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CAPÍTULO 03 (PARTE 1) - INSISTÊNCIA E REENCONTRO

EMMA:

Consegui dormir graças a ajuda do medicamento, foi uma ótima ideia comprá-lo. Já fazia um bom tempo que não dormia tão bem, porém, quando acordei, a sensação de culpa me invadiu de novo. Acredito que esse sentimento ruim irá me acompanhar até o túmulo. Apesar da boa noite de sono que tive, não senti vontade de levantar da cama, mas  prometi para a Donna que cuidaria da floricultura e não quero decepcioná-la. Além disso, estar em um ambiente que não seja essa casa, me fará muito bem. Levantei-me da cama à força, pois pela minha vontade, ficaria deitada pela manhã toda. Fui até o banheiro, tomei banho, coloquei minhas roupas, e após tomar o  café da manhã, segui caminhando até o estabelecimento. Estamos no verão, mas tem um leve vento percorrendo pelas ruas de Seattle. Faz algum tempo que não sinto uma brisa tão gostosa tocar no meu rosto. Ao chegar na rua da loja, notei que já haviam alguns clientes esperando pela sua abertura. Me apressei para não fazê-los ficar esperando por muito tempo, e assim que abri as portas, atendi todos que estavam a postos. No restante do dia, o movimento foi bem tranquilo.

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No fim do expediente, estava prestes a fechar a floricultura, quando vi o mesmo cliente que comprou as Bromélias no dia anterior entrando.

— Olá senhor, já veio usar seu vale compras? — Arqueei a sobrancelha.

— Na verdade, não! Estava resolvendo alguns assuntos pelas redondezas, e resolvi passar para te ver — agiu tranquilamente como se me conhecesse há anos. Ruborizei ao ouvir suas palavras. Me senti sem reação com tamanha ousadia. O ar do ambiente pareceu ficar impossível de chegar até os meus pulmões, puta merda.

— Me desculpe, mas tenho namorado — grunhi totalmente sem graça, e no meu interior, meu inconsciente começou a rir  descontroladamente da minha mentira.

— Não, você não tem! Andei me informando sobre você e sei que está mentindo — afirmou repleto de certezas.

— E quem é você? Trabalha para o FBI por acaso? Se for, tudo bem, caso contrário, cuide da sua vida e deixe a minha em paz — minha voz manteve-se firme, tentei não demonstrar meu desespero.

— Sinto muito pelos seus pais — fiquei completamente sem reação quando ele se pronunciou sobre os meus pais. Merda! Ele realmente andou se informando! Que tipo de maluco sai por aí investigando a vida de uma pessoa desse jeito?

— Não sei como você sabe tanto sobre mim, e sinceramente, isso está me assustando! Por favor, vá embora,  preciso fechar a loja e o senhor está me atrapalhando — trinquei o maxilar.

— Gostaria de te conhecer melhor! Gostei muito de você — insistiu em tentar me convencer.

— Acredito que não seja uma boa hora para isso, e se me der licença,  preciso mesmo fechar a loja, antes que apareça algum cliente fora do horário de expediente — insisti para sair logo.

— Tudo bem, vou me retirar! Mas quero que saiba que não tenho o costume de desistir do que quero tão facilmente! Em breve entrarei em contato com você de novo, e tenho certeza que não terá coragem de me dizer outro não —  um olhar aparentemente desafiador se fez presente em sua face, e isso o tornou mais sedutor do que já era.

Ergui uma sobrancelha em resposta e voltei minha atenção para o fechamento da loja. Que homem mais  atrevido. Como pode ele saber  que não tenho namorado e sobre a morte dos meus pais?  Isso é assustador. Apesar de tudo, ele é muito atraente. Tem um porte físico de tirar o fôlego. E aquele olhar desafiador? Confesso que ele me deixou até sem ar. Mas existe algo misterioso naqueles olhos, algo neles me deixou muito intimidada. E como assim quer me conhecer? Ele me viu apenas uma vez. Aquele sotaque não sai da minha cabeça, é bem sedutor por sinal.  Pelo visto ele não é daqui. Será que está a passeio?  Tenho a impressão de conhecê-lo de algum lugar. Será que  já falei com ele antes e não me lembro? Distraída com meus pensamentos, me assustei quando escutei a voz do Thomas atrás de mim.

