03- Você é feliz
Início do flashback
A noite estava linda o suficiente para sair para passear, perto do meu quarto de faculdade havia um pequeno parque que tinha uma vista linda e lá recorri a tomar um pouco de ar fresco, levei minha câmera comigo para capturar algumas belezas naturais e depois pintar isto.
Tudo era muito solitário, nem um grilo podia ser ouvido. Hoje teve uma festa onde muitos alunos iam comparecer no bloco 6, mas sabe, eu não gostei dessas coisas. Ele não gostava de álcool e ouvia música, mas não muito alto. E então, por que eu iria se não tenho nenhum parceiro para curtir?
Eu também não era um entre muitos amigos, mal me socializava em grupos de trabalho e de lição de casa, nada mais. Todo o meu tempo livre foi investido em coisas pelas quais eu era apaixonado,Infelizmente, a vida não me deu muitas opções para ser como as outras mulheres da minha idade.
Embora vocês vão achar que sou chata, aos 21 anos eu era uma pessoa muito livre, usava a roupa que queria, usava o cabelo como queria, ouvia todo tipo de música, gostava de dançar, sabia ser provocante e acima de tudo eu era muito feliz. Eu odeio pessoas mal-humoradas.
Ao chegar ao pequeno parque, sentei-me de costas para a rua em um dos bancos, concentrando-me em como a noite estava fresca, aproveitando a brisa que brincava com meus cabelos.
Respirei fundo e fechei os olhos apreciando a tranquilidade de todo o lugar, porém, aquela paz durou muito pouco, de um segundo para o outro senti que não conseguia respirar por causa do pano que colocaram no meu nariz, me deixando muito forte por trás, sem conseguir respirar ou gritar.
Fim do flashback
— NÃOOOOO!
Gritei desesperada, acordando toda suada com lágrimas no rosto, o coração batendo forte e a respiração pesada. Mais uma vez sonhei com a maneira que fui sequestrada. Olhei em volta, grata por estar sozinha. Não me lembro como acabei adormecendo ontem à noite depois do confronto com Salvatore. Eu só sei que adormeci, mais nada. Minha cabeça doía muito, minha garganta estava seca, me sentia um pouco tonta. Porém, olhei para os meus pulsos, não havia marcas e não doíam. Me lembrei de Salvatore curando-os com compressa de gelo e o que posso pensar é que foi a única coisa boa que ele fez.
Que porra você está dizendo, Elira?! Foi ele quem te amarrou na cama como refém, foi ele quem te machucou! Não fique fora de foco. A porta se abriu, enxuguei imediatamente as lágrimas prontamente para vê-lo passar, mas não era ele.
Uma garota de cabelos cacheados, olhos negros, pele branca e baixa estatura entrou na sala com um meio sorriso no rosto.
Nas mãos ela carregava algumas sacolas, ela me olhou com tristeza, mas mesmo assim se aproximou de mim e sentou na beira da cama.
Até agora ela foi a única pessoa que vi entrar no meu quarto, ignorando o mafioso e a empregada que veio me trazer comida.
— Olá Elira, como você está? Talvez eu não devesse te fazer essa pergunta, mas quero que você fique bem. Meu nome é Alícia, sou amiga e cunhada do Salvatore.
Ela me disse com voz gentil.
— Olá Alicia!
Foi a única coisa que consegui dizer a ela. Se ela é cunhada dele, ela também era como ele.
— Eu vim trazer algumas coisas para você, principalmente as roupas desta tarde para o seu concurso. Escolhi com muito carinho para você. Salvatore me mandou uma foto sua e acho que o vestido que escolhi vai ficar lindo em você. Você é ainda mais linda pessoalmente. Também trouxe para você alguns produtos de higiene pessoal. Depois ele vai te levar para comprar tudo o que você precisa para ficar aqui.
— Obrigada.
Respondi sem muito ânimo.
Salvatore vai me levar para comprar as coisas que preciso para ficar e morar aqui. Quem te disse que eu quero ficar aqui? Senti meus olhos lacrimejar. Mordi meus lábios para me conter.
— Ei, não fica assim.
Ela disse me olhando com certa tristeza.
O quanto eu odiei isso.
— Ajude-me a sair daqui, estou te implorando, eu disse, olhando desesperada em seus olhos.
— Sinto muito, mas não posso Elira.
— Eu também fui sequestrada. Mas acabei me apaixonando profundamente pelo Enzo. Um dia te conto essa história.
Ela me disse, me deixando boquiaberta com aquela confissão. Então essas coisas eram normais nesta família? Não pode ser...
Senti minhas lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Eu já estava começando a odiar ficar chorando.
— E você vê isso como algo normal? Você não sabe que isso vai contra os direitos das mulheres? Já não estamos no tempo em que éramos entregues aos homens sem podermos ter outra opção senão ir com eles. Agora temos o direito de escolher, e isso realmente acontece? Questionei-a, observando como ele abaixou a cabeça.
— Eu também penso o mesmo que você. Enzo, meu marido quando me sequestrou, mudou completamente minha vida, mas aprendi a amá-lo e mudei muitas de suas atitudes. O que essa família precisa é de amor, Elira.
Ela me disse, me fazendo balançar a cabeça.
— Não, não, não. O que falta a essas pessoas é alguém que as coloque em seu lugar e lhes ensine que ninguém pode tratar uma mulher como um animal de estimação. Isso não é vida, ele me amarrou nessa cama como se eu fosse um cachorrinho. Ele me disse que não serei mais livre e que minha vida e meu destino dependem dele. Como vou aguentar tudo isso com calma? - perguntei um tanto chateada.
Alícia respondeu:
— Se eu consegui, você também consegue! Basta seguir as ordens deles e nada mais, quando você tiver a confiança dele será muito mais fácil mudar as coisas. Apesar de ter ficado só dois dias trancada, confesso que não foi legal, mas aos poucos fui transformando ele na pessoa que ele é. É apenas uma questão de amor.
Ela disse olhando nos meus olhos com um meio sorriso.
Mas pelo amor de Deus...
— Se for por falta de amor, podem procurar de outra forma e não à força. Um sequestro é ILEGAL! Mas tudo bem, eu já entendi tudo o que você me disse. É óbvio que não vou sair daqui. Falei desistindo, sabendo que ninguém estaria disposto a me ajudar.
Ela saiu da cama e olhou para mim com aqueles olhos brilhantes que pareciam não passar por angústia ou sofrimento.
— Elira, foi um prazer conhecê-la, mas preciso ir agora e você precisa comer e começar a preparar sua mente para esta tarde.
— Obrigado pelas coisas que você me trouxe.
Eu disse com tristeza.
— De nada, nos vemos em breve.
Ela me disse, pronta para sair da sala.
— Ei, Alícia!
Ela olhou para mim esperando eu falar.
— Você é feliz?
— A felicidade sempre dependerá de você e da maneira como você adapta sua mente. Mas sim, sou feliz.
Ela respondeu e saiu.
Fiquei pensando nas palavras que ela me disse. Por si só, em toda a nossa conversa.
Olhei para as sacolas que ela havia me trazido e percebi que aquela garota havia me acalmado em questão de segundos quando ela me disse: "Se eu consegui, você também consegue"
É claro que consigo, só que não vou me apaixonar. Eu vou brincar com ele. Já que ele quer minha atenção, foi por isso que ele me sequestra, certo?
Vou dar a ele o que ele quer, é disso que se trata. Já que é apenas atenção que ele quer, quando ele conseguir, serei parte da multidão e ele me deixará ir.
