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Capítulo 7

— Hoje vamos tomar piñas coladas para comemorar o aniversário de Leysa, uma amiga da Contabilidade. Vai ser uma boa oportunidade de ampliar seu grupo de amizades na cidade.

— Não acho que seria boa ideia... eu estou de TPM e estou um caco! — passei a mão pela testa, empurrando o cabelo para trás. O ar-condicionado havia quebrado de novo. E, para variar, o responsável da manutenção ainda não havia aparecido. — Tudo em que consigo pensar é voltar para o hotel, tomar um remédio e me deitar na minha cama. Quem sabe, apagar por umas doze horas.

Dayse mexeu os ombros para frente e para trás, com um gemido. Estávamos tensas, depois de uma semana estressante. O calor era só a cereja do bolo.

— Sabe qual é o melhor remédio para curar a TPM?

— Qual?

— Uma boa noitada.

Sorri, prendendo o cabelo no alto da cabeça com uma caneta.

— Então a mamãezinha curte uma noite com as garotas?

— Curto muito. A melhor coisa para desestressar, na minha opinião. Minha família é tudo para mim, mas não acho que seja errado tirar uma noite de folga dela e voltar a ser eu mesma... a velha Dayse, por uma noite.

— Você tem toda razão. Não tem problema nenhum mesmo.

Mas ouvir Dayse falar daquele jeito provocou uma pontada dolorosa no meu peito. Pensei em Monterrey, minha mãe e principalmente... no imbecil do Javier e na infeliz da Yolanda. Antes, éramos tão unidos que eu achei que nada poderia nos separar. Saíamos para todos os lugares, fazíamos juntos todas as coisas.

Talvez esse tenha sido o meu erro: incluir demais Yolanda na minha relação. Inferno! Quando foi que as coisas acabaram ficando tão confusas e minha melhor amiga pegando o meu namorado?

— O que está acontecendo com você, Isabel?

Eu me virei para Dayse, percebendo que havia ficado submersa por tempo demais nos meus pensamentos.

— O que?

— Você está diferente.

Sua perspicácia me deixou sem palavras. Aqueles dias em Nova York haviam sido realmente muito intensos. Boa parte dos meus momentos na cidade haviam sido um desastre. E tinha ele...a fonte inesgotável dos meus maiores problemas... o homem que eu queria esquecer acima de tudo, mas que estava tão perto que aquilo se tornava impossível.

Nos últimos dias, havíamos entrado em um acordo mútuo e não verbalizado. Nos falávamos apenas o crucial. Eu vinha tentando mostrar minha determinação e profissionalismo através do meu trabalho silencioso. Eu era como um operador de câmera. Estava longe de ser a estrela principal, mas sem mim, o filme não andava.

Dizia isso com um orgulho secreto porque, apesar de ser só uma estagiária, meu trabalho já havia sido elogiado algumas vezes por pessoas que nem me conheciam. Ponto para mim!

Estiquei os músculos do pescoço.

— Eu acho que preciso dormir um pouco...

— Não precisa dormir numa sexta à noite — ela balançou a cabeça, em negativa categórica. — Além disso, consegui uma babá para as crianças e isso não acontece com frequência. Um drinque e você vai se sentir melhor, eu prometo.

— Sinto decepcioná-la, mas eu não bebo, Dayse.

— Não faz mal — ela piscou um olho. — Eu também não, sua boba. Mas as garotas bebem e elas dão um show. Sobem no palco e tudo mais! São muito alto astral e acho que você vai amá-las.

Respirei fundo, e sorri, vencida.

— Tudo bem. Preciso mesmo me distrair um pouco.

— É assim que se fala, garota.

Pontualmente às dezoito, estávamos guardando nossas coisas e, enquanto Dayse falava sobre as expectativas para aquela noite, os meus olhos se dirigiram involuntariamente para a porta da presidência.

