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|NICOLE|
-É apenas um conselho que te dou minha doutora, você deveria fazer assim como eu. Levar tudo com a maior naturalidade possível.
Ele ri provocativo ao recuar alguns centímetros de distância para observar a reação do meu rosto que já se encontra vermelho e em chamas. Seu hálito contra minha bochecha causa tamanho frenesi em meu interior, que eu penso ver um vislumbre do brilho de convencimento e diversão nos olhos azuis feito o mar de Max, ao me flagrarem tremendo sob sua presença. É marcante, intenso e muito tentador, devo confessar. E o pior de tudo é que o malandro parece saber exatamente disso, e por essa razão continua a me pressionar dessa forma.
-Porque para mim é uma rotina bastante normal, mas não totalmente comum, o prazer de ter a agradável companhia da minha futura namorada ao meu lado, depois de sair do trabalho enquanto seguimos para as nossas casas.
Max comenta com tamanha seriedade, que durante alguns segundos chego a pensar que ele está realmente colocando fé naquilo que diz. Mordo o lábio inferior para conter a vontade que tenho de lhe desafiar por um instante, ao mesmo tempo em que capturo seu olhar abrasador imediatamente cair sobre minha boca como resultado do movimento que acabo de realizar. Ele estica um dos cantos dos lábios em um tipo silencioso e sutil de aprovoção, antes de enfim se reeguer outra vez e endireitar a postura de sua coluna, já fora do carro.
Então, no mesmo minuto sinto frio e o incômodo da ausência do calor de sua mão na minha, depois que ele a abandona sobre meu próprio colo, ao mesmo tempo em que sou atingida por uma leve sensação de alívio por enfim conseguir voltar a respirar normalmente diante de seu afastamento abrupto. Max me fita com um semblante um tanto estranho, que eu não entendo, pelos cantos dos olhos, antes de fechar a porta do veículo e dar a volta no mesmo para assumir a posição atrás do volante.
-E é por esse mesmo motivo que eu venho buscá-la na faculdade, minha doutora. Todos os dias se você me permitir, é claro.
Ele emenda sua fala com extrema tranquilidade, enquanto se dobra sobre meu corpo displiscentemente para poder alcançar o meu cinto de segurança e colocá-lo em mim, antes de fazer o mesmo com o seu, e dar partida no automóvel. Eu ofego mais uma vez com o contato. É inevitável. Me deixa alerta, sensível e atenta. Ao mesmo tempo em que fico na expectativa, tenho que me refrear para não pedir que ele avance um pouco mais. Eu não devo, lembro-me disso.
Não seja imprudente, Nicole Fonseca! É o que digo a mim mesma observando-o retomar seu assento novamente e começar a manobrar o carro para deixar o estacionamento. UFA! Essa foi por pouco... Respiro fundo na tentativa de me recompor, mas me arrependo no segundo em que o perfume de Max se impregna em minhas narinas, e me deixa meio tonta com sua magia e magnetismo predominantemente masculinos que me seduz.
-Pelo visto você arranjou um novo apelido para mim, não é mesmo senhor promotor?
Eu faço a pergunta na tentativa de desviar o assunto para outro rumo e ligo a rádio no seu carro. Os auto-falantes não estão no volume máximo, porém, mesmo na altura em que o som sai, eu percebo tarde demais a besteira que acabo de cometer quando a música começa a tocar, tendo somente nós dois dentro de um veículo fechado.
O clima fica tenso... Abafado... Estranho...
"Eu adoro quando você me chama de senhorita. Eu queria poder fingir que não precisava de você. Mas cada toque é tipo oh, la, la, la. É verdade, la, la, la. Oh, eu deveria estar fugindo. Oh, mas você me faz ir ao seu encon..."
Mais rápido que um raio no céu em dia de tempestade, eu me apresso em desligar o aparelho e fazer com que o veículo retorne ao silêncio anterior. Porém, como meus dedos estão tremendo nervosamente feito vara verde, a ação leva mais tempo do que deveria. A vergonha e o constrangimento que a cena proporcionam, não traz juntamente consigo o silêncio que eu esperava que viesse. Ao invés disso, não demora menos do que alguns segundos para que Max solte uma sonora e longa gargalhada, tão contagiante, sincera e bonita, que até eu mesma não consigo resistir. Eu me rendo juntando-me a ele na risada.
-Ah minha doutora, você realmente tem um ótimo gosto musical. Acho que estamos na mesma sintonia, querida Nic...
