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Cap. 02 - O casamento.

Kate acordou meio desorientada e com uma dor de cabeça dos infernos. E ainda por cima, estava pelada... Olhou ao redor, não fazia ideia de onde estava, levantou-se e se arrastou até a janela. A paisagem era desconhecida, mas tinha certeza de uma coisa:

Ali não era a Inglaterra.

 Então se recordou de que tinha ido visitar o castelo de Edimburgo, na Escócia. 

Poderia ser que eu ainda estivesse na Escócia, no castelo? 

Analisou novamente o cômodo. Tudo ali parecia antigo, mas, ao mesmo tempo, novo e limpo. 

Então, não poderia pertencer a um dos cômodos do castelo de Edimburgo, onde tudo parecia meio empoeirado e cheirava a lugar velho. Talvez ela estivesse em alguma casa próxima. Kate recordou do momento em que colocou sua mão no espelho e foi puxada para dentro dele, e teve a sensação de cair e cair... Numa queda sem fim. 

Mas talvez essa última parte fosse só um sonho. É, com certeza era isso. Eu só devia ter desmaiado de tanto cansaço depois de subir todas aquelas escadas. 

Kate voltou para a cama, que era imensa, e fiquei lá, curtindo a sua dor de cabeça. E foi quando alguém entrou e a pegou daquele jeito. 

A porta se abriu com um estrondo, chocando contra a parede, fazendo Kate quase cair da cama de susto. Ficou tão irritada que pensou em gritar. Mas então percebeu quem estava diante dela. 

Parado no meio do quarto, a encarando. Não que ela o conhecesse. Não, na verdade não fazia ideia de quem era. Mas sabia que era homem - com todos aqueles músculos seria difícil não perceber. Também sabia que era escocês, já que usava uma daquelas saias típicas da Escócia – Kate não sabia como chamavam essas saias, mas tinha certeza que não era pelo termo “saia”. 

Mas deixando tudo isso em segundo plano, o que mais a chocou foi a evidente cicatriz que atravessava sua bochecha, ia da têmpora esquerda até o canto da boca. Aquela cicatriz lhe dava um ar ameaçador. Não o tornava feio, de certa forma incrementava sua evidente beleza. 

Ao ver que sua falta de delicadeza quase causou um infarto em Kate, ele teve a decência de, ao menos, parecer constrangido, e disse: 

- Peço desculpas por minha falta de educação. Eu sou o Laird Alexander Douglas. E quem sois vós? E o que fazes em minhas terras? 

-  Sou Kate Smith. Vim conhecer o Castelo de Edimburgo. 

-  Edimburgo? Está um pouco distante. Edimburgo fica a 3 dias de distância. 

- Impossível, estava agora há pouco dentro do Castelo de Edimburgo, então passei mal e devo ter desmaiado. – Não  se lembrava de ter passado mal, mas tinha certeza quanto ao desmaio, só não sabia o que aconteceu  para  que desmaiasse. 

- Imagino que vocês que praticam feitiçaria devam possuir meios mais velozes de se viajar. 

- O que? 

- Não se preocupe, guardarei teu segredo. 

- Do que você tá falando? Não sou uma bruxa. Você tá achando que eu sou o que? Amiga de Harry Potter? – Aquele cara era muito estranho... Falava de feitiçaria como se fosse algo real.

- Não faço ideia de quem seja Harry Potter. 

Além de louco, também não tinha cultura... 

- Gostaria de me vestir. 

- Vou pedir a uma das criadas para que te traga um vestido que deverá servir. 

- Não precisa se incomodar, as roupas que eu usava servirão. 

- De forma alguma. Uma dama não pode usar aquilo, mandei queimar. 

- MANDOU QUEIMAR MINHAS ROUPAS?! POR DEUS! O QUE VOU VESTIR AGORA?! – Kate não se conteve, gritou com ele. Ele não deveria conhecer muitas pessoas que gritassem, já que parecia surpreso. 

Propositadamente, ele parecia ignorar o seu acesso de loucura e disse: 

- Vou chamar uma criada. 

Criada? Era a segunda vez que ele usava aquela palavra. 

Kate achou estranho, nunca tinha ouvido alguém se referir assim aos empregados. Não deu tempo de dizer mais nada. O troglodita saiu correndo e fechou a porta. 

Pronto. Tinha assustado aquele homem assustador.

Ela passou os olhos novamente pelo quarto, em busca de algo que nem ela mesma sabia dizer o que era. Então, encontrou, em cima de uma mesa, um pedaço de papel dobrado. 

Devia ser uma carta. 

