguram os meus.

Forço um sorriso.

— Sim. — falo, deslizando o olhar do seu rosto para a televisão, onde um cara sem camisa toca violão e canta.

— E mamãe? — eu suspiro.

Foda-se.

— Ela ficou no SPA. — a mentira escapa com facilidade depois de todo o ensaio que fiz no carro e seu rosto ilumina, cheio de esperança.

Porra. de. Vida.

Sem conseguir encarar seu rosto, dou mais uma olhada na televisão e finjo prestar atenção no cara cantando.

— Quanto tempo ela ficará? — arrasto meus dedos pelo cabelo e volto a contar.

Quando tempo? Eu quase bufo.

Quem pode saber.

— Algumas semanas. — respondo, não arriscando olhar para seu rosto e ser pego na mentira.

Ficamos em silêncio.

— Dean?

Não olhe. Não olhe. Não olhe.

— Por favor, Dean. Olhe para mim.

Porra.

— Vou pedir uma pizza para nós, boneca. Que tal um doce de sobremesa, hein?

Puxo meu celular do bolso, dando as costas para ela enquanto sigo até a cozinha.

— Queijo e cogumelos? — pergunto, apertando o aparelho contra meu ouvido.

Ela suspira, um ruído tão triste que faz meus dentes rangerem de indignação.

— Ela não está no SPA, não é?

Fecho os olhos.

Sua mão toca meu ombro, os dedos finos clamando por atenção.

Balanço a cabeça em negação.

Porra.

— Sinto muito ...

— Onde ela está? Diga-me a verdade.

—No hospital, ela teve outra parada cardíaca, mas não é só isso. — avalio seu rosto.

— Dean, estou me formando na escola dentro de alguns meses, logo completarei dezoito e ... — ela fala com calma,agarrando minhas mãos nas suas. — Precisa ser honesto comigo, não sou mais uma criança.

— O médico alertou que seus órgãos estão sobrecarregados, quase espremidos e se a situação não mudar, ela precisará de um aparelho para respirar. — admito, sentindo-me derrotado. Tudo parecia tão bem alguns dias atrás.

— O-O q-que podemos fazer sobre isso? — sua voz sai trêmula, as palavras embaraçando antes de formar uma frase real. Quero trazê-la até meu colo e agir como um bom pai, fazer o medo e a dor passar.

Mas eu não sou o pai dela.

Michael, é.

Michael fodido Massimus.

Sinceramente, nunca quis ser pai antes de me casar com Lily e conviver com Vallie. Ela era uma garotinha fofa quando a conheci, tão meiga e quieta que sua presença quase não era notada em um ambiente cheio de pessoas.

— Eu não sei. — sussurro, esticando a mão.

Vallie balança a cabeça, cruzando os braços abaixo dos seios e se negando a ceder. A realidade é cruel, mas apenas um de nós escolheu viver isso.

— Nós não podemos fazer nada, querida. Você não pode fazer nada.

Seu nariz enruga com a carranca irritada que ela está fazendo.

Eu fecho os olhos para manter meus demônios guardados por mais alguns minutos, então sinto seu toque no meu braço e eles acordam novamente.

Meus punhos fecham em cada lado do meu corpo e respiro fundo.

— Por favor, Dean.

Rosno.

— Não, Vallie. Eu não vou te levar até o hospital quando eu sei que isso vai te machucar. — explodo, elevando meu tom pela primeira vez com ela.

Os olhos castanhos me encaram amedrontados por dois ou três segundos até mudarem, tornamdo-se selvagens, desafiadores, imprudentes.

— Foda-se! — ela responde em uma respiração, movendo-se ao meu redor como um predador. Jesus Cristo. Eu corro os dedos pelo meu cabelo até sentir o controle voltar.

Urgh.

Essa garota.

— Nós iremos amanhã. — digo.

— Hoje.

— Não. — falo com uma risada sarcástica. — Eu sou o adulto aqui e, estou afirmando que vou levar você amanhã. Fim da conversa.

Ela fica boquiaberta para mim.

— Bom, eu posso apenas esperar você dormir, pegar seu carro e dirigir até o hospital.

— Vallie.

Ela revira os olhos. Oh, uau. Quem é essa garota?

— Pare de agir com um maldito escroto, Dean. Você não é meu pai.

— Isso deveria ser uma ofensa? Porque não ser aquele verme é a porra de um elogio para mim, querida. E sim, sou um maldito escroto, você não percebeu isso antes?

A ameça de um sorriso beija seus lábios enquanto ela me encara.