Depois do almoço, o Sr. Carter havia entrado em uma teleconferência e exigido que suas ligações não fossem transferidas.

Ele ainda estava lá dentro, pensei, o coração martelando.

Dayse tagarelava sem parar, mas eu não ouvia nada. Minha mente estava muito longe. Eu estava dividida entre a mágoa que sentia dele e a vontade de confrontá-lo. Eu sabia que era ótima em confrontos. Tão boa, que, normalmente, a outra pessoa não saía viva deles.

Ouvimos passos vindo do corredor e Dayse gemeu sem forças, quando vimos quem estava chegando.

— Srta. Bellefleur — ela saudou com um sorriso forçado. — O Sr. Carter prefere que espere aqui fora. Eu vou chamá-lo...

— Estou entrando — Caitlin Bellefleur cantarolou, tirando os óculos escuros enormes do rosto. Dessa vez, não se parecia como um acidente de trânsito, mas uma mulher elegante, com uma bonita bolsa pendurada no pulso. Nos deixou atônitas entrando pela porta da presidência. — Traga dois cafés. O meu com adoçante.

A porta se fechou e Dayse virou-se para mim, lentamente, com uma fúria assassina nos olhos.

— Eu não acredito... ela acabou de nos ignorar completamente?

— Eu acho que sim — eu me levantei, organizando minhas roupas. Estava decidida a não me deixar abalar mais pelo Sr. Carter ou nada que fizesse parte do universo dele. O tipo de relação que aqueles dois tinham me intrigava, mas eu ignorei isso também. — Vamos embora. Não vamos deixá-la estragar nossa noite das garotas.

— Eu preciso mesmo de um drinque.

— Achei que você não bebesse.

— Parece que vou começar hoje.

Dayse foi pegar sua bolsa no cabideiro. Nós duas pulamos de susto quando a porta se abriu repentinamente. O Sr. Carter saiu da sua sala, uma expressão enfurecida que eu ainda não havia visto. Normalmente, ele era impassível e irritantemente controlado. Agora, era a síntese da raiva.

— Quantas vezes eu disse que ninguém entra sem ser anunciado? — fuzilou Dayse com os olhos. — Onde será que foi parar a sua competência, Sra. Marshall?

Dayse ficou parada ao meu lado, os braços arriados ao lado do corpo. Estava tão bonita com a maquiagem que havia feito, há meia hora, mas, agora, parecia pálida como um fantasma.

— Sr. Carter, sinto muito. A Srta. Bellefleur saiu entrando, ela não deu uma opção...

— Ela não precisa dar opções! É você quem trabalha para mim, não ela. E é em você que confio para que não aconteça esse tipo de situação.

Eu me virei para ele, absolutamente chocada. Era difícil me controlar quando estava, obviamente, tremendo como um pinscher, mesmo assim, engoli minha irritação e controlei o tom de voz para o que julgava ser adequado ao ambiente de trabalho.

— Sr. Carter, o que Dayse quer dizer é que a Srta. Bellefleur passou por aqui como um furacão. Ela invadiu a sua sala. Nós duas tentamos detê-la, mas foi impossível.

Ele se virou para mim, devagar. Os olhos se estreitaram.

— Você não tem capacidade para julgar uma coisa dessas.

—Como assim não tenho?

— É só uma estagiária. Dayse é quem conhece os procedimentos necessários e não deveria ter deixado ninguém entrar sem ser anunciado.

Procedimentos necessários? Por acaso, deveríamos ter derrubado aquela mulher a socos? Abri a boca para mandá-lo se foder, mas acabei fechando de novo. Mordi o lábio inferior quase a ponto de sangrar. A raiva dentro de mim era quase incontrolável. Eu estava fervendo.

— Sinto muito — Dayse murmurou com a voz firme. — Não vai acontecer de novo, Sr. Carter.

— Assim espero.

Ele virou as costas e entrou na sala, onde a megera causadora da discórdia aguardava. Eu respirei fundo, abrindo e fechando os punhos em uma tentativa malsucedida de me acalmar.

