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#####Capítulo 2

Capítulo 2

Duque Maximiliano Blackwood

A viagem da Capital Real de Ravenshade para Blackwood fora um tanto desagradável.

Não pela carruagem, que é bastante confortável, mas pela inquietação que me assola.

Não podia evitar divagar em pensamentos.

Antigamente, amava estas viagens com Isabella.

A lembrança ainda era vívida, do som da sua risada ao observar a paisagem, como se cada detalhe da estrada fosse uma nova descoberta, mesmo que já tivéssemos passado por ali inúmeras vezes. Ela se encantava com as coisas mais banais, o verde das árvores, o voo dos pássaros, a luz dourada do entardecer filtrada entre as folhas.

Lembro-me de como inclinava a cabeça contra o vidro da carruagem, os olhos suavemente semicerrados, perdida em pensamentos ou simplesmente apreciando a jornada.

Agora, sem ela, estas viagens eram sufocantes. O balanço da carruagem, antes reconfortante, agora me irrita!

O perfume do couro e da madeira sofisticada do interior, antes despercebido, agora parece opressor, um sufoco inigualável.

- Mal posso esperar para tê-lo, Vossa Graça. - Selene sussurrou em meu ouvido.

O som da sua voz me arrancou dos meus pensamentos como um choque frio.

Antes que eu pudesse reagir, senti o trilhar dos seus beijos, lentos, pelo meu pescoço, o hálito quente contra minha pele.

Suas mãos passeavam pelo meu corpo com experiência, toques e carícias, sussurros e gemidos, que buscavam acender algo dentro de mim.

Eu não retribuí, apenas a observei.

- Passa uma eternidade, Vossa Graça. - lambeu meus lábios delicadamente, antes de saqueá-los para um beijo.

Deixei que invadisse minha boca, permiti o contato por um breve instante e então a afastei.

Meus olhos deslizaram sobre ela.

Selene era uma mulher bonita, esbelta, sedutora.

Uma amante habilidosa! Mas nada comparada à minha Isabella.

Eu não a amava. Nunca amaria.

O que tínhamos não passava de carne e desejo, um refúgio físico para a fome que nunca cessava. Com ela, eu não precisava me conter, não precisava fingir delicadeza.

Selene suportava meus impulsos mais violentos sem queixas, e talvez fosse por isso que ainda a mantinha por perto.

Mas mesmo no auge do prazer, quando seu corpo se arqueava sob o meu, quando os gemidos preenchiam o silêncio, eu não sentia satisfação. Não sentia nada. Apenas um vazio cortante, insaciável.

O tipo de desejo que nada, nem ninguém, conseguia apagar.

Selene era uma mulher perspicaz e inteligente.

Diante do meu olhar, conteve-se, afastando-se e me devolvendo o meu espaço.

Sabia, que se a quisesse, a tomaria.

Mas no momento, não era o caso!

Aproveitei com desgosto o restante da viagem.

Após cruzar o caminho da Cidade de Blackwood e o pequeno Vilarejo, adentramos as terras da minha propriedade.

O portão do Castelo de Blackwood foi aberto assim que avistaram a carruagem.

Observei o movimento dos guardas, reverenciando-me ao cruzar seus caminhos.

Quando paramos em frente ao castelo, minha paciência já se esgotara. A viagem desconfortável, as investidas de Selene e a inquietação que se agarrava a mim como uma sombra haviam me deixado irritado.

Saí da carruagem sem esperar que abrissem a porta para mim. O ar frio da manhã que ainda abria, bateu contra minha pele, mas não refrescou meu humor.

Ajudei Selene a descer e subi as escadas com pressa.

As criadas, ao perceberem minha presença, alinharam-se em fila pelas escadas, abaixando a cabeça em reverência a cada degrau que eu subia.

Divaguei sobre minhas irritações e então eu senti.

Algo doce e inesperado no ar.

Um aroma sutil, diferente do cheiro de madeira e velas queimando que impregnava o castelo.

Morangos.

Franzi levemente o cenho, sem diminuir o passo.

- Vossa Graça.

A voz veio suave, melodiosa, e me atingiu como um trovão no silêncio de uma noite escura.

Parei abruptamente, pés cravados no chão de madeira sofisticada e polida.

Virei-me para fitá-la.

Eu não a conhecia.

Era uma nova criada?

Detinha um par de olhos castanhos como mel e uma pele de porcelana.

Um rosto fino e delicado.

Traços esculpidos como se fossem feitos para serem admirados.

Linda.

Exageradamente bonita. Atraente de um jeito que chegava a incomodar.

Mas não era apenas sua beleza que me causava estranheza.

Seu tom de voz, sua postura... havia algo ali que não combinava com seu status.

- O que disse? - indaguei. Tenho a certeza de que a ouvi me chamar Vossa Graça.

- Meu Senhor. - corrigiu-se.

Seus lábios se entreabriram, os olhos vacilaram, e então mordeu o lábio inferior com força.

Curioso.