Será que pertencia a ele? Talvez fosse uma carta de amor. Com aquele ar de mistério certamente haveria alguém na vida dele. 

A curiosidade a venceu. Levantou da cama e pegou o papel. 

E foi aí que seu mundo desabou. 

Logo na primeira linha estava a data, escrita numa caligrafia floreada.

1470. 

1470?!

Quando leu a data, logo imaginou que deveria ser uma dessas cartas antigas, como algo que deveria estar em um museu, como documentos históricos ou algum item de colecionador bizarro, sei lá. Mas então notou para quem era endereçado a carta. 

Alexander Douglas. 

Kate sentiu falta de ar e percebeu que ela devia ter se perdido entre o presente e a loucura. Porque não era possível que estivesse no passado. Não. De forma alguma. Nem pensar. Então ela ouviu leves batidas na porta e correu para se esconder na cama. 

A porta se abriu e uma moça delicada, num vestido longo, entrou. O vestido era rústico e havia vários remendos. Carregava nos braços o que parecia ser outro vestido, muito mais sofisticado e limpo, embora ainda possuísse uma aparência de velho. Não que fosse rasgado ou tivesse aparência de usado, mas era algo fora de época, algo que uma mulher do século XXI jamais usaria a não ser numa festa a fantasia. O ar voltou a fugir dos seus pulmões enquanto a moça entrava e fechava a porta. 

- Bom dia, milady. Meu nome é Rose e eu serei sua criada de quarto. – Ela fez uma reverência. 

- Bom dia Rose. Eu me chamo Kate. A pergunta vai parecer estranha, mas poderia me dizer em que ano estamos? 

A moça a olhou como se ela fosse louca, mas respondeu: 

- Estamos no ano de 1470. Gostaria de ajuda para se vestir? 

Meu Deus! Então era verdade mesmo! Eu não estava sonhando! Realmente estava perdida em outro século. E não fazia ideia de como retornar... Kate pensou.

Rose ainda esperava pela resposta. 

Kate olhou aqueles quilômetros de tecido e decidiu que seria bom ter ajuda quando não sabia nem o que ia em cima e o que ia embaixo do quê. Melhor não passar vergonha. 

A mãe dela sempre dizia: 

“Na dúvida, peça ajuda.” 

- Sim. Não estou acostumada a tantos tecidos. - Kate respondeu.

Fazia muito calor embaixo de toda aquela roupa, mas ela não reclamou. 

Rose tinha avisado que o Laird a esperava na biblioteca. Ela achou estranho que tivesse uma biblioteca numa época onde a maioria das pessoas não sabia ler ou escrever. 

Kate não fazia ideia de onde ficava a biblioteca, embora Rose tenha explicado como chegar lá, ela conseguiu se perder. A verdade era que sua cabeça ainda doía muito e ela estava meio zonza para prestar atenção nas instruções da empregada. 

E o resultado foi Kate caminhando pelos corredores, sozinha, e conhecendo todos os aposentos do castelo. E, se dependesse da sorte dela, a biblioteca seria o único aposento que não conseguiria encontrar... 

Ela desceu as escadas e sentiu o cheiro de comida. Seu estômago roncou. 

Acho que viajar no tempo dá muita fome. Ela pensou.

Consegui chegar na cozinha! Kate comemorou.

Isso era bom. Poderia  comer antes de voltar a procurar a biblioteca. Era um local grande e bem movimentado. Havia diversas mulheres atarefadas e somente uma  delas dava ordens, provavelmente era a cozinheira-chefe. 

- Bom dia. – Kate falou. 

Ninguém lhe respondeu. 

Será que não sabiam falar inglês? Ela perguntou-se, estranhando.

Não era possível que não soubessem, a cozinheira estava dando ordens em inglês quando cheguei. Ela pensou. 

Mas que povo mal educado! 

Estavam me ignorando de propósito!

Kate tentou ser educada mais uma vez: 

- Vocês têm alguma coisa para eu comer? Estou morrendo de fome. Não como desde ontem. 

Ninguém respondeu. 

Ela repetiu a pergunta mais uma vez, tentando manter a calma. 

A cozinheira a encarou feio, e então disse: 

- Se queria comer deveria ter descido na hora certa para  a primeira refeição! Já retiramos a comida. 

Então essa vaca queria ser grosseira é? Mal sabia ela com quem estava lidando. Kate pensou.

Ela não respondeu. Simplesmente deu meia volta e foi procurar a biblioteca. Mas Kate não se esqueceria do que aconteceu naquela  cozinha... 