Eu tinha cometido um erro em gostar desse homem intragável. Mas, na minha opinião, não havia erro nenhum no mundo que a gente não pudesse consertar.

Uma hora depois, vendo Leysa, Gillian e Stacey entornarem piñas coladas, minha irritação tinha começado a se dissipar.

Dayse tinha razão. Elas eram engraçadas, muito divertidas. Das três, apenas Stacey tinha namorado, as outras duas eram solteiras. Trocamos telefones e elas prometeram me levar para sair, outras vezes.

Eu não gostava muito de bares, mas o The Clock tinha uma vista incrível da Baía. Era um lugar elegante, com um cardápio caro, mas o namorado de Stacey era o gerente e isso tinha nos garantido bebidas grátis a noite toda.

Eu me sentia bonita, apesar das roupas de trabalho — blusa branca de seda e calça preta justa. Meu cabelo estava solto e os brincos que Dayse havia me emprestado eram maravilhosos. Eles brilhavam na luz de led azul.

Estávamos sentadas lado a lado no bar, ouvindo Leysa contar as fofocas da Contabilidade, quando Dayse gemeu ao meu lado, afundando no banco.

— Eu sabia que deveríamos ter escolhido outro lugar...

— Que falta de sorte! — Leysa exclamou. — De tantos lugares em Manhattan... tantos bares!

— Vamos ignorar e fingir demência — Gillian propôs, virando o que deveria ser o seu sexto drinque. — Não demora muito e eles vão embora. A gente já conhece o protocolo FFF, já viu outras vezes.

Eu olhei para elas, confusas.

— O que é o protocolo FFF?

Dayse revirou os olhos.

— Ficar, flertar e foder.

Eu era a única de costas. Não fazia ideia do que elas estavam falando e para que tanto alarde. Então comecei a me virar para olhar por cima do ombro, mas Dayse segurou meu braço e todas as garotas riram.

— Seja um pouco mais discreta, Isabel... Meu Deus!

Para disfarçar, decidi me virar primeiro de frente para o balcão, mas me deparei com os olhos gulosos do barman sobre mim. Uau. Isso me distraiu momentaneamente. Ele era bonito... e nem um pouco discreto. Estava me analisando detalhadamente e tinha um sorriso convencido no canto do rosto.

— Tijuana? Guadalajara?

—Monterrey.

Os olhos dele brilharam.

— Somos vizinhos.

O meu queixo caiu. Há quilômetros de casa, quanta coincidência!

— Que bairro?

— De El Thaco.

Minha expressão fechou.

El Thaco era o bairro onde Javier morava.

— Que interessante...

Ele levantou uma sobrancelha. Havia uma pequena cicatriz nela.

— Algum problema com El Thaco?

— Nenhum.

Ele continuou secando copos, mas seus olhos permaneceram pousados em mim. Era moreno, cabelo preto cortado curto, olhos castanhos abrasadores. Era o que minha mãe chamaria de um tipão!

Dayse me cutucou com o cotovelo.

— Olhe agora, Isabel.

— O que? — perguntei, distraída.

— Acho que sua amiga quer que você olhe para aqueles caras bem ali — o barman se debruçou sobre o balcão na minha frente, acenando com a cabeça na direção a minha esquerda.

Com nossos rostos bem próximos, ele passou a língua pelos lábios, umedecendo. Hm, que sexy. Se ele pelo menos não fosse vizinho do meu ex... seria uma ótima forma de esquecer o Sr. Carter. Nos braços daquele cara.

Enfiei uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e virei meu rosto discretamente na direção que ele indicou. Então meu coração voou do meu peito e saiu pela boca. Era ele... o próprio! Logan Carter. Acompanhado de outro sujeito, que eu conhecia de vista da empresa. Também era do alto escalão.

