Biblioteca
Português
Capítulos
Configurações

Cap 1 - " Eu aprendi que a genialidade habita nas pessoas, e não nos lugares"

TRÊS MESES ANTES...

As favelas da zona sul do Rio de Janeiro sempre viveu como em todo país o contraste da desigualdade social. No morro Olho de Boi há casas boas, amplas e localizada próxima ao forte comércio que existe dentro da favela. Onde moram pessoas com uma condição financeira razoável que poderiam morar em um lugar menos dominado pelo poder paralelo, mas não o fazem.

Favelado esnobe, tem orgulho em morar na zona sul, em ostentar roupa de marca e montar sua casa com eletrônicos de última geração.

No morro tem facilidade em se obter tudo de maneira inadequada, pagando pouco ou às vezes nada, depende da harmonia do Tito 157, o chefe da maior quadrilha de roubos de carga do Rio de Janeiro.

De forma contrária uma boa parte dos moradores do morro, residem em casebres feitos de madeira, vivem de xepa e da caridade alheia para poderem se alimentar.

Maria companheira de Tito, era uma mulher submissa do interior e analfabeta. Amava os "homens de suas vida" como a própria dizia. Tinha uma adoração pelo seu companheiro, já que Tito a salvou dos maus tratos e abusos do pai e irmão. Ela acreditava que Tito bateu em seus algozes e os expulsou do pequeno rancho, herança de sua mãe no qual eles viviam. O que Maria não tinha ideia, é que na verdade Tito torturou, matou, esquartejou e enterrou seu pai e irmão no próprio rancho dela. Maria o via como herói, um tipo de Robin Hood, aceitava tudo o que Tito dizia como se recebesse uma ordem divina, mas existia alguém que ela amava mais do que ao Tito, seu filho Anttone.

Anttone um menino de dez anos, filho de Tito e Maria, era uma mistura da inteligência do pai com a submissão e timidez da mãe. Raramente o menino se enturmava, todo tempo era ele e os livros. Seu pai o enchia de brinquedos caros de última geração, fruto de roubo. Mas nada disso interessava ao Anttone, gostava mesmo era de ir a escola onde estudava em tempo integral, o Brizolão no qual cursava a quarta série do primeiro grau. No intervalo do almoço que era de uma hora, comia rápido para poder sobrar mais tempo para ler na biblioteca.

Sempre quando Anttone chegava a biblioteca, encontrava sua doce professora Clarice estudando, ela cursava Biomedicina na UFRJ. Anttone sentava ao lado de Clarice em silêncio para não atrapalhar os estudos, e por muitas vezes lia os livros da professora. Ela por sua vez achava engraçado, pois Anttone lia livros de Biomedicina com uma postura séria como se estivesse entendendo o que ali estava escrito. Essa era a rotina de segunda à sexta. Um dia qualquer, Anttone se sentou como sempre ao lado de Clarice.

O menino ficou meio ressabiado, pois toda vez que ele sentava junto a professora na biblioteca, Clarice esboçava um meio sorriso, porém dessa vez ela mal o olhou. A professora havia ido tão mal na prova de biofísica que estava praticamente reprovada, seu docente da matéria, passou um trabalho para que ao menos Clarice tenha como fazer a avaliação suplementar com chances de aprovação. Anttone viu sua apreensão e se preocupou.

— Tudo bem tia Clarice? — Anttone pergunta com sua voz baixa e seu jeito tímido.

— Sim Anttone. Só preciso do seu rotineiro silêncio, pois a tia aqui também estuda e tem que resolver esses problemas super difíceis, senão como vocês dizem: Eu não vou passar de ano. — disse clarice em tom amável, porém preocupado.

— Tudo bem, vou ficar aqui calado.

Anttone aproximou mais sua cadeira para perto de Clarice, pegou um lápis e umas folhas de ofício que ficam na mesa principal da biblioteca para rascunho, e começou a escrever. Clarice observou de forma rápida, e pensou que Anttone estivesse desenhando.

O tempo foi passando e faltava apenas dez minutos para o término do intervalo. E a professora que olhava toda hora para o relógio, fez um muxoxo e pensou em voz alta com a face preocupada e as mãos apoiada na mesa .

