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Capítulo 5

Noite

Queria colocar minhas mãos em Céu Sem Estrelas e queria separar cada membro de seu corpo, destruir sua garganta não tinha sido nada, nada comparado ao que ainda queria fazer. Nunca senti tanta raiva em minha vida, nem mesmo quando toda minha tribo foi morta, pois aquilo não era uma traição.

Mas o que ele fez. Céu Sem Estrelas era meu irmão, ou pensei que fosse. E ainda tentou tocar minha companheira. Minha.

O medo e o pavor de que ele a tivesse vinculado tinha se juntado a minha raiva, me deixando além de qualquer coisa. Assim que cheguei em nosso lar, aquela caverna onde tínhamos dormido por várias luas — nem sabia dizer quantas — observei Céu e os outros.

— Prometemos a Senhora da Noite que nunca mais tomaríamos sangue que não fosse de nossas companheiras! — explodi, minha voz fazendo até mesmo as paredes tremerem.

— Estamos famintos! — Luar Pálido rosnou, eles estavam banhados em sangue e isso não ajudava em nada meu humor.

— Todos estamos famintos! — urrei, furioso por eles deixarem a sede os cegar mais uma vez — E morreremos assim se não formos capazes de aceitar a vontade...

— Da deusa — Céu sorriu, não era primeira vez que ele questionava ordens, eu era seu líder natural, mas ele jamais aceitou minha liderança nem antes, quando meu pai e os outros sábios me escolheram para liderar nosso povo, e nem agora que só restávamos poucos de nós. — O que ela tem feito pela nossa sede? Aquela tribo estranha tem mulheres, elas podem ser nossas companheiras.

Meu mais fiel irmão me encarou, ele não tinha ido longe, tinha caçado animais — que faziam muito pouco para aplacar nossa sede — não sabia que os humanos ali perto podiam ser nossa salvação, me senti como um traidor, mas não podia deixar que nenhum deles a tocasse, não como Céu tinha feito.

— Isso é verdade irmão? — Nascido Das Sombras tinha aquele brilho esperançoso no olhar, todos nós precisávamos de companheiras.

— E acha que invadir seu lar e matar seus homens as fará confiar em nós? — não respondi, mantendo minha atenção onde ela realmente deveria estar, minha companheira.

— Sem outros homens sobram mais mulheres — Canto Sombrio sorriu, a julgar pelo olhar de Céu e Luar, eles concordavam.

— Não é isso o que a Senhora deseja. — Sombras disse o que todos sabíamos, o que fomos ensinados desde cedo, estávamos famintos porque desobedecemos, por que sujamos nossa honra.

— Nossas Companheiras sempre vieram a nós, de vontade própria, entendiam quão honroso era ser esposa de um guerreiro da noite. Vocês provaram mais uma vez que não merecem companheiras.

— E você merece? — Céu me encarou — Você me atacou quando a mulher me feriu.

A raiva nublou minha mente e novamente eu queria fazê-lo em pedaços por tocá-la, mas antes que eu deixasse as palavras que me condenariam escapar um brilho prateado nos cegou e me vi de joelhos, os passos ritmados se aproximaram e a presença esmagadora de seu poder apertou minhas entranhas.

— Vocês são como crianças travessas, desobedientes e impacientes. — a voz dela fez meu sangue gelar, toda minha raiva silenciada.

— Temos fome. — Céu rosnou e desejei que assim como a Senhora silenciou outro irmão rebelde ela o fizesse com ele.

— Vocês não pagaram pelo que fizeram e vão acabar mortos se não me obedecerem. — Céu sufocou, levando as mãos ao pescoço, como se fosse incapaz de respirar.

— Noite longa — estremeci ao ouvir meu nome — Olhe para mim. — Fechei meus olhos. Não agora, não agora que eu a vi, que sei que ela existe não... — Não tenha medo — sua voz se suavizou — Não vou feri-lo.

Mesmo com medo obedeci, abri meus olhos e a encarei. Ela era como nós fisicamente, sua pele da mesma cor, seus olhos vermelhos, mas ela era pequena e delicada. Seu sorriso fez a pressão desaparecer.

— Estou muito satisfeita com você. O que foi feito no passado, foi perdoado, mas precisa seguir o que um dia lhe foi ensinado. Coragem, força e benevolência. Não é porque você é mais forte do que alguém que deve subjugá-lo, isso não é força é covardia. — ela fez uma pausa — Uma companheira está a caminho e um de vocês será escolhido.

Senti o peso daquelas palavras e meu coração se encheu de medo e esperança. A Senhora me olhou, como se soubesse exatamente o que pensava.

— Paciência e gentileza — ela disse, como se adicionasse um conselho — Não ousem voltar à vila dos homens, nem matar mais ninguém, juro que o próximo a quebrar nossas leis será morto e eternamente castigado e desonrado. É a última chance que dou a vocês.

A deusa desapareceu e suspirei aliviado. Céu, Luar e Canto sumiram quase que imediatamente, deixando somente eu, Sombras e o jovem Estrela Brilhante. Nosso mais jovem era obediente, mas silencioso. Ele se afastou, como se pudesse sentir que eu queria conversar com Sombras.

— O que aconteceu? — ele questionou, mais curioso do que acusatório.

— Preciso confessar algo, mas preciso que me prometa que não vai contar aos outros.

— Não trairia sua confiança, sei como te desobedecer trás consequências.

Na noite em que perdemos tudo eu fui o único a dizer que deveríamos pedir a senhora da noite nossa vingança, que ela nos tinha feito quem éramos e nos protegeria de mais aquela ameaça, fui vencido pelos demais. Suspirei.

— Encontrei minha companheira. — Sombras arregalou os olhos.

— Como? Você a vinculou?

— Não, ela tem medo de nós. — ele assentiu, entendimento brilhando em seus olhos.

— Foi atrás de Céu por causa dela?

— Ela vive na vila dos humanos, algumas horas daqui. Tive medo...

— Eu sei. — Sombras colocou a mão em meu ombro, um gesto de conforto sem palavras. — Se Céu souber antes que a vincule...

— Por isso não disse nada, sei como ele é. Nada pode tocá-la...

— Como sabe que ela é sua? — o encarei irritado e isso o fez erguer as mãos — Só quero saber como é, nós só vimos acontecer... Éramos muito jovens quando o último guerreiro teve sua companheira. — concordei, deixando minha raiva de lado.

— Não sei dizer. Eu sinto, dentro do meu coração, quando fecho meus olhos vejo seu rosto, não consigo esquecer seu cheiro...

— Estar faminto não deve ajudar — ele riu.

— É fome, mas não é como querer sangue... é mais... forte.

— Do que a sede que sentimos? — assenti e ele assobiou. — É verdade que ela atingiu Céu?

Sorri. Ela não era só linda. Era forte. E tinha protegido um pequeno humano de todos, e se colocou em perigo para mantê-lo assim. Arriscou a vida por sua segurança.

— Sim.

— Gosto dela. — não vi desejo em suas palavras, só simpatia por minha companheira. Ela seria uma de nós em breve.

— Eu também.

Tinha medo que ela não fosse a companheira que viria até nós e medo por ela vir, e se estivesse enganado e outro fosse escolhido como seu companheiro. Elas escolhiam e nós podíamos concordar ou não, mas dúvida que a essa altura algum de nós recusasse uma mulher. Mas eu só aceitaria se você fosse minha companheira, eu a tinha escolhido e esperava que ela fizesse o mesmo.

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