Os dois se dirigiram a outra ponta do bar, com seus andares confiantes e ternos de milhares de dólares, atraindo todos os olhares femininos para eles. Eu me virei depressa para frente. O bar estava cheio, então as pessoas ao redor eram uma boa camuflagem, mas nem tanto.

Eu me sentia nua estando a apenas alguns metros de distância daquele homem. O que era loucura porque, frequentemente, ficava perto dele o dia inteiro.

Passada a frustração inicial, as garotas já haviam engrenado a conversa novamente. Eu não escutava mais uma palavra. Todo o oxigênio havia sido sugado do ambiente. Então me levantei, pegando minha bolsa.

— Vou ao banheiro, volto logo.

Vasculhei o bar com os olhos, a procura do banheiro. Eu me sentia como uma fugitiva. A última coisa que eu queria era que o Sr. Carter me visse. As coisas entre ele e eu andavam bastante tensas dentro do ambiente de trabalho e encontrá-lo fora dele poderia ser o estopim para uma explosão. Sendo assim, pretendia evitar aquele confronto ao máximo.

Quando finalmente achei o banheiro, escorreguei para dentro dele com um suspiro de alívio. Havia duas outras mulheres lá dentro, mas elas já estavam de saída. Peguei uma das cabines e, para minha surpresa, percebi que estava mesmo com vontade de fazer xixi.

Assim que terminei, fui até a pia, e o meu reflexo no espelho me deixou chocada. Eu estava acalorada, as bochechas vermelhas, os olhos brilhantes. Qualquer um que me visse, apostaria que eu havia bebido um drinque atrás do outro, mas tudo o que eu tinha feito foi me deparar com a presença daquele homem arrogante no meu caminho.

Sequei as mãos e atirei o papel na lixeira, irritada. Mal tive forças para retocar o batom. Minhas mãos estavam trêmulas. Eu estava cansada do efeito dele sobre mim. Sabia que a TPM deveria estar agravando aquelas sensações, tornando-as mais exageradas, mas era um pensamento minimamente coerente dentro de uma cabeça que estava a milhões!

Abri a porta e quase atropelei a mulher que tentava entrar. Com um breve pedido de desculpas, segui o meu caminho, rodeando o bar pela sua lateral. Fazia isso de propósito, para evitá-lo, mas fui impedida por um braço atado com firmeza ao redor do meu pulso.

— Por que, para todo lugar que eu olho, parece que eu vejo você?

Quando me virei para trás, me deparei com os olhos escuros e examinadores do Sr. Carter sobre mim. Ah, droga! Ele estava lindo e muito sexy. Eu tinha reparado no terno azul marinho, mais cedo, mas a forma como a camisa branca emoldurava seu corpo, sem a presença dele, era desorientadora.

— Talvez devesse parar de olhar —sorri sem o menor humor. — Se está tão incomodado.

— Quem disse que estou incomodado?

— A sua cara não esconde.

— Claro que sim —ele bufou, tomando um gole do seu copo. Eu conhecia aquele cheiro. Uísque. Um homem caro com gostos caros, pensei com amargura. Não era mesmo para o meu bico. — Porque você é ótima em ler expressões e decifrar pessoas.

— Não é difícil ler um homem que curte atormentar os outros. Ou fazer suas funcionárias chorarem.

Os olhos dele, antes frios, se tornaram ameaçadores. Em vez de me encolher, estufei o peito, mostrando a ele que não me intimidava. Era uma mentira, claro, mas eu não queria que ele soubesse o quanto mexia comigo. Sabendo que não deveria estar perto dele, quando me encontrava tão fragilizada, eu me virei para sair, mas sua mão me manteve por perto.

— Já disse que você desperta meu pior lado?

— Então por que até em um bar, o senhor me persegue? Por que não me ignora e cumpre o que prometeu, tratando-me em nível profissional? — esbravejei, as emoções afloradas. — Preciso ir. Me solte, por favor.

A expressão dele mudou, de contrariada para surpresa.