Finalmente, encontrou a biblioteca. Era imensa e possuía uma grande variedade de  livros. Ela começou a olhar os títulos, mas não parecia haver nenhum em inglês, fez uma careta de desgosto. 

- Sabes ler? – Uma voz grave perguntou, ao fundo. 

Ela o olhou. 

Era o homem da cicatriz novamente. 

Como disse que se chamava? Alex? É, acho que esse era o nome dele. 

- Sim. Mas não essa língua. Não tem nenhum livro em inglês? 

- Esses livros são em gaélico. Aqueles ali são em inglês – ele apontou. – Pode pegar o que quiser. Mas agora, eu gostaria de tratar de um assunto importante. Sente-se. - Ele pediu, mostrando uma poltrona.

- Deve querer saber quem eu sou e de onde vim. – Falei.

- Sim, eu gostaria, mas esse é um assunto para mais tarde. Quero lhe fazer uma proposta. E tenho algumas perguntas para você. 

- Proposta? Que tipo de proposta? 

Ele abriu a boca para responder, quando a porta da biblioteca se escancarou e uma mulher entrou. Estava muito elegante para a época, ou assim Kate imaginava. 

- Então essa é a escolhida pelo rei? Parece normal. Mas a noiva número dois também parecia, e foi a que mais deu trabalho. Então me diga moça, por que o rei te escolheu? O que tem a oferecer? Terras? Soldados? 

Essa mulher devia ser meio louca. Do que ela estava falando? Kate pensou, mas ao invés disso, perguntou: 

- Escolhida pelo rei? Do que está falando? 

- Senhorita Smith, esta é minha mãe, Lady Josephine Douglas. - Alex as apresentou.

- Prazer, senhora. – Kate a cumprimentou, tentando ser educada e fazer uma reverência, por pouco não caiu de cara no chão. 

- De onde é o seu sotaque? - Josephine perguntou.

- Inglaterra. 

- E por que o rei escolheria uma noiva inglesa para o meu filho? Deves ser muito rica. 

- Mãe, já chega. Quero falar a sós com a minha noiva. 

Noiva? Que noiva? Não tinha noiva nenhuma por ali. Kate olhou ao redor, procurando a tal “noiva”.

 Josephine saiu da biblioteca e fechou a porta. 

- Então, como eu estava dizendo, quero lhe fazer uma proposta. – Alex prosseguiu.

- Sim, e eu queria saber que tipo de proposta. 

- De casamento, certamente. É o único tipo de proposta que uma dama donzela pode aceitar de um homem! 

- Casamento? Você só pode estar louco, se pensa que eu aceitaria! Além disso, eu não sou donzela! – Era mentira, obviamente, mas ele não precisava saber disso. Kate usaria todas  as suas táticas para não casar, se fosse possível. 

- Não importa, o rei ordenou nosso casamento e ele se realizará amanhã. 

- Seu rei ordenou que se casasse comigo? 

- Sim.

- Impossível! 

- Por que é impossível? 

- Porque eu venho do futuro! Não sou dessa época. Pertenço ao século XXI. Vim parar aqui não sei como, mas preciso voltar, e não sei como voltar! - Kate deixou escapar.

Depois que parou para pensar no que tinha dito. Ele a olhava, assombrado, como se estivesse lidando com uma louca. 

Droga, como pude deixar escapar isso desse jeito? Nunca fui uma boa mentirosa, mas também não pensei que fosse tão retardada! Ela se recriminou, mentalmente.

- Não foi isso o que eu quis dizer... – Ela tentou inventar uma mentira, mas ele a interrompeu: 

- Não importa de onde vem. Mas tens razão. Estava mentindo. O rei não ordenou que me casasse  com você, especificamente, mas decretou que me casasse o quanto antes, então preciso de uma noiva. Quero lhe fazer uma proposta que beneficiaria a nós dois.

- Que tipo de proposta? 

- Imagino que não tenha ninguém que possa te acolher... Seja lá de onde vem. Certo? 

- Sim. Continue. 

- Ofereço abrigo. Um lugar onde possa morar e ter comida sem se preocupar, enquanto procura uma forma de voltar para casa. E em troca, você casa comigo. 

- E se eu recusar a proposta? 

- Então nos casaremos independente de sua vontade, e você viverá em meu lar de qualquer forma. 

- Está dizendo que não tenho opção, é isso?! 

- Sim. 

- Então por que tentou transformar essa obrigação em uma proposta? 

- Moça, eu só estava sendo educado ao tentar  lhe mostrar que não seria tão ruim estar casado comigo! 

Mas que inferno! Esse homem estava tentando tirar Kate do sério! Ela tinha vontade de estrangular aquele homem. 

