Capítulo 4
4 - Apollo Castiello
Tudo acontece por uma razão.
- Lost
Eu estava assistindo o filme que meu pai protagonizou trinta anos atrás, estava estudando seus detalhes na tela e tentava imitar para daqui á alguns dias vindouros. Eu o tinha como uma fonte de inspiração.
Eros Castiello foi um ator de tamanha relevância nos anos 80 e 90, ele teve uma carreira brilhante e então decidiu parar quando conheceu minha mãe e eu nasci. Lembro de vagas conversas em minha mente de minha mãe falando a ele que não precisava abandonar sua carreira, que ela entendia cada parte do seu trabalho, mas meu pai queria ser justo e ele foi. Abandonou a carreira, o sonho, e o trabalho que fazia por amor para ser um pai pra mim. Pra que eu tivesse uma vida de criança normal, com pais normais.
Mas agora, com a cabeça feita, eu queria continuar o sonho dele. O sonho que ele parou por mim. O sonho que eu parecia dividir as mesmas emoções e sensações. Eu desejava mostrar para o meu velho, que valeu a pena, mostrar a ele que a sua vida ainda tinha uma razão, eu estava fazendo aquilo por ele, aliás, eu só o tinha.
- Se não estou enganado, você está assistindo esse filme pela trigésima sexta vez. - A voz do meu pai encheu a sala. Bem, a voz atual. Já que o timbre de sua mocidade saía do som da televisão.
- É que eu amo esse ator. - Levantei a cabeça pra lhe encarar e sorri.
O álcool já havia saído de suas veias e como consequência, de sua expressão. O azul de seus olhos estava suave de novo, mas não brilhante. O meu e o dele havia perdido o brilho desde o último Dia de Ação de Graças. Mas o rosto dele estava novamente gentil, com o tom jovial que sempre lhe pertencera.
- Tá melhor? - Perguntei preocupado quando meu pai se sentou na poltrona ao lado do sofá que eu estava.
Meu pai respirou fundo e olhou pra tela. Já não era o seu rosto que estava ali. Mas da mulher que fez seu par romântico no meio de todo aquele filme de ação.
- Foi uma aventura contracenar esse filme. - Ele ignorou minha pergunta. Sempre fazia isso. - Nem acredito que ela se foi.
Olhei para ele repetidas vezes.
- A mamãe? - Franzi o cenho.
Meu pai fechou os olhos com força e balançou a cabeça. Falar da mamãe sempre causava aquela reação nele, agradeci por ter jogado todo o álcool de dentro de casa.
- Não. - Ele disse. - A Karen Lauren. - Ele apontou para a loira da tela e só então eu entendi o que estava prestes a acontecer... - Trabalhamos por muito tempo, e ao contrário de mim, quando sua filha Mia nasceu, ela não abandonou tudo. - Ele deu de ombros. - Faz dois anos que ela morreu, era uma grande amiga, mesmo sua mãe morrendo de ciúmes. - Ele sorriu nostálgico.
Então, aquela loira com os olhos de leves tons de azul era Karen Lauren, mãe da Mia Lauren Hudson. E o cara de cabelos acobreados, de olhos azuis era o meu pai. E então, toda uma história estava prestes a se repetir, mas com protagonistas de gerações diferentes.
Sorri pra mim mesmo.
- Pai? - Eu chamei e baixando a cabeça para o lado, vi quando ele me encarou. - Me ligaram hoje mais cedo, e bem, Eros Castiello será substituído por Apollo Castiello e Karen Lauren por Mia Lauren.
O rosto do meu pai brilhou a medida que a compreensão o atingia. Sua boca abriu e fechou e então ele veio ao meu encontro e me abraçou apertado. Minha alma pareceu relaxar novamente quando senti o coração do meu pai bater contra o meu e ver seu olhar brilhar ao me encarar.
- Isso é maravilhoso, Apollo. - Seus olhos estavam úmidos. - Isso será uma alavanca enorme em sua carreira.
- É por você, pai. - Eu toquei seu ombro. - O sonho que você perdeu, cresceu em mim.
Meu pai pressionou os lábios na vaga tentativa de segurar as emoções.
- Hoje às 17:00 terá reunião na sede da NewScene.
Não era a primeira vez que eu atuava, eu participei de algumas séries de TV e até de alguns filmes, mas como protagonista era a primeira vez e contracenar com...
- Mia Lauren é tão talentosa quanto a mãe. - Meu pai ecoou em meus pensamentos. - Ela só precisa de alguém que acredite nela desde que ficou sozinha.
Não entendi de imediato.
- Mas ela é casada, não está sozinha.
Meu pai apenas abriu um largo sorriso e se levantou do sofá, segurando meus ombros.
- Você precisa aprender que está acompanhado não é sinônimo de cumplicidade. Agora, vamos. Tenho que te falar coisas necessárias, meu grande ator.
Eu fui. Mesmo sem entender.
Mas a única coisa que permanecia em minha cabeça, era a certeza de que aquilo não seria o início de um filme de ficção, mas o início do filme da minha vida. Tendo Mia Lauren como protagonista.
