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Capítulo 5

CARLA

Eu abri os olhos e levei alguns minutos para conseguir me situar sobre onde estava. Aquele não era o quarto em que costumava dormir nos últimos dois anos. Não eram as cortinas que eu havia escolhido, nem o tecido que costurei. O meu perfume não estava impregnado naquelas paredes.

Até que a realidade do dia anterior me atingiu. Eu não estava na minha casa e aquele não era o meu quarto. Nada era mais como antes.

Me sentei rapidamente, não querendo já começar o dia remoendo a merda em que minha vida havia se tornado. Não ia ficar por ali choramingando e perdendo tempo. Ainda estava viva, e isso era motivo de comemorar.

Mas então meus olhos se moveram para o pé da cama e dei de cara com aquele homem.

— Mas o que… — minhas palavras morreram quando me lembrei da promessa que ele havia feito na noite passada.

"Eu estou aqui. Vou ficar do lado de fora da porta do seu quarto."

John estava dormindo profundamente, com o peito subindo lentamente e atraindo meus olhos para a pele clara e descoberta. Ele parecia um deus grego com todos aqueles quadradinhos perfeitamente delineados no abdômen e o peitoral largo e imponente.

Sem camisa, ele não lembrava um modelo de passarela, mas sim homens que adoravam gastar horas na academia. Senti meus dedos coçarem com uma vontade repentina de tocá-lo, especialmente quando levei meus olhos para baixo, notando como as linhas em forma de V sumiam debaixo do cobertor, escondendo todo o resto.

— Gostando da vista? — a voz dele surgiu do completo nada, me assustando a ponto de perder o equilíbrio e cair em cima de seu corpo. — Não estava olhando de perto o suficiente?

— Você estava acordado o tempo todo? — questionei, franzindo a testa, mas por incrível que pareça não estava irritada com John dessa vez, apenas curiosa.

— Despertei há muito tempo, mas fiquei em silêncio permitindo que você dormisse mais um pouco. Estava tão relaxada enquanto dormia que não quis acordá-la.

Virei meu rosto para o lado, intrigada com como ele podia parecer tão tranquilo e confiante ao confessar essas coisas com tanta facilidade. Assim como na noite passada, ao tentar me acalmar fazendo uma promessa.

— Você é muito bom com as palavras.

Meu cabelo caiu sobre o rosto e rapidamente John ergueu a mão, o enrolando e colocando a mecha atrás da orelha.

— Não sou bom apenas com as palavras, Carla — John falou com um tom bem mais rouco do que há um segundo atrás, e aquilo me fez engolir em seco enquanto minha mente viajava sobre o que ele estaria falando. — Sou ótimo com armas, mais ainda em luta corporal, e consigo me disfarçar com precisão se for preciso.

As palavras dele me fizeram soltar um suspiro e balançar a cabeça em concordância. É claro que ele estava falando de suas habilidades no trabalho. O que eu estava pensando?

— Vocês dois não vão… — ouvi minha mãe no mesmo instante em que a porta se abriu.

Dona Rosa se calou quando seus olhos focaram em nós, antes mesmo que John conseguisse se erguer, me segurando em seus braços e me colocando de volta na cama.

— Mãe…

— Não se preocupem comigo, não vi nada — ela disse sorrindo e fingindo estar envergonhada, mas eu a conhecia bem demais para acreditar.

— Porque não há o que ver, mamãe! — protestei, mas John escolheu esse momento para soltar o lençol, revelando seu corpo coberto apenas pela cueca box preta.

Ele… oh meu Deus, eu tinha estado em cima daquilo um segundo atrás. Foi inevitável pensar nisso quando meus olhos se concentraram no volume que ele ostentava, enquanto apanhava a calça perfeitamente dobrada na poltrona.

— Tem certeza de que não há nada para ver? — minha mãe perguntou, lembrando da sua presença ali e me obrigando a desviar os olhos rapidamente. — Eu vim avisar que sua irmã já chegou e, assim que tomarem café, poderemos ir. Já estou saindo.

Fiquei ali paralisada, encarando a porta e ouvindo o farfalhar das roupas que John colocava atrás de mim, tentando controlar meus pensamentos insanos.

— Quer que eu pegue algo para você? Alguma roupa que deseje colocar antes de irmos? — ele perguntou, parando à minha frente, já completamente vestido, apenas com os sapatos nas mãos. E tudo o que eu consegui fazer foi balançar a cabeça em negação. — Ok. Vou esperá-la na cozinha para tomarmos café. A menos que precise de mim para outra coisa.

— Na… não. — pigarreei, tentando fazer minha voz voltar ao normal. — Desço em um segundo.

John deu uma última olhada no quarto antes de sair, me deixando respirar tranquilamente. O que havia de errado comigo? Estava parecendo fora de mim — e não apenas fora da realidade que eu costumava conhecer. Tudo parecia ter se revirado, até mesmo minha sanidade.

