Capítulo 5
A segunda-feira amanheceu bonita demais para um dia de farsa. Mas Olivia não era de desperdiçar beleza. Se estava prestes a entrar em um contrato de mentira, que ao menos parecesse uma princesa.
Ela contratou uma equipe inteira para cuidar de seu cabelo, maquiagem, unhas e vestido. Um mimo que ela não pagaria — tudo por conta do futuro marido bilionário. Um pequeno ato de rebeldia silenciosa: se vou assinar minha liberdade por dívida estudantil, vou fazer isso em grande estilo.
Do outro lado da cidade, Ethan já havia trocado de terno duas vezes. E nenhuma por indecisão — ele apenas precisava ocupar o corpo enquanto a mente fervia.
No salão reservado de um resort luxuoso, familiares e amigos esperavam animados pela cerimônia. Tudo havia sido organizado para parecer o mais real possível: flores brancas, decoração clássica, convidados de traje formal. Afinal, para o mundo inteiro, aquele era um casamento legítimo.
— Você está tenso, querido — comentou sua mãe, sorrindo com orgulho. — É normal, é o seu grande dia.
— Tenso? — Ethan murmurou, ajeitando a gravata. — Não. Só esperando que a noiva se lembre de que não é um desfile.
Ela chegou uma hora depois, como qualquer noiva com senso de espetáculo. Olivia desceu da limousine com um vestido branco simples, elegante, o cabelo preso com flores e um batom vermelho que combinava com sua ousadia.
A cerimônia começou de imediato. Os convidados se viraram para vê-la caminhar até o altar improvisado, montado em uma clareira dentro do resort reservado. Tudo parecia tirado de um filme.
Exceto pelo fato de ser uma mentira colossal.
O juiz — um velho amigo da família Cavalli, hoje aposentado e, ao que parecia, levemente embriagado — foi escolhido por Ethan por conveniência. O homem podia não lembrar nomes, mas lembrava bem de manter aparências.
— Queridos amigos e familiares… — começou ele, tropeçando nas palavras — Estamos aqui reunidos para celebrar o amor.
Olivia teve que segurar o riso.
O que se seguiu foi um teatro cuidadosamente ensaiado. Eles trocaram olhares falsos, sorrisos friamente educados e alianças de ouro branco com gravação interna. O único momento real, talvez, foi o toque dos dedos.
Ao pegar a aliança, os dedos de Ethan roçaram os de Olivia. Ela tremeu. Ele reparou. E por um segundo, nem o contrato conseguiu esconder a tensão que surgiu.
Ela deslizou a aliança no dedo dele com uma leve pressão. Ele, em retaliação, colocou a dela devagar, sussurrando algo que ela ignorou.
E então o juiz — como se o universo quisesse sabotar a perfeição da farsa — errou os nomes.
— Declaro Ethan e… Elisa? Não… Olivia! Declaro Ethan e Olivia, marido e mulher. Pode beijar a noiva.
Eles congelaram. Ethan não piscou. Olivia prendeu o ar.
Beijar? Aquilo não estava no script. O contrato não exigia isso.
Ela se inclinou lentamente, não ousando tocar seus lábios nos dele, e sussurrou com um sopro de veneno:
— Isso não vai acontecer.
Nesse exato segundo… click! Um fotógrafo da imprensa disparou o flash. O ângulo era perfeito. Um quase-beijo, um olhar que parecia apaixonado, um cenário de tirar o fôlego. Para os olhos do mundo, aquela era a cena de um casamento real. Apaixonado. De verdade.
E foi assim que, no dia seguinte, os portais anunciaram com euforia:
“Amor à Primeira Aliança: CEO e advogada protagonizam cena digna de filme romântico!”
No carro de volta, o silêncio reinava. Olivia olhava pela janela, o campo passando em borrões verdes. Ethan estava no celular, lendo os comentários da imprensa e repassando mentalmente os próximos passos.
Ela quebrou o silêncio:
— Parabéns. Agora metade de Nova York acha que eu estou apaixonada por você.
Sem tirar os olhos da tela, ele respondeu:
— A outra metade tem razão.
Olivia se virou para ele com uma sobrancelha arqueada e expressão de puro ceticismo.
Ele não explicou. Nem sorriu. Apenas guardou o celular no bolso.
E naquele instante, Olivia não soube mais se estava presa em um contrato... ou em algo muito mais perigoso.
O sol já tinha se escondido quando Olivia voltou para seu antigo apartamento. O vestido de noiva, agora pendurado de qualquer jeito na cadeira da cozinha, contrastava com as caixas de papelão abertas pelo chão. Ela estava de moletom, coque bagunçado e uma expressão mista de cansaço e incredulidade.
— Isso aqui parece mais um velório do que a lua de mel de alguém — comentou Camila, sentada no chão, com um rolo de fita adesiva entre os dentes.
— É quase isso. Enterrei minha dignidade e casei com um iceberg de terno italiano — respondeu Olivia, jogando uma pilha de roupas em uma das caixas com mais raiva do que precisão.
Camila riu e pegou uma blusa antiga da faculdade.
— Você ainda tem isso? — ela ergueu o tecido manchado com as palavras “Feminismo, Café e Código Civil”.
— Relíquia da época em que eu achava que meu maior problema era tirar 10 em Direito Constitucional. — Olivia suspirou, sentando-se ao lado da irmã.
Ficaram em silêncio por alguns segundos, apenas ouvindo o som da fita colando caixas e da vida sendo empacotada às pressas.
— E aí? — Camila quebrou o silêncio. — Como foi o beijo?
— Não teve beijo. Teve um quase-acidente fotográfico que agora está estampado no site da Vogue.
— E a mãe dele? Os convidados?
— Choraram. Acharam lindo. Minha nova sogra já quer netos. — Olivia levou a mão à testa. — Se essa farsa durar mais do que seis meses, vou precisar de terapia vitalícia.
Camila a olhou com ternura e preocupação.
— Você tem certeza que quer seguir com isso?
Olivia desviou o olhar.
— Não tenho certeza de nada, Cami. Mas é isso ou ser deportada, pagar cada centavo da faculdade que mal terminei e passar os próximos cinco anos tentando limpar o nome em três países. — Ela sorriu, mas seus olhos entregavam o peso da decisão.
— Ok... então vamos empacotar a coragem também — Camila se levantou, estendendo a mão. — E fazer isso direito.
Olivia pegou a mão da amiga, se levantando com um suspiro resignado.
— Só me promete uma coisa?
— Claro.
— Se um dia eu começar a gostar dele... me dá um tapa na cara.
— Um não. Te dou três.
Elas riram. E entre uma caixa de livros, um abajur torto e o último pacote de fotografias esquecidas, Olivia se deu conta: estava entrando em um mundo completamente novo.
E o mais assustador... era que o medo não era o contrato.
Era ele.