Ele graceja, eu meneio a cabeça sem olhar em sua direção e desvio os olhos para o teto do carro sem ter o que dizer a respeito. Tudo o que eu falar só irá piorar ainda mais a situação, então a melhor opção é permanecer calada por enquanto, é o que concluo. Max volta a ligar o som automotivo na mesma estação de rádio, e eu cruzo os braços sobre o peito fingindo não entender a letra da música que está sendo cantada em outro idioma. Contudo, nós dois sabemos muito bem que eu compreendo perfeitamente cada palavra da canção. E o sentido da letra também, obviamente.
"Trancada no hotel. Há coisas que simplesmente nunca mudam. Você diz que somos apenas amigos. Mas os amigos não sabem qual é o seu sabor, la, la, la. Porque você sabe que já faz muito tempo. Não me deixe cair. Oh, quando seus lábios me despem, eu fico viciada em sua língua. Oh, amor, seu beijo é mortal, não pare..."
-Que time (tempo) perfeito!
Max brinca com uma piscadela marota e eu só imagino quando as coisas irão parar de piorar para o meu lado nessa vida. Quando? E, é só tal pensamento passar por minha cabeça, que parece que o universo resolve conspirar contra mim, pois meu celular vibra em meu bolso justamente nessa hora. Olho o remetente da chamada e suspiro. Sim, a situação pode sim ficar ainda mais caótica e constrangedora do que já está, é o que concluo ao atender a chamada com uma mão cobrindo o microfone do aparelho para tentar abafar os ruídos externos a minha volta.
Maya Fonseca.
-Oi, mãe! Aconteceu alguma coisa?
Eu digo rápido e baixinho sobre o celular, temendo que ela escute algo que denuncie onde e com quem estou neste exato momento. Eu preciso encerrar essa ligação logo, mas antes, não poderia deixar de atendê-la também, é claro. Ela seria capaz de arrancar meu couro fora do corpo com um bisturi cego e sem anestesia, caso eu simplesmente resolvesse ignorá-la sem nenhum motivo aparente. Então era melhor não arriscar minha pele e testar seus limites.
-Oi, gatinha. Por acaso eu tenho que ter...
"O tempo todo eu vou ao seu encontro. E eu espero que isso signifique algo pra você. Chame meu nome, eu estarei vindo até você..."
Minha mãe ainda está no meio da frase quando Max, sem o mínimo de juízo, bom senso ou noção, começa a cantarolar a letra música junto com o cantor na rádio fazendo com que meu coração dispare de imediato. Essa não! Esse idiota está tentando acabar comigo por acaso?
-Para com isso! Ficou doido?
Eu o repreendo com um sussurro irritado e o olhar fulminante em sua direção, contudo, ele não se abala nenhum pouco com isso.
-Ei, ei... que som é esse que eu acabo de ouvir aí, hein? Onde você está e o que está fazendo nesse momento, dona Nicole Fonseca?
-Eu não... não... eu estou voltando para casa, mãe.
Eu gaguejo com nervosismo ao mesmo tempo em que tento formular em minha cabeça alguma desculpa esfarrapada que a deixe convencida de qualquer outra coisa, menos do que está acontecendo agora.
"Mas cada toque é tipo oh, la, la, la..."
Ele continua a cantar sem um pingo de vergonha na cara e nem temor de perder a vida.
-O que você está aprontando, mocinha?
Dona Maya questiona com um ar desconfiado que me deixa totalmente em alerta. Será terrível se ela ligar o seu radar implacável de mãe e desconfiar de algo. Eu estarei completamente perdida, sei disso, pois ela nunca erra.
Esse filho da mãe ainda vai me pagar caro! É o que pondero comigo mesma, já pensando nos planos futuros de vingança que prepararei para ele. Ah, se vou!
-Não, mãe... espera! Não é o que a senhora está pensando. Não estou fazendo nada de errado, eu juro!
-Ah, caramba Nic! Poxa vida, eu já estava aqui toda animada, cheia de expectativas e você vem e me dá um banho de água fria como esse? Mas que coisa mais chata, hein?! Assim não tem graça. Você deveria ser mais como eu nessa idade e não como o seu pai, sabia disso? Deveria saber aproveitar mais a vida, agarrar as oportunidades e cometer alguns errinhos saudáveis...
Ela bufa contrariada do outro lado do telefone, ao que eu me limito a fingir que não estou vendo o olhar cheio de humor o qual Max está me destinando neste exato minuto depois da resposta dela. O cara de pau está escutando tudo claramente, a conversa e as besteiras que minha mãe está me dizendo, o que me deixa morrendo de vergonha, e totalmente sem jeito para encará-lo de volta. Eu não tenho essa coragem... Não com minha mãe no telefone me aconselhando coisas absurdas e impensáveis, e quando estou próxima da minha pior fraqueza, e tentação em forma de homem. Esses dois querem me enlouquecer, só pode ser isso!
-Pelo amor de Deus, mãe!