—O que é que está acontecendo? —ele murmurou, rouco. — Por que você está chorando, agora?

— Eu não estou chorando...

— Claro que está — ele estendeu um dedo da mão livre e passou pela minha bochecha, recolhendo uma lágrima traidora. — Me diga por que ficou assim. Eu exijo saber.

Ele exigia?!

Meu peito subiu e desceu várias vezes com o esforço para respirar. Eu não sabia o que havia comigo. Era aquele homem... era tudo nele! Seu cheiro, sua voz, seus olhares. Uma onda de arrepios varria o meu corpo. Eu precisava me afastar dele, dar um jeito de me tornar imune ao seu ar sedutor, em vez disso, acabei dizendo as coisas que estavam presas na minha garganta.

— Eu fico assim por sua causa, já sabe disso. E o que pediu para eu fazer? Ficar longe de você, não foi? Tenho cumprido minha parte no acordo. Por que não é capaz de fazer o mesmo?

O rosto dele mudou outra vez. Compreensão. Agora, sim, ótimo. A pressão ao redor do meu braço diminuiu, mas ele não me soltou totalmente.

— Onde você vai se eu te soltar?

— Para longe de você.

O Sr. Carter assentiu.

— Vai para a cama com aquele cara do bar?

Sua pergunta me deixou perplexa.

— O que? Do que está falando?

— Do barman. O que estava praticamente te comendo com os olhos — a expressão dele se intensificou. — Vocês se conhecem de onde?

— Ele é de Monterrey... foi só uma coincidência — puxei meu braço, mas ele me puxou para ele, contra o seu corpo, e minhas pernas fraquejaram. — Sr. Carter, eu juro, é melhor me soltar. Não vai pegar bem ter o meu chefe me segurando pelo braço em um bar lotado de gente.

Com nossos corpos colados, as respirações se cruzaram. Eu podia ver seus lábios tão perto e os desejei como nunca. Queria poder beijá-los. Senti-los como da outra vez. Minha garganta apertou, meu corpo incendiava.

—Srta. Herrera...

— Não.

A expressão dele não foi de surpresa, mas de aceitação. O aperto no meu braço tornou se afrouxar e eu não paguei para ver. Em um momento de distração sua, me desvencilhei, pegando o caminho mais curto, pelo meio da pista de dança, onde Stacey e Gillian se acabavam.

Não era possível que elas não tivessem visto... foi por um triz. Meu coração estava a mil. Aquele homem me deixava louca, transtornada de verdade. Quando cheguei ao bar, vi que Dayse e Leysa ainda conversavam. Eu me virei para elas, tentando disfarçar minha agitação.

— Estou indo embora.

Dayse, me olhou desconfiada.

—Mas por quê, Isabel? Mal chegamos!

— Estamos aqui já faz tempo e eu preciso descansar. Estou realmente exausta! Mas espero que se divirtam muito, o resto da noite.

Dayse sorriu, compreensiva.

— Vai pegar um táxi, não é?

Eu estava pensando em pegar o metrô. Gastar dinheiro com luxos desnecessários era a última coisa que eu precisava fazer em Nova York.

— Não. Vou de metrô.

— Tem certeza? Está meio tarde.

— Achei que fosse cedo — provoquei.

Dei um abraço nas duas.

— Me manda uma mensagem quando chegar sã e salva — Dayse pediu. — Não vou sossegar se você não mandar.

— Eu faço isso, prometo.

Eu me virei para dizer tchau ao barman, mas para minha surpresa, ele havia desaparecido. Tudo bem, melhor assim. Estava tudo muito divertido, mas a verdade é que não gostei nada de descobrir que havia uma lembrança da minha história com Javier perambulando em Nova York.