— Virei aqui todos os dias até você aceitar sair comigo — disse repentinamente.

— Meu Deus! Que susto, cara! Quase tive um infarto! — Levei a mão no peito e me apoiei na bancada ao meu lado.

— Me desculpe, não quis te assustar — parou do meu lado com a intenção de tentar me ajudar a recuperar do susto.

— Depois que já assustou? Desculpas não vão me ajudar muito agora — reclamei com tom ríspido na minha voz.

— Um sorvete, um chá, ou um café? — Insistiu em tentar me convencer. O quê esse cara tem na cabeça? Ele quase me matou de susto e agora está me oferecendo um sorvete? Dei risadas internamente, contudo,  continuei séria. 

— Você não vai me deixar em paz, não é? — Perguntei um pouco menos tensa.

— Talvez, depois que você aceitar sair comigo! Hoje à noite? — Mordeu seu lábio inferior, e céus,  fiquei cega para o resto do mundo ao meu redor. Os meus  olhos só enxergavam seus dentes tentadores, mordendo sua boca perfeita.

— Não, hoje  não posso — me recompus rápido e respondi antes que meu inconsciente resolvesse me trair.

— Então, amanhã? Sem desculpas! — Insistiu no assunto. Respirei fundo, e tentei não sair do controle, pelo jeito ele não vai desistir dessa ideia.

— E tenho alguma escolha? Amanhã  te encontro aqui na calçada, em frente à floricultura, e vamos tomar um café! — Avisei.

— Certo, amanhã estarei aqui! Você não prefere que te encontre na sua casa? — Me observou atentamente.

— Não, nem te conheço, não vou passar meu endereço para você — cruzei os braços.

— Que mulher desconfiada! Te encontro aqui na calçada amanhã — apertou os olhos ao dizer.

— Certo, combinado — deu um leve sorriso e  me encarou profundamente. Fui pega desprevenida quando recebi um beijo no rosto. Em seguida, ele virou-se e simplesmente foi embora. Passei a mão sobre o rosto, tocando o local onde ele havia me beijado, e viajei com  meus pensamentos. Isso realmente está acontecendo comigo? Despertei-me do transe, e quando  finalmente consegui abaixar a porta do comércio, na calçada, encontrei com uma antiga colega da faculdade. Ela veio até mim e me abraçou.

— Emma! Há quanto tempo! Você sumiu — pegou nas minhas mãos.

— Oi, Sabrina! Estou por aqui mesmo, quase não tenho saído de casa — expliquei passando as chaves na porta.

— Fiquei sabendo dos seus pais! Sinto muito pela sua perda — disse carinhosamente.

— Tranquilo, estou bem, já passou! — Suspirei.

— Verdade? — Aparentemente, ela ficou com dúvidas a meu respeito.

— Não, não é verdade! Não estou nada bem — desabei choramingando feito uma criança. Sabrina me abraçou e me observou com ternura.

— Já sei o que pode te animar um pouco! Tem uma festa hoje, na casa do Heitor e você vai me acompanhar! Você precisa se distrair e a festa vai ser legal — falou entusiasmada.

— Heitor Jones? — Indaguei fazendo careta.

— Isso, na casa dele — afirmou apressadamente.

— Acredito que não seja uma boa ideia, o Heitor e eu já tivemos um caso! Acho que a namorada dele ficará incomodada com minha presença!  — Usei a namorada do Heitor como desculpa, não estava animada para ir em uma festa. A ideia de ficar em casa me deixava bem mais animada.

— Isso é passado, já faz muito tempo e vocês tiveram um caso bem rápido! Vamos, por favor! Vai ser legal — implorou.

