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Capítulo 4

Kevin

Passaram-se quinze anos desde a última vez em que me encontrei com eles. Já fazia um bom tempo que eu não conversava com meus pais, pois eles me afastaram dela. Aquela garota era a única que me importava profundamente na vida, minha amiga e meu amor, ela significava muito para mim.

Com apenas quatorze anos, eu já tinha consciência dos meus sentimentos. Sentia meu coração se entristecer pela maneira como meus pais racistas a tratavam. Para estar com ela, precisava mantê-la em segredo. Desejava estar sempre ao seu lado, mas guardava isso só para mim.

Desde que ela veio para minha residência, eu a percebia observando com desejo as nossas lembranças do colégio, o que me causava profunda tristeza e um sentimento de desolação.

Eu me perguntava o motivo dela não se dedicar aos estudos. E por qual motivo meus pais não a matriculavam em uma escola? Realmente, era responsabilidade deles providenciarem isso, entretanto, ao invés disso, ela era mantida em reclusão e durante nossas idas ao restaurante eles não lhe ofereciam comida, o que eu considerava inaceitável, e eu frequentemente expressava:

— Vocês não vão dar comida pra Hadiya, não é.

— Em casa ela come, está doido Kevin de deixar essa negrinha sentar na mesa junto com a gente? — Minha mãe respondia.

— Vocês sabem que a escravidão acabou há muito tempo, né?

— Cala essa boca garoto, tratamos ela como uma negra merece e pronto. — Falava minha mãe.

Seu olhar transmitia tamanha melancolia que me entristecia profundamente, porém, o que um jovem de 13 anos poderia realmente mudar?

Tentei auxiliá-la a assimilar as palavras, Maithê sempre se esquivava quando eu tentava encontrá-la, uma garota tão encantadora que parecia um animal aprisionado pelos meus pais, os quais detesto, juro que detesto. Depois de vários anos mantendo nossa amizade em segredo, eles descobriram e tentaram me afastar dela, me levando para outro país, simplesmente porque eu confessei que nutria sentimentos por ela. Minha mãe jamais aceitaria seu filho interagindo com uma jovem de pele escura, como costumava se referir a ela.

Era absurdo ver minhas irmãs cedendo a todos os caprichos deles, mesmo que sem vontade aparente. Talvez gostassem de usar Hadiya como um brinquedo, mas como eram mais velhas, com certeza sabiam o que estavam fazendo. Com oito e dez anos, já têm consciência suficiente para isso.

Por ser irmão amoroso, acredito que minhas irmãs fazem isso por influência dos nossos pais, o que me ajuda a aceitar que crianças não são capazes de ter pensamentos maliciosos.

Redigi uma carta para minha amada, expressando todo meu amor e fazendo votos de força e perseverança, o texto ficou extenso, cheio de romantismo, mencionei ainda meu retorno em breve para buscá-la e fugirmos juntos.

Fui até o aposento dela durante a noite, enquanto todos estavam repousando, para poder me despedir secretamente. Mesmo que ela não estivesse ciente disso e pudesse acreditar que eu não faria isso, adentrei o quarto e a vi adormecida. Que bela jovem.

Na realidade, prefiro dessa forma, testemunhar sua tristeza seria o pior cenário possível para mim. Estava derramando lágrimas e meu pai disse que homens jamais devem demonstrar fragilidade ao chorar, não me importo com seus conselhos, quero deixar minhas emoções fluírem, mas e daí, isso não diminuirá minha masculinidade, afinal, ainda sou muito jovem, apenas uma criança. Por que precisa ser assim?

Experimentei tanta dor, se fosse possível, a abraçaria agora e fugiria com ela, Hadiya, nunca vou esquecer você, meu amor, nunca compartilhei esse sentimento com ela e achei melhor assim, sei que sou inexperiente em assuntos de amor, mas meus sentimentos são genuínos.