- Onde já se viu, criadagem usando palavras da realeza? - as palavras de Selene ecoaram, quebrando o silêncio que existia.

Retirei meu olhar daquele rosto e forcei-me a olhá-la.

Selene esperava algo de mim.

Talvez um olhar de aprovação, um sorriso condescendente por sua observação rude.

Mas recebeu apenas silêncio.

Meus olhos encontraram os dela, frios e incisivos.

Ela se encolheu minimamente!

Sabia que Selene era desprezível. Sempre soube. No entanto, nos últimos tempos, isso me incomodava mais do que antes.

Tornei a olhar para a criada.

Ela ruborizava, as bochechas tingidas por um tom carmesim, os olhos baixos em vergonha pelas palavras brutas de Selene.

Senti algo remexer-se dentro de mim. Uma perturbação silenciosa, uma fagulha de algo que eu não soube nomear.

Mas não me detive para descobrir.

Voltei-me e segui pelo corredor, deixando para trás o aroma de morangos e a irritante presença de Selene.

Meu quarto era vasto, imponente. A luz natural adentrava os amplos janelões arqueados, atravessando as cortinas de linho fino e espalhando uma luminosidade dourada pelo ambiente.

As paredes adornadas com detalhes em madeira escura entalhada, contrastando com os ricos tecidos que cobriam parte da mobília.

No centro do quarto, repousava uma cama imponente de dossel, esculpida em mogno e coberta por lençóis de linho puro, tão brancos que reluziam sob a luz do sol. O tecido das cortinas ao redor da cama era de um azul profundo, quase negro, caindo suavemente em ondas pesadas, oferecendo um resquício de privacidade mesmo dentro do vasto espaço.

Um tapete espesso e luxuoso, em tons de vinho e ouro, cobria grande parte do chão de madeira polida, abafando os passos de quem ousasse cruzar o aposento. Contra uma das paredes, uma lareira de mármore branco, esculpida com detalhes refinados, permanecia apagada naquele dia quente, mas ainda exalava o perfume discreto da lenha queimada em noites anteriores.

Havia uma escrivaninha de madeira nobre junto a uma das janelas, onde rolos de pergaminho e um tinteiro repousavam ao lado de uma taça de cristal, que quase podia ver resquícios de um vinho esquecido. Cadeiras de encosto alto, estofadas em veludo azul-acinzentado, ladeavam uma mesa menor, onde enfeites de prata repousavam.

Embora grandioso e bem decorado, o quarto parecia vazio, sem vida. Cada objeto estava impecavelmente disposto, sem qualquer indício de uso real, como se eu mesmo evitasse ocupar o espaço além do necessário.

A grandeza do aposento não conseguia disfarçar o fato de que, para mim, aquele quarto parecia menor a cada dia-como se as próprias paredes o sufocassem, tornando-se uma prisão silenciosa dentro de minha própria casa.

Eram inúmeras memórias neste aposento.

Memórias estas, que não conseguia olvidar.

Estava quase mergulhado em minha melancolia, quando o bater na porta roubou minha atenção.

- Entre. - ordenei.

Duas criadas entraram e seguiram para o banheiro do quarto.

Observei-as encher a banheira branca com detalhes dourados, esculpidos em ouro verdadeiro, dando-me conta de que realmente precisava de um banho.

E de algumas horas de sono.

Era dia do Baile de Dunewood.

Um evento anual, organizado pelo Duquesa de Dunewood, mãe do Duque.

Honestamente, se não fosse pela Duquesa Irla de Dunewood e pelo Duque - meu amigo de infância, que tenho como irmão -, não compareceria a tal evento.

É um evento marcado pela alta sociedade, em que apenas a nobreza se faria presente.

Servia também como baile debutante de jovens, anunciando ao Reino que estariam disponíveis para casar.

Marcava o início de uma temporada um tanto longa de eventos, que não serviam apenas de entretenimento, assim como marcavam eventos políticos!

- Com licença, meu Senhor. - observei-as enquanto saíam pela porta.

Tirei a roupa sem pressa, depositando no cesto posicionado no canto do banheiro requintado.

Adentrei a banheira, que parecia abraçar meu corpo e acalentar minhas lamurias.

Não passava das 8h da manhã. Teria tempo para cochilar.

Era uma viagem de 2 horas para as terras de Dunewood.

Blackwood, Dunewood e Valmont, eram uma trindade de riqueza e cultura.

Eram os maiores feudos e as terras mais férteis, assim como as mais ricas.

Valmont era a mais próxima, apenas algumas estacas de madeira marcando a fronteira entre as florestas.

Eram os mais próximos, assim como meus maiores inimigos.

Após a morte do Duque Valmont, as batalhas haviam cessado, por enquanto. Ainda tinhamos contas por ajustar.

Valmont ainda pagaria pela morte de Isabella e Anthony, meu filho.

Suspirei pesadamente, decidido a afastar os pensamentos que invadiam minha mente sem permissão.

O mais importante agora, era buscar alguma paz em um sono profundo.

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