Capítulo 2
Depois da primeira vez, ele tomou gosto pela coisa. Ficou a semana toda com a prima de um parceiro e foi transando de várias maneiras, aprendendo os macetes.
A Daianara começou a reclamar de ter que ouvir gemido das "putas" do Camilo. Em menos de dez dias como fiel, ela já começou a instalar o caos. Foi o pontapé inicial para ele ir morar em um barraco sozinho. Ele não brigou nem nada disso, muito esperto, levou na brincadeira, se desculpou e falou ao Papito que tinha que aprender a foder direito. Orgulhoso como irmão mais velho, ele começou a perguntar quem tinha tirado o cabaço dele, se foi naquela noite do baile. Com desdém, ele falou que foi uma mina bichada sebosa com a buceta tão fedida podre que ele precisou passar limão no pau depois. Ela ficou furiosa. Na primeira oportunidade a sós, foi tirar satisfação, xingar e o ameaçou:
— Talarico, tá se achando, né? Vou te chamar nas ideias, vamo ver quem o Papito prefere, seu maldito filha da puta, fiz uma caridade contigo por te dar.
Ele riu afrontoso:
— E aí, sebosa, qual foi? Na moral, eu tô pouco me fodendo pra essa merda que cê tá falando, quem vai rodar nas ideia é você, caralho, tá de fiel e quis me dar, nem moral cê tem, se liga, sebosa é isso mesmo.
Ele não abaixou a cabeça, e a birra dela só foi aumentando, mas ela não era otária de abrir a boca, ou ia se dar mal também.
Em semanas, ela foi morar com o Papito, que estava muito envolvido.
Camilo foi morar sozinho e ganhou uma promoção no corre, virou "soldado" — indivíduo responsável pela defesa e ataque bélicos, sempre armado e pronto para participar de qualquer confronto, com direito até a salário fixo e trabalhando em esquema de plantões. Ele era confiável e eficiente, seguia as ordens do chefe, não perdia o foco, ele despertava inveja entre os demais colegas.
Não demorou muito para o pouco de normalidade daquele menino ir embora e dar espaço ao comportamento de marginal. No primeiro ano como soldado, derrubou todo tipo de inimigo e virou o cão de guarda do Papito. Qualquer perrengue era resolvido por ele. Cortava a quebrada de fora a fora diariamente, ele ouvia a todos como um advogado. Era uma comédia às vezes, tinha briga de vizinho, traição, briga de casal, tudo era tratado com a sua devida importância e respeito, até que o tiravam do sério. Burã era um desses que gostava de perrengue com geral.
Certa vez, Burã chamou nas ideias um menino que tinha roubado uma máquina de cortar cabelo. Como Camilo só cortava o cabelo lá quase que semanalmente, teve que aceitar cobrar. Quando foi tirar satisfação, soube de outros fatos: o menino pegou a máquina porque trabalhou e não recebeu. Como roubo era inaceitável e o Burã inventou toda uma história justificando o atraso do pagamento, a briga se estendeu por dias. Nenhum dos dois queriam fazer um acordo e foram irritando a todos os envolvidos.
Estava calor e o pagode ia começar. O perrengue começou na esquina de baixo. O Burã passou e o moleque provocou, chamou de cagueta, fez ameaça. Logo o Burã voltou com um pedaço de ripa e partiu pra cima, surrando o moleque pelas costas sem o direito de defesa. Quando a notícia chegou no pagode, Camilo desceu brabo de tudo, chegou dando coronhada no Burã e não parou até ele perder a consciência. O aviso foi dado: a briga morria ali, ou os dois iam pro buraco juntinhos. Foram para o hospital, e o Burã voltou pianinho, cortando caminho do corre. Começou a louvar cada vez mais na igreja, cheio de temor a Camilo e gratidão a Deus. Claro que ele se vingaria se pudesse, mas lá não tinha outra história, era se calar para sobreviver.
Outra coisa que não demorou para acontecer foi a mudança no relacionamento da Daianara. Ela queria estudar e o Papito não gostava, tinha ciúmes dela na escola. Ele nunca a proibiu de nada, mas a castigava pelas ações. As agressões verbais eram frequentes e sempre na frente de outras pessoas.
Ela participou da formatura do oitavo ano e ele não pôde ir. Por causa da sua posição no tráfico, nunca saía da quebrada, ainda mais para coisas que não eram de seu interesse. Na época, Camilo estava começando a ficar de rolo com a Kylian, prima da Daianara, por isso os nomes diferentes – as mães delas assistiam muita televisão quando engravidaram.
Kylian tinha quinze para dezesseis anos. Diferente de sua prima, não tinha corpão, era muito magra, baixinha e branca, seus cabelos eram cacheados, volumosos e castanhos. Tudo nela era motivo de piada para sua prima.
A mãe de Kylian era geniosa e muito amorosa, era tipo "amiga", mas gostava das coisas certas. Não a prendia porque não precisava, a menina sempre preferiu ficar lendo e assistindo. Morando lá, dificilmente as meninas namorariam bons homens. Na primeira vez que Camilo a viu foi no aniversário da Daianara na quadra, ela estava incomodada porque foi obrigada a ir e ainda teve que servir o pessoal.
A maioria dos meninos estava chapada curtindo, um dos últimos a chegar foi Camilo, estava virado do avesso porque teve problemas na boca, arrebentou a mão batendo em dois parças, ainda se deu ao trabalho de ir se arrumar pra curtir a noite.
Kylian estava mexendo com as bebidas, colocando mais gelo. Ele pegou duas cervejas ao lado dela, logo ouviu ao dar as costas:
— Oooo cara, eii, tô falando com você, caralho.
Daquele jeito nada amigável ele voltou invocado:
— E aí, qual foi, porra? Tem que pagar essa merda agora?
Ela se aproximou séria, colocou na mão dele uma sacolinha com gelo dentro:
— Sua mão tá toda ferrada!
Há muito tempo ninguém era tão gentil espontaneamente. Foi inesperado como um tapa na cara. Ela saiu andando e foi sentar, observou ele bebendo, fumando, olhando pra ela a noite toda. Quando ela estava indo embora ele saiu correndo atrás, foi à caça:
— Oooo, vai pra onde? Tá cedo ainda. Qual foi, pô, num vai me dar uma moral?
Ela continuou andando, ignorando. Encontrou um rapaz mais velho que ela. Com deboche ele continuou indo atrás, foi cumprimentar o cara:
— Alaaaaa, tem namorado, pô, cara, fiquei bolado a mina andando sozinha. E aí, beleza?
Ela saiu andando, puta da vida:
— Ele é meu irmão!
Aquilo foi mais agradável de se ouvir que as batidas do pancadão que estava estralando. Os dois começaram a rir resenhando. Educadamente ele se apresentou:
— Suave, cunhado? Quer uma breja?