Ela expressou seus sentimentos por mim, mas não obtive reação, eu evitei dizer que também a amava, apenas para partir em seguida.

Parei de me expressar sobre meus sentimentos com ela, prefiro assim do que machucá-la, pois já a vi muito abalada quando mencionei minha partida, presenciei suas lágrimas e me senti culpado por deixá-la nessa situação com meus familiares. Certa vez flagrei meu pai lançando olhares inapropriados para ela, e se ele tentar alguma coisa, assim como observei ele assediando outras funcionárias da casa, eu tomo uma atitude drástica.

Ela ainda é uma criança e ele não parece bastante sensato, ou talvez seja e eu não consigo saber. Orientei-a a manter a porta sempre fechada, embora ela já se sinta confinada e graças a Deus minha mãe tem as chaves. Não é saudável manter alguém aprisionado como se fosse um prisioneiro, mas era assim que ela se sentia nessa residência.

Permaneci observando minha pequena por um longo tempo, dei um beijo em sua testa e saí trancando a porta, para que minha mãe não desconfiasse. Guardei as chaves no mesmo local e chegou o momento de partir para a Alemanha, apesar de não querer, não havia alternativa.

Vou ter que ficar em um colégio interno, droga, como eu vou aguentar não ver o sorriso dela, que só se abre quando está comigo.

Tudo isso é péssimo, fico preso neste ambiente monótono e não suporto estar aqui, no entanto, preciso permanecer e me dedicar aos estudos para poder retornar para casa logo. Porém, os anos se passaram e eu continuava aqui, estudando e solitário, pois não tinha companhia, não conseguia lidar com essas pessoas arrogantes e mimadas.

Muitos anos se passaram e eu me tornei um adulto independente. Meus pais haviam guardado dinheiro para mim em uma conta poupança, e com esse dinheiro eu aluguei um apartamento e comecei a estudar psicologia na universidade. Apesar de ter me formado, acabei não exercendo a profissão e descobri que tinha talento para comprar negócios falidos, revitalizá-los e vendê-los com lucro. Com isso, construí uma grande fortuna para mim.

Com o passar dos anos, conheci uma mulher chamada Magda e começamos a ter um relacionamento amoroso. Decidimos nos casar e eu sempre sonhei em ter um filho. Quando Magda engravidou, a alegria foi imensa. No entanto, tudo mudou após o nascimento da nossa filha. Magda se recusava a cuidar da bebê, alegando que eu era o único que queria ter um filho. Ela deixou claro que não tinha vocação materna e que não queria saber da criança. Foi neste momento que percebi o quão diferente ela era da mulher que eu pensava conhecer. Suas palavras cruéis e desumanas ao se referir à nossa filha me fizeram sentir desprezo por ela.

Que mãe é essa?

Eu não acreditei naquilo, ela não tinha coração, pensei.

Contratei uma profissional para cuidar da minha filha, no entanto observava que Magda preferia frequentar festas e baladas, justificando que ainda era jovem e precisava se divertir. Ela se envolvia com drogas, se metia em confusões constantes, o que me fez optar por retornar à minha cidade natal. Apesar de todos os escândalos, permaneço ao lado dela por causa da minha filha. Tinha a esperança de que, com o tempo, Magda se transformasse em uma mãe dedicada, porém isso nunca se concretizou. Talvez fosse melhor tê-la deixado na Alemanha, país de origem de seus pais, que são pessoas extremamente ricas e possuem diversas empresas.

Essa pessoa excêntrica possui grande riqueza e nunca precisou trabalhar, possuindo uma conta bancária capaz de comprar uma cidade inteira devido à quantia abundante de dinheiro. Entretanto, o dinheiro está se esgotando e ela é jovem, com apenas 27 anos. Talvez eu devesse ter vindo apenas com minha filha, uma criança adorável e feliz, mesmo diante das adversidades causadas pela mãe, mas ela continua alegre.

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