- Acabou, então? Posso voltar para o meu quarto?  - Ela perguntou, raivosa.

- Você não quer comer algo? - Ele, em troca, perguntou, calmamente.

- Comida feita por aquele bando de mulheres azedas e mal amadas? Não, obrigada. Ainda é capaz da cozinheira colocar veneno na minha comida. 

- Por que diz isso? 

- Por nada. Logo me entenderei com elas, não se preocupe. 

- Ah, já entendi. Elas não te trataram muito bem não é? 

- Não me trataram bem, você diz?! Eu me senti a última merda rolando ladeira abaixo! – Kate praticamente gritou, estava em seu limite. 

- Você sentiu o que? – Ele parecia estar fazendo um grande esforço para não rir. – Não se preocupe. Fazem isso porque é inglesa. Logo todos se acostumam. 

- Rose, a empregada, foi muito educada comigo. 

- Porque sabe que está lá para servi-la, e por isso não vai te desrespeitar. Pode ir descansar se quiser, vou mandar Rose levar alguma coisa para você comer no seu quarto.

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Kate não voltou a vê-lo até o dia seguinte. 

Logo pela manhã, Rose entrou no quarto e afastou as cortinas, dizendo que o Laird mandou acordá-la e vesti-la para a cerimônia que aconteceria em uma hora. 

Ela pensou que os casamentos eram sempre celebrados ao final da tarde, mas acho que esses costumes ainda não eram adotados nesta época. 

- Milady, seu banho está pronto. 

Enquanto a “criada” de Kate a arrumava, ela ficou pensando em um modo de retornar ao século XXI. Obviamente, - ela chegou à conclusão - deveria procurar o espelho que a trouxe até 1470. 

Mas será que nesses tempos ele já estava no castelo de Edimburgo? Ou eu teria que procurar por todo o mundo? Com a sorte que eu tinha, já sabia até a resposta... Kate imaginou.

Ela estava um pouco nervosa com o casamento, mas se era só um casamento  de fachada para agradar ao rei, pensava que não tinha problema. Além disso, garantiria a ela um lugar para morar sem trazer suspeitas de onde veio. 

Ao casar, deixaria de ser uma estrangeira. Ou isso era o que ela pensava. 

Pronta, arrumada e perfumada, Rose a levou até a capela, onde todos já aguardavam. Não que fosse milhares de pessoas. Longe disso. Eram meia dúzia de  indivíduos que pararam para analisá-la. Os únicos que Kate reconheceu foram o Laird, sua mãe e Rose, que a acompanhava. 

Havia alguns empregados na porta que espiavam, do lado de fora, mas que não ousaram invadir o casamento nem para assistir. 

Foi uma cerimônia rápida e simples. E ela pensou que tinha sido fácil, até que o padre declarou  que o laird poderia beijar a noiva. Kate não tinha a menor intenção de beijá-lo. 

Como poderia existir esse costume numa época onde eram proibidas as demonstrações de afeto em público?! Por Deus, estávamos numa igreja! Devia ser proibido! 

Ela deu um passo para trás e o Laird simplesmente riu. 

Ele riu! 

Alex, então, disse: 

- Minha mulher é tímida, acho que terei que acabar com essa timidez. 

Dito isso, ele a agarrou. 

Firmemente.

Uma mão em sua nuca e a outra rodeando sua cintura, não dando qualquer escapatória a ela. 

E então sua boca estava na dela. 

Kate abriu a boca para protestar e ele se aproveitou, colocando sua língua na boca dela. 

Por Deus! Ela pensou, quase gemendo. Seu beijo era magnífico e as pernas dela  fraquejaram. Ainda bem que ele a segurava, firmemente apoiada, contra seu tórax. 

E que tórax! Ela pensou, suas mãos pareciam ter vida própria e queriam, desesperadamente, explorar aquele corpo magnífico. 

Kate puxou sua camisa, tentando ter um contato maior com a pele dele, ela precisava daquele contato, aquilo a estava matando! 

Ele, então, puxou a mão dela, impedindo-a, enquanto sua boca sugava a língua dela para dentro de sua boca. 

Ela soltou um gemido audível e alguém riu baixinho. 

Então Kate se lembrou de onde estava, tomando consciência de que não poderia retirar suas roupas, como estava tentando fazer. 

Embora beijar em público fosse permitido, ela tinha certeza de que transar em público não era permitido. Se nem no século XXI esse tipo  de comportamento era permitido em público, imagine em 1470! 

Ambos se afastaram um do outro, com falta de ar. 

Então, ele disse: 

- És fogosa, moça. Isso me agrada muito em uma esposa. 

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