— Vou ter que pedir para sair mais cedo, e passar na casa da Andressa, ela também tirou nota baixa como toda a turma, mas foi melhor que eu.

— Não precisa. — disse Anttone se metendo nos pensamentos de Clarice.

— Que?! — pergunta Clarice franzindo o cenho.

— É que eu fiz o dever da senhora. — responde Anttone com total desconforto.

— Ai obrigada! — diz com a mão no coração, achando o ato de seu aluno uma fofura — só meus alunos para me tirarem dessa tensão. Que fofo! Bom, a tia vai guardar o trabalho que você fez e quando me formar, irei mostrar com orgulho como um aluno aplicado como você — ela toca o nariz de Anttone com a ponta do dedo — pode me motivar a seguir quando penso em desistir — relata com um sorriso doce no rosto.

— Eu não fiz o dez exercícios, só dois que a senhora errou que foram os exercícios número três e o sete. — Clarice olha para o Antonne com uma expressão espantada — justifiquei as respostas, assim a senhora irá saber porquê errou.

Clarice pegou o papel das mãos de Anttone ainda não acreditando que aquele menino pudesse ter feito seus exercícios de biofisica, a matéria que deixou toda turma de biomedicina de cabelo em pé.

Totalmente descrente a professora começou a ler, a medida que ela viu os cálculos organizados de forma perfeita e a justificativa coerente, Clarice ficou boquiaberta.

A sineta tocou e ela meio chocada disse:

— Vamos para o mundo real mocinho. Hora da aula. Se é que tenho algo ainda a lhe ensinar. — Anttone deu um sorriso acanhado e obedeceu.

[...]

Alguns dias se passam e o docente de biofísica entrega o trabalho no qual a Clarice gabaritou, e todas as perguntas que ficaram martelando em sua cabeça nesses últimos dias, começaram a ter respostas.

Anttone não era só um menino estudioso que tirava sempre dez em uma escola de ensino fraco. O garoto era um gênio autodidata. E pensou:

" O que esse menino está fazendo ali perdido naquela escola?!"

Como uma boa mestra, Clarice pensou que tinha que guiá-lo para um caminho mais adequado. Anttone, era muito maior do que aquela escola.

Na escola toca a sineta da parada para o almoço. Clarice almoçou e foi até a biblioteca procurar o Anttone.

— Olá! Cheguei atrasada hoje para o nosso encontro de estudos.— falou sorrindo.

— Cadê seu material tia? Não vai estudar hoje? — curioso pergunta o Anttone.

— Hoje não. hoje eu vim aqui só para gente conversar.

— Eu fiz algo errado?

— Não. Ao contrário. Primeiro quero lhe agradecer, graças a você eu tirei dez no trabalho.

— Uffa! É isso? Fico muito feliz. — diz aliviado e sorridente.

— Que bom vê-lo sorrir. Devia largar essa timidez e sorrir mais. Bom, quero te fazer umas perguntas tudo bem?

— Sim.— responde rápido e preciso.

— Seu pai trabalha? E se trabalha é com o quê?

— Sim trabalha — Anttone pensa, e sem olhar Clarice responde timidamente — meu pai é caminhoneiro.

Clarice põe o dedo indicador sobre os lábios e pergunta novamente:

— E a sua mãe o que ela faz?

— Minha mãe não trabalha na rua, somente cuida da casa.

— Mas você sabe dizer se ela tem uma profissão?

— A senhora quer saber da onde veio minha inteligência. Mas minha mãe não sabe nem ler e escrever.

— Anttone não gostaria de ir para um escola cheia de recursos, laboratórios e com um ensino que irá cobrar mais de você? — pergunta de forma altruísta.

— Claro que sim. — responde empolgado e sorrindo.

— Então quando chegar em casa diz aos seus pais que quero vê-los amanhã aqui, para eu conversar com eles.

— Tá legal

Todo empolgado Anttone chegou em casa e falou com os pais. Tito fez cara de poucos amigos, e ditador decidiu que só ele iria falar com a professora. Maria não sabia do que se tratava, mas mesmo assim ficou contente, pois há muito tempo não via Anttone tão feliz.

Baixe o aplicativo agora para receber a recompensa
Digitalize o código QR para baixar o aplicativo Hinovel.