Quando deixei o The Clock, a brisa úmida atingiu o meu rosto. A cidade era quente no verão, embora nada comparado a Monterrey. Olhei o celular. Passava das dez da noite. Considerei aceitar a sugestão de Dayse e chamar um táxi, mas eu tinha visto uma estação de metrô quando estávamos a caminho e o bar não ficava tão distante dela. Além disso, as ruas estavam bem movimentadas.

Comecei a andar e dei graças a Deus por não beber, do contrário, não sei se conseguiria passar ilesa pela enxurrada de pessoas. Havia gente saindo de cada buraco com as portas abertas e filas quilométricas em alguns deles.

Para minha surpresa, depois de algumas esquinas, o movimento começou a ficar escasso até cessar completamente. Até a avenida principal, onde passava o metrô, ficava bastante deserto.

Um carro passou pela rua com seus faróis iluminando tudo. Um outro veículo, grande e preto, que vinha logo atrás dele, desacelerou até ficar ao meu lado. Meu coração falhou. Apressei o passo, olhando fixamente para a frente, dizendo a mim mesma que era só um idiota bêbado.

Faltava só mais um quarteirão. Olhei para trás. O carro preto continuava me seguindo. De uma corridinha e, num impulso, tentei atravessar a rua, mas uma moto que vinha em alta velocidade quase me pegou. Meu coração foi parar na garganta. Eu quase tinha morrido! Meu primeiro pensamento foi em minha mãe e no quanto ela ficaria arrasada.

Eu tinha esquecido completamente a perseguição. E, quando percebi, já era tarde demais. O veículo me alcançou, parando ao meu lado. Para o meu desespero, o vidro do motorista abaixou e ele colocou a cabeça para fora da janela.

— O que está fazendo, sua louca?

— Sr. Carter?!

Apesar da irritação, não pude deixar de sentir também uma onda de alívio. Olhei para os lados e, dessa vez, atravessei a rua com plena consciência. Como eu previa, ele também fez o mesmo, diminuindo e passando pelo cruzamento.

— Perguntei o que está fazendo!

Olhei na sua direção. Ele era mesmo um babaca. Eu só não entendia por que é que eu não colocava um fim ao seu jogo. Meu cérebro gritava para que eu o mandasse ir embora, mas meu corpo tinha ideias bastante diferentes. Levantei o queixo e despejei minha frustração em cima dele.

— Correndo de um perturbado que resolveu me seguir.

— Bom, agora que já sabe que sou eu, entre no carro.

Coloquei a mão ao redor da minha orelha como se não o tivesse escutado.

— O que disse?

— Disse para entrar no carro — repetiu, mas se calou quando viu minha expressão de cinismo. — Você ouviu perfeitamente da primeira vez, senhorita.

— Claro —desacelerei o passo. — Mas queria ter a satisfação de escutar você dizer de novo.

Sua expressão irritada me encheu com uma sensação de triunfo. Achei que ele iria embora nesse instante, mas para minha surpresa, continuou me seguindo pela rua a uma curta distância.

— E então, vai entrar ou não, Isabel?

— Isabel? — franzi o cenho. — Não é muito profissional, Sr. Carter.

— Nada disso é profissional, porra. Você vai entrar?

Não deveria, mas ouvi-lo xingar e perder a compostura fez uma corrente elétrica se espalhar nas minhas veias. Eu queria ouvir aquilo de novo. Ver e ouvir. Queria muitas coisas com esse seu lado humano e descontrolado.

Merda. Eu estava delirando.

— E para que você quer que eu entre no seu carro?

— Vou dar uma carona a você. Manhattan pode ser perigosa a essa hora da noite.

Eu estava com as pernas bambas, apenas ouvindo sua voz saindo do maldito carro. Inferno. Não tinha a menor intenção de ficar presa a quatro portas com ele. Depois do que tinha acontecido no elevador... eu não queria nem pensar.

—Agradeço sinceramente pela preocupação, mas acabei de chegar onde queria — gritei, disparando pelas escadas da plataforma do metrô. — Tenha uma ótima noite, Sr. Carter. E dirija com segurança.

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