— Não foi um caso bem rápido, ficamos juntos por quase um ano! Eu vou com você, mas só porque me convenceu! Pode me pegar em casa? — Passei as mãos nos cabelos.

— Às oito estarei lá! Como nos velhos tempos?  — Liberou gritinhos de felicidade.

— É, como nos velhos tempos! —  Me esforcei para fingir uma empolgação que certamente não estava sentindo.

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Cheguei em casa e fui direto para o banho. Já que terei que ir a essa festa, irei o mais confortável possível. Encontrei um short jeans que adoro, ele veste super bem e tem um tamanho adequado, ou seja, não é muito curto e nem tão longo. Escolhi uma regatinha branca para acompanhar o short. Ela fica super justa no meu corpo, tem um decote que contorna meus seios, fazendo eles parecerem um pouco maiores do que realmente são. Para finalizar, coloquei meu all star branco nos pés. Apesar de não ser muito fã de maquiagem, resolvi que iria passar, então, fiz uma bem leve, para dar um realce na área dos olhos e na boca. Perfeito, me deu um ar de pessoa mais saudável. Me encarei por um breve momento no espelho, e gostei bastante do que vi. Fazia um bom tempo que não me arrumava desse jeito, e sinceramente, fiquei feliz por ter tirado esse tempinho para mim.

Agora é só esperar pela chegada da Sabrina. Passaram-se alguns minutos desde que me arrumei, estava deitada no sofá da sala, prestes a cochilar. De repente, escutei o som de uma buzina. Fui até a janela e vi o carro da Sabrina. Peguei minha bolsa, fechei a casa e fui na direção do carro. Dei uma olhada para o lado e notei um dos vigilantes que o Mark deixou se aproximando feito um cão raivoso. Percebi no seu olhar, um cintilar de raiva.

— Seu irmão não vai gostar de saber que está saindo à noite — falou entre os dentes, emanando ódio em cada palavra.

— Eu tenho uma vida e meu irmão não pode me impedir de vivê-la — respondi com toda calma do mundo.

— Não podemos ficar à sua disposição, donzela! Não combinamos nada de fazer sua segurança em baladas — alterou sua voz de modo significativo, praticamente gritou.

— Ótimo! Tire a noite de folga! Você está precisando — dei um tapinha no seu ombro e continuei com a mesma calma com a qual havia respondido anteriormente. O homem franziu o cenho, mas não disse nada. Continuei andando até o carro, mal me sentei e a Sabrina me abordou feito uma louca.

— Caralho, que homem lindo — arregalou os olhos.

— O que ele tem de lindo tem de chato! Agora vamos logo para a tal festa, antes que eu mude de ideia — ameacei.

Ao chegar no local, reencontrei várias amizades da época da faculdade. Fazia um tempo que não os via. Ao passar pelo portão de entrada, percebi que a namorada do Heitor não ficou nada satisfeita com minha presença. Era de se esperar. Merda, merda, merda, eu nem deveria estar aqui! Comecei a repetir para mim mesma.

— Vou pegar algo para beber — Sabrina avisou e adentrou-se na casa.

— Certo, vou te esperar lá fora — dei meia volta no curto espaço onde parei na sala.

Sabrina voltou com dois copos e entregou o maior deles na minha mão. Dei uma rápida cheirada no líquido, e constatei que era vinho. Virei o copo como se fosse água, já que a intenção é se divertir, precisamos fazer isso direito. Na real, estou precisando relaxar um pouco. Após tomar a segunda dose, já me senti mais solta, alegre e divertida. Resumindo, fiquei bêbada com apenas dois copos de vinho. Fazia muito tempo que não bebia, na verdade, nunca gostei de beber muito, então era óbvio que iria me embriagar com apenas dois copos. Uma música animada começou a tocar, e meu corpo, automaticamente deu início a um chacoalho inusitado. Nunca consegui resistir a uma boa dança, adoro dançar. Principalmente quando bebo. Dancei muito, até cansar e me sentir exausta. O suor escorria pelo meu corpo de forma incomum. Indicando que já havia me divertido o suficiente, e já era hora de voltar para casa. Dei umas leves batidinhas no braço da Sabrina, para que ela me desse atenção.

