Capítulo 3
O Starbucks na esquina da Carter Inc. era bem movimentado.
Tive que esperar vários minutos na fila até ser atendida, mas não me importei. Eu estava curiosa para ver como era um Starbucks! Em Monterrey, se tínhamos um eu não conhecia e, com certeza, não seria para o meu bico. Mas hoje eu achava que merecia um...
Tive a impressão de que todo mundo na cidade gostava de dar uma escapada — dentro ou fora do horário de almoço — para falar mal dos chefes e discutir os planos para o final de semana. Ainda era segunda feira, mas não parecia fazer muita diferença para eles.
Pedi um latte descafeinado e, em vez de brigar por uma das mesas, que estavam lotadas, fui atrás de ar fresco.
O Central Park era muito melhor do que as minhas expectativas. Em pleno verão, o parque parecia transbordar em beleza, a grama em um tom de verde vivo. Respirei fundo, deixando toda aquela energia entrar em minhas veias.
Depois de quase meia hora, escolhi um banco de pedra na sombra. Precisava de um descanso para os meus pés. Eu ainda queria estrangular aquele scarpin! Fiquei assistindo os patinhos nadarem no lago, pensando em como minha vida estava mudando. Eu estava começando um estágio e iria viver em Nova York.
E ainda havia o meu novo chefe...
Pensar naquele homem, que eu mal conhecia, fazia a minha pulsação disparar. Eu não sabia como seriam os próximos dias, mas com certeza, não seriam nada fáceis. O jeito como ele me olhou, as coisas que tinha me perguntado... eu havia interpretado errado e o resultado era que quase havia perdido aquela oportunidade.
Isso não aconteceria de novo. Eu seria profissional, custasse o que custasse. Aprenderia a ficar imune a ele, completamente indiferente.
Peguei o celular, apertei alguns números e aguardei alguns toques, até que a ligação foi atendida do outro lado.
— Isabel! Por que não me ligou para dizer que chegou bem?
— Eu mandei mensagem —respondi, sorrindo. — Não recebeu, mami?
— Mensagem não é ligação, Isabel. Quantas vezes eu tenho que te dizer?
Fechei os olhos, me deliciado em escutar sua voz. Minha mãe era bem superprotetora. Eu não tinha lembranças do meu pai, só dessa mãe leoa que havia me criado para ser outra leoa também. Às vezes eu pensava que era melhor assim. Ter um homem que nos maltratasse dentro de casa seria mil vezes pior do que não ter homem nenhum. Além disso, nós duas nos bastávamos desde que eu me entendia por gente.
— Saiba você que eu cheguei perfeitamente bem, Dona Carmen — chutei uma pedrinha no chão. — Minha primeira viagem de avião foi um espetáculo! Eu vim na janela, você acredita?
— Não me diga! Que sorte, niña —ela parecia feliz por mim. E eu sabia que estava mesmo. Mas as palavras seguintes quase me fizeram cair do banco. — E o seu novo chefe? Já falou com ele?
Um rastro de calor se espalhou pelo meu corpo. Meu pescoço pegou fogo. Dei graças a Deus que ela não estava ali para ver.
— Nada demais. É como qualquer outro chefe.
— O que foi que ele disse?
— Que mirasse na perfeição, em resumo. Não quer que eu me distraia, mas que mantenha o foco no estágio o tempo todo —sorri, tirando o cabelo da nuca e lançando sobre o ombro. O sol atingiu minhas costas, com uma sensação reconfortante, através do decote da blusa. — Não se preocupe. Foi tudo bem, eu acho.
— E Nova York?
— Ah, isso é o paraíso, não existe nada igual! — eu olhei ao redor, realmente admirada. — Vai valer a pena esse esforço, eu sei que vai. Logo vou poder trazer você para morar aqui comigo.
Enquanto minha mãe contava as fofocas da vizinhança, eu me levantei do banco e voltei a caminhar. As juntas dos meus dedos estavam ficando meio dormentes naquele sapato metido a besta. Alonguei os braços, me espreguiçando e sentindo minha energia se revitalizar.
— Estou torcendo para tudo dar certo. Já acendi muitas velas! A Virgem de Guadalupe vai ajudar você, Isabel.
— Sei que vai. Ah, e diga ao seu amigo que não me esqueci do favor que eu devo.
— Mi amor, não se preocupe, com isso. Só não faça nenhuma besteira. Lembra do que combinamos? Controle o seu gênio e seja uma dama. Você merece o mundo, Isabel, mas ele não vem de graça.
A bronca da minha mãe sempre parecia vir no momento certeiro. Ser uma dama? Eu era expansiva, determinada e, principalmente, muito franca. Direto ao ponto. Não gostava de rodeios, muito menos de me comportar como uma coisa, sendo outra.
Talvez esse fosse o problema com os sapatos. Eles não eram para mim nem um pouco. Eu sentia falta das minhas sandálias rasteiras compradas na feira e do meu all star velhinho.
— Tem toda razão. Eu vou me comportar, fique tranquila. Estou muito animada para esse estágio! Vai dar tudo certo, você vai ver.
Depois que minha mãe desligou, fui atacada por uma curiosidade avassaladora que me fez digitar o nome de Logan Carter na barra de pesquisas.
Aguardei com a respiração suspensa, roendo a cutícula do polegar. Rolei através de uma lista longa de informações até que uma que me chamou muito a atenção. Era a foto dele ao lado de uma mulher belíssima.