Depois do que pareceu alguns minutos, desci as escadas, já ouvindo o burburinho vindo da cozinha. Todos estavam reunidos, como era de se esperar, conversando e comendo. Mas as risadas cessaram no instante em que pisei dentro da cozinha e os olhares me encontraram.

Minha irmã se levantou, vindo me abraçar já com os olhos cheios de água. De todas nós, ela era a mais sensível, então não fiquei surpresa quando seus braços me apertaram enquanto ela chorava.

— Aquele verme! Como ele pôde fazer isso com você, Car? — falou grudada a mim, me sufocando e começando a me deixar incomodada. — Sinto tanto. Sinto muito que isso tenha acontecido.

Não era o que eu queria para o meu dia. Não queria ouvir sentimentos ou receber pena dos outros. Tudo o que desejava naquele momento era esquecer o que me aconteceu e tentar ter um dia normal.

Em algum momento teria de lidar com toda aquela merda, mas não queria fazer isso agora ou seria sugada para um buraco negro de autopiedade e tristeza.

— Aqui, senhorita — a voz de John muito próxima a nós foi o que fez minha irmã se afastar, me dando um pouco de espaço. — Tome, e podemos ir para a sua reunião.

O encarei sem entender do que ele estava falando. Não havia nenhuma reunião hoje ou essa semana, e eu sequer apareceria no trabalho enquanto meu rosto parecesse ter sido atropelado por uma manada de elefantes.

Mas ele empurrou dois comprimidos para minhas mãos e um copo de suco de laranja na outra. Não me dando escolha.

— É bom ver que tem alguém para cuidar de você, irmã. Mas, se precisar, saiba que estou aqui — ela disse, prestes a colocar as mãos sobre mim novamente, mas se deteve, lançando um sorriso para John antes de voltar para a mesa.

Então entendi. Ele havia intervido para me salvar dela. Mas como sabia exatamente do que eu precisava naquele momento?

— Obrigada. Podemos ir antes que eu me atrase para a reunião.

John me lançou uma piscadela antes de abrir espaço para que me despedisse de todos. Não demorou para estarmos no carro, ouvindo minha mãe tagarelar, enquanto meus olhos se mantinham focados no homem que dirigia para nós duas.

Havia algo que John escondia, e eu podia dizer isso pela sombra em seu olhar. Ele era bem mais sombrio do que deixava transparecer. Mas aquilo estava me deixando intrigada, formando um milhão de perguntas em minha mente.

Foi por essa sombra que ele decidiu se tornar segurança? Ou a parte sombria dele veio junto com o trabalho? O que ele escondia por trás dos olhos azuis perfeitos e do sorrisinho esperto?

— Vou conferir como seu irmão está — a voz da minha mãe me trouxe de volta, me fazendo desviar o olhar do para-brisa e perceber que estávamos na frente da casa dela. — Como será que ele e Magie passaram a noite?

Eu desci, me apressando junto a ela, mais por vontade de fugir dos pensamentos sobre John do que por curiosidade sobre Alejandro. Mas assim que alcançamos o quarto dele e não o encontramos na cama, apenas as muletas jogadas no chão, senti o medo da noite passada me atingir.

— Sequestraram meu filho! — minha mãe exclamou, enquanto eu corria até o banheiro dele apenas para comprovar que não estava ali.

— Ele não foi sequestrado, mãe.

— Onde ele pode ter ido parar? Ele não pode andar, Carla. É claro que só pode ter sido sequestrado! — voltou a gritar, andando de um lado para o outro, impaciente.

Mas me lembrei de Magie. Se ela não estivesse em seu quarto, ainda tinha a esperança de que tivessem saído juntos para dar uma volta.

— Mamãe, se acalma. Ele não foi sequestrado… — falei, abrindo a porta do quarto de Magie e me surpreendendo com a cena à minha frente. — É, acabamos de achá-lo!

— Alejandro! — nossa mãe gritou, colocando a cabeça para dentro e dando de cara com os dois juntos na cama.

A pobre garota despertou com o grito dela e pareceu mais chocada do que minha mãe, arregalando os olhos e erguendo as sobrancelhas loiras.

— Meu Deus! O que vamos fazer agora?

— Não é nada do que estão pensando — meu irmão tentou negar, se levantando mancando e esquecendo que estava apenas de cueca. — Só adormecemos juntos, inocentemente.

— Dá para ver pelas roupas que estão usando. Muito inocente — os provoquei, assim que Magie pulou para ajudá-lo, mostrando estar usando tão pouca roupa quanto ele. Mas eu saí do caminho para que pudessem passar e encontrei John no corredor com um sorrisinho no rosto. — Parece estar se divertindo com isso mais do que eu. O que sabe sobre esses dois?

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