— Sabrina, vou embora! Já deu por hoje — expliquei.

— Pare com isso, agora que a festa começou a ficar boa, Emma! — Tentou me convencer a ficar. Eu e Sabrina estávamos praticamente gritando, devido à música muito alta.

— Você pode ficar! Eu vou de táxi — falei gentilmente.

— Amiga, fica só mais um pouco — continuou implorando.

— Eu levo você até sua casa! — uma voz muito familiar falou atrás de mim. Virei-me devagar para olhar o dono da voz, nem precisaria, reconheceria aquele sotaque em qualquer lugar. Quando me virei por completo, deparei-me com o Thomas, parecendo um monumento parado e me encarando. Será que ele está me seguindo?

— Você está me seguindo? — Quando percebi já havia perguntado. Beber dá nisso, Emma. A língua fica solta.

— O quê? Claro que não! Fui convidado para a festa! Um amigo de um amigo me convidou e resolvi aparecer! Algum problema com isso? — Sua voz soou intimidadora. Não sua imbecil, ele não está te seguindo! Ele é um convidado, sua idiota! O meu inconsciente cuspiu na minha mente, e de imediato, me senti tomada pela vergonha.

— Ah, não! Me desculpe! Eu bebi um pouco além do meu limite, e acabei falando demais! — Tentei justificar.

— Sem problemas! Vamos, te levo até a sua casa — sua voz saiu um pouco mais serena.

— Quer saber? Mudei de ideia, vou ficar mais um pouco e esperar pela minha amiga — minha intenção era sair da chata situação que me enfiei.

— Você está com medo de mim? — Franziu o cenho.

— Claro que não! Por acaso deveria ter medo de você? — Gargalhei. Medo? Mal sabe ele que quando estou completamente sóbria já tenho vontade de me jogar em cima dele, imagine bêbada. Meu inconsciente traidor atacou novamente.

— Acredito que deveria — afirmou sem hesitar e saiu para ficar na companhia de seus amigos.

Ao ouvir suas palavras, senti um grande frio percorrendo a minha espinha, e um imenso nó no meu estômago. Contudo, senti também uma atração que jamais imaginei. Talvez o perigo e a adrenalina me atraiam. Ele é misterioso demais, e isso, definitivamente desperta o meu lado curioso, isso me atrai bastante. Sabrina aproveitou o momento de minha distração e não perdeu a oportunidade de partir em busca de mais bebidas. Me vi forçada a tomar a bebida que ela trouxe, nada mais descia. Observando o Thomas, notei que ele estava em companhia de algumas pessoas que nunca vi na vida, e percebi que ele também me observava, sempre me olhando de canto.

— Quem é o bonitão? — Sabrina perguntou por curiosidade.

— Não o conheço! Ele é um cliente da floricultura da Donna, apenas sei que o seu nome é Thomas — expliquei sem deixar de olhar para ele.

— Hum, reparei que ele não tirou os olhos de você e nem você dele — bebericou a bebida.

— Você está louca, é impressão sua — meu intuito era mudar de assunto.

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Após ter bebido todas, necessitava urgente de um banheiro. Haviam dois na parte externa, contudo, além de sujos, estavam com filas enormes, não tive opção. Precisava usar um dos banheiros que haviam dentro da casa. Respirei fundo e encontrei escondida dentro de mim, uma pontinha de coragem para entrar, me agarrei a ela, e passei pela porta da sala sorrateiramente. Iniciei uma busca fulminante por um banheiro. Se tudo der certo, vou entrar e sair sem me encontrar com o Heitor. Estou me sentindo a protagonista de um filme. Igual aquelas mocinhas em perigo procurando um lugar seguro para se esconder, mas neste caso, a mocinha em perigo sou eu e minha bexiga.

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