Meu coração errou a batida. Ele parecia sério como sempre, mas ela sorria, com leveza, claramente apaixonada. Seu nome era Barbara Clarke.
A matéria dizia que ela era sua noiva.
Havia considerado visitar a Liberty Statue ou o Empire State Building. Passear mais um pouco antes de voltar para o hotel. Mas aquela foto ficava explodindo dentro da minha cabeça como fogos de artifícios.
Então o Sr. Carter era noivo? Como Dayse poderia não saber? Aquilo não fazia o menor sentido. Eu fechei a tela rapidamente, quando um gosto ruim invadiu minha boca. Não, Isabel, você não pode ficar presa a vida desse homem como se fosse uma novela!
Devolvi o celular para a bolsa, peguei um metrô até a biblioteca da cidade e fiz um cadastro rápido na recepção, com uma senhora gentil chamada Nancy. Fui direto até as prateleiras de romance e, depois de procurar um pouco, encontrei um livro que parecia interessante.
Uma história de amor leve e descomplicada, do jeitinho que eu gostava. Isso deveria ser suficiente para me distrair mais tarde.
Olhei para o velho relógio de parede. Eu tinha passado muito tempo no Central Park, precisava voltar para o hotel. Queria tomar um banho e descansar um pouco. Mas quando cheguei até a porta da biblioteca, uma tempestade de verão caía do lado de fora.
Tentei me decidir entre correr até a estação de metrô ou esperar a chuva passar para poder ir embora. Fiquei com a segunda opção. Depois de vários minutos, suspirei, vencida, e voltei para dentro, puxando uma cadeira perto da janela.
Peguei o celular e fiquei olhando para a tela, por um longo tempo, tentando controlar meus impulsos. Até que meus dedos ganharam vida própria e digitaram “Carter Inc.” na pesquisa. Logo apareceram informações sobre o ramo de informática e desenvolvimento de softwares, contribuições científicas, doações para pesquisas de doenças... A lista era extensa!
Tentei ignorar meu desejo, mas era forte demais. Era visceral. Sem poder me controlar mais, escrevi “Barbara Clarke e Logan Carter, a respiração suspensa aguardando pelas coisas que eu descobriria. Percorri com os olhos todos os links que apareceram na tela, como uma viciada, até encontrar algo que realmente me deixou com calafrios.
Barbara não era mais noiva do Sr. Carter. Na verdade, ela havia morrido uma semana depois do noivado, em um acidente de esqui. Levei a mão ao peito, de um jeito quase inconsciente, tocando a medalha da Virgem de Guadalupe que havia sido presente da minha mãe.
O acidente havia acontecido nos Alpes. A reportagem dizia que o noivo havia retornado à estação de esqui quando já era tarde demais. Logo após o acidente, Logan Carter havia sido interrogado, mas liberado.
O meu coração quase parou. O Sr. Carter havia sido suspeito na morte da noiva?
Olhando pela janela, percebi com surpresa que o mal tempo tinha acabado. Eu nem tinha percebido. A chuva havia passado e o sol voltava a brilhar. Eu devolvi o celular para a bolsa, depressa, e deixei a biblioteca.
Mais tarde, a chuva recomeçou. Não apenas um breve temporal, como havia sido o anterior, mas um verdadeiro dilúvio!
Eu tinha medo de raios e trovões, para minha infelicidade, por isso tentei me distrair com o romance que peguei emprestado, mas todo aquele barulho não deixava eu me concentrar. Era impossível.
Pouco depois, larguei o livro que estava lendo de lado e fechei os olhos, lutando com o coração acelerado a cada estrondo que parecia que ia partir o hotel ao meio.
Quando os abri de novo, já eram duas da manhã. A chuva havia finalmente cessado. Eu tinha pegado no sono e as lembranças de um sonho com Sr. Logan Carter voltavam a minha mente nebulosa. Ele me perseguia pelas escadas de emergência da empresa. Com um machado.
Minha mão tateou pela cama até encontrar meu celular debaixo do travesseiro. Digitei “Barbara Clarke” mais uma vez. Eu estava ficando obcecada e isso não era nada bom, pensei com desgosto.
Pisquei várias vezes, tentando afastar os vestígios de sono. Havia desde conjecturas sobre a culpa de Logan Carter até sites que tentavam claramente inocentá-lo, utilizando o máximo de argumentos possíveis para justificar sua demora em obter ajuda. A sensação que eu vinha tendo se transformou em um embrulho no estômago com esses últimos. Eu tinha certeza de que os jornalistas haviam sido pagos para limpar a barra do CEO.
Também encontrei uma página sobre Barbara, que era como um memorial, uma homenagem póstuma feita por amigas de faculdade. Aquilo me tocou muito. Pensei que, se morresse hoje, minhas colegas em Monterrey nem compareceriam ao meu funeral.
No site, Barbara era descrita como uma garota inteligente, espirituosa e dedicada a obras de caridade espalhadas ao redor do mundo. Com a sua morte, as amigas haviam criado o Fundo de Apoio Barbara Clarke para diversas causas, que ajudava instituições sem fins lucrativos nos mais variados fins. Era como uma continuação do trabalho de Barbara. Uma forma de torná-lo perpétuo.
Desliguei o celular, atordoada, e afundei a cabeça no travesseiro. Suspirei profundamente. O que é que eu estava fazendo? Estava mesmo acreditando que o meu chefe era um assassino?
Eu não sabia o que era pior.
Ficar atraída por Logan Carter ou ter medo dele?