Eu não gosto disso.

— Pare de sorrir! — eu grito, arrependendo-me em seguida.

Meu sexto sentido diz que essa é a hora de calar a boca e subir para o quarto. No fundo, sei que ela está sofrendo tanto que precisa de um refúgio essa noite. Minha enteada solta um gemido estranho, alto suficiente para que eu escute, mas não de propósito.

Fico paralisado olhando para ela, esperando, ansiando seu próximo passo pra que eu possa reagir e aliviar minha própria dor. No fim, somos parecidos e opostos de uma forma perigosa e estranha. Onde sou resignado e resilient ela é pura intensidade e paixão, na verdade, olhar para ela me faz pensar na minha outra vida, a versão minha com muitas certezas e pouco compromisso.

É desesperador e revelador ao mesmo tempo.

Quero recuar e dizer que sinto muito, pegar a chave do carro e realizar seu pedido. Mas não posso.

— Suba. — aponto para a escada.

Espero sua oposição, porém ela passa por mim em silêncio e desvia o lhar quando cruza com o meu.

Não importa o quanto eu tente ignorar a tristeza no seu rosto, sua expressão me perturba e fico sentado no sofá pensando no que vou fazer tempo suficiente para esvaziar duas garrafas de vinho.

O que é péssimo, considerando que odeio a bebida.

Quando o relógio mostra dez minutos para as duas da manhã, eu finalmente subo para o meu quarto. Claro, levo a chave junto no caso de Vallie resolver cumprir sua ameaça.

De qualquer forma, meu corpo encontra a cama antes mesmo que eu possa tirar todas as minhas roupas, então me permito ficar com a calça e as meias. Encaro o lugar vazio ao meu lado com raiva, apesar de não dormir no mesmo quarto que Lily há três anos, ainda é incomodo ficar sozinho. Minha enteada nunca questionou o motivo de sua mãe e eu dormirmos separados, mas a contratação de Kiara deve deixado tudo claro.

Acho que, mesmo passando boa parte do tempo na escola, Vallie entendeu que a dinâmica da nossa família não era normal devido a doença da mãe e ela a culpou por um curto período. Além disso, sua relação com o pai também não é boa o suficiente para ela ir morar com ele e sua nova família.

Pode ser estranho que eu goste dessa parte, mas saber que ela não tem para onde ir e não precisarei lidar com tudo isso sozinho, me deixa aliviado para caralho.

A última coisa que eu preciso agora é lidar com Vallie me deixando.

Do lado de fora, escuto as primeiras gotas de chuva baterem contra o teto da casa. Meu quarto atual é menor comparado com o antigo, contudo tem uma janela de frente para cama com vista para o pequeno lago que paguei para ser feito quando comprei a residência. A paisagem sempre melhora meu homor pela manhã, essa noite, eu não fechei a janela e agora estou feliz com minha decisão.

Encaro a chuva com certa esperança, deixando-me invandir por lembranças da infância, recordações de quando o outro eu, estava vivo.

Assim, durmo com a sensação de que não estou fodidamente sozinho e perdido.

Drip.

Drip.

Lentamente, minha mão persegue a pele macia até encontrar a curva da sua bunda. É menor e mais firme do que me lembrava, mas aperto mesmo assim. O som feminino vem como resposta, então continuo a exploração sem receio.

Drip.

Outro gemido.

Eu sorrio enquanto meus dedos exploram o cós do short e encontro a calcinha encharcada.

Drip.

Estou ciente agora de que essa não é a minha mulher, mas faz tanto tempo que eu não dedilho uma boceta e este é apenas um sonho.

— Ah. — a mulher geme quando enfio meu anelar no seu canal molhado.

Sorrio de forma predadora com o efeito que estou causando nela.

— Você está tão molhada, querida.

Drip.

— Dean.

A voz familiar entra em foco.

Drip.

Que porra.

Tropeço para sair da cama, encarando horrorizado minha enteada deitada na cama, as pernas abertas e bochechas coradas.

Drip.

O despertador no meu celular volta a tocar.

Tudo bem.

Isso não está acontecendo realmente.

Vou acordar a qualquer momento.

—Dean.

Não. Não. Porra, não!

Começo a andar de um lado para o outro no quarto.

— Dean.

— Pare de falar. — falo com tom cortante.

Um momento de silêncio cai entre nós antes que ela se levante e saia do quarto.

Meu queixo treme, porém não consigo sair do lugar.

Que diabos acabou de acontecer?

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