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Capítulo 2

Capítulo 2

Eu estava voltando para casa.

Ou pelo menos para o lugar em que eu chamava de lar, há pouco mais de dois anos e meio.

Havia pegado o ônibus até o apartamento, que ficava em uma região urbanizada, perto do Centro de Wahtadre, eu parecia um robô, me movendo maquinalmente, por todo o percurso, eu simplesmente não conseguia soltar os testes de gravides, não me importando pelo o que meus vizinhos fossem pensar, afinal, isso importava agora? Tinha problemas muito maiores que me preocupar com os idiotas fofoqueiros.

- Menina, Liane! - Ouvi me chamar, quando estava prestes a passar pela portaria do prédio, olhei em volta, e gemi, em pânico, a vizinha do 17, com seus enormes bobes na cabeça, e o vestido florido, cobrindo o enorme corpanzil, vinha em minha direção, com passos pesados e firmes, ela não poderia perder a novíssima fofoca.

Esqueça o que disse sobre não ligar para fofocas, A mulher que vinha em minha direção