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Capítulo 4

Capítulo 4

|ESTELA|

Sempre me pergunto o que há de errado comigo. Aos vinte e seis anos, já deveria ter vivido alguma grande paixão, já deveria ter experimentado o calor de um relacionamento, aquele tipo de história que as pessoas contam com brilho nos olhos. Mas aqui estou, sozinha, mais uma vez me sentindo invisível. Eu sou bonita, acho que sim, ao menos é o que dizem. Sou uma jovem loira, de olhos verdes, corpo magro, delicada... mas algo em mim parece afastar os homens. Nunca me senti verdadeiramente desejada, e isso me incomoda mais do que admito.

Tento ser simpática, mas não sou o tipo de mulher que chama atenção de imediato. Sou tímida, prefiro ouvir a falar, e fico constrangida em ser o centro das atenções. Talvez seja isso, essa quietude em mim que os espanta. Eles se aproximam, parecem interessados no começo, mas, de repente, somem como se nunca tivessem existido. A história se repete tantas vezes que perdi a conta.

Às vezes, me olho no espelho e vejo a raiz desse problema. Me pergunto o que eles enxergam que os faz ir embora. Será minha falta de confiança? Meus traços suaves demais, minha voz delicada? Eu me sinto insegura com tudo. Com minha aparência, com a forma como ajo... Acho que é natural me culpar, afinal, sou a única constante nessa equação.

As únicas pessoas que nunca saíram do meu lado são meu irmão Rodrigo e Apolo, o melhor amigo dele. Rodrigo, eu criei desde que nossos pais morreram. Ele tinha 15 anos quando o acidente aconteceu, e eu, com 21, tive que me tornar mãe e irmã ao mesmo tempo. Foi difícil, mas acho que conseguimos nos virar bem. Ele é a pessoa mais importante para mim, sempre será. Protejo ele com todo o meu coração, e sei que ele faria o mesmo por mim.

Quanto ao Apolo... Apolo é outra história. Ele sempre esteve por perto, como uma sombra constante. Não sei exatamente quando ele entrou em nossas vidas, mas ele nunca saiu. Rodrigo o trouxe para casa um dia, e desde então, Apolo se tornou parte da nossa rotina, quase como se fosse da família. Ele é divertido, está sempre me fazendo rir, e, quando estou com ele, esqueço de boa parte das minhas inseguranças. É fácil estar ao lado dele. Não há pressão, não há expectativas.

Agora, parada em frente ao espelho, me pergunto o que Apolo vê em mim. Será que ele nota todas essas falhas que vejo? Ele nunca disse nada. Talvez porque somos amigos. Melhor assim. Não preciso complicar essa amizade. Já tenho tanto com o que lidar.

Lembro da última vez que um cara tentou se aproximar de mim. Foi num evento da cidade, uma dessas festas típicas. Ele parecia interessado, me olhou de um jeito que não me deixava dúvidas. Trocamos algumas palavras, e eu achei que finalmente estava acontecendo, que talvez, desta vez, seria diferente. Mas, como sempre, ele simplesmente... desapareceu. Nem uma mensagem de texto, nem uma desculpa esfarrapada. Nada. Apenas silêncio.

Apolo estava lá também, e lembro dele me chamando para dançar pouco depois que o cara sumiu. Nunca pensei muito nisso. Talvez eu devesse, mas prefiro não mergulhar nas especulações. Sei lá, às vezes sinto que ele está sempre cuidando de mim, mas talvez seja apenas amizade, essa camaradagem que ele tem comigo e com Rodrigo. Ele é como um irmão mais novo... Não, isso não está certo. Não o vejo como um irmão. Vejo Apolo como algo diferente, mas nunca coloquei essas ideias em palavras. Seria perigoso. Ele e Rodrigo são inseparáveis. Eu não poderia arriscar isso.

Minha melhor amiga, Lara Mendez, é a única que sabe o quanto esses fracassos amorosos me afetam. Ela sempre tenta me animar, dizendo que o cara certo ainda vai aparecer, mas eu sinto que há algo de errado comigo que afasta os homens. Não pode ser coincidência. Mesmo quando sinto uma fagulha, mesmo quando acho que estou pronta, algo acontece. Sempre.

Lara tem sua própria vida, cheia de aventuras e histórias engraçadas sobre encontros, e eu invejo um pouco essa facilidade que ela tem com as pessoas. Eu, por outro lado, sou reservada demais, guardo meus sentimentos em uma caixa que mantenho fechada com cadeado. Acho que, de tanto me decepcionar, acabei me acostumando com a ideia de que ficar sozinha é o meu destino. Só que, às vezes, dói. Dói perceber que enquanto o tempo passa, enquanto o mundo se move, eu continuo parada, presa em minhas inseguranças e medos.

Rodrigo sempre tenta me animar, mas ele não sabe o quanto essas coisas me incomodam. Ele é mais novo, e talvez por isso não veja a urgência que eu sinto. Ele é confiante, seguro de si, e vejo que os relacionamentos vêm naturalmente para ele. Eu queria ser assim. Queria me sentir mais à vontade na minha própria pele.

Às vezes, quando estou sozinha no apartamento, escuto o som do elevador ou o barulho de Apolo entrando no apartamento ao lado. Saber que ele está por perto traz uma certa paz. Ele é uma constante em minha vida, alguém em quem posso confiar, mesmo que eu não tenha ideia do porquê ele nunca tenha se afastado.

Hoje, quando ele bate na minha porta com aquele sorriso fácil, segurando duas xícaras de café, meu coração dá uma leve acelerada, e não sei por quê. Ele tem esse efeito em mim, mas nunca parei para pensar o que isso significa. É engraçado como nos tornamos tão próximos sem precisar de grandes gestos ou palavras. Ele entra e se senta no sofá, como faz sempre, e começamos a conversar sobre coisas triviais. O assunto flui naturalmente, e eu percebo o quanto sua presença é essencial na minha vida.

— Estela, você está bem? — Apolo pergunta de repente, interrompendo minha linha de pensamento. Ele me observa com aqueles olhos castanhos profundos, e há uma preocupação genuína em sua voz.

Eu hesito antes de responder, porque não quero admitir que não estou bem, que há uma tristeza silenciosa me rondando há anos.

— Sim, só um pouco cansada, acho. Trabalho, você sabe como é — respondo com um sorriso forçado, tentando afastar o desconforto.

Ele não insiste, mas eu sei que ele percebe. Apolo sempre percebe. Ele é assim, atento de um jeito que me assusta às vezes, como se pudesse ler as coisas que escondo. Eu me sinto grata por ele não pressionar, por respeitar meu silêncio.

A verdade é que, por mais que me sinta invisível para o resto do mundo, Apolo nunca me fez sentir assim. Talvez seja essa a razão pela qual ele está sempre por perto. Talvez, de algum modo, ele veja algo em mim que ninguém mais vê.

Olhando para ele agora, sentado ali no meu sofá, me pergunto o que seria de mim sem essa presença constante, sem essa sombra ao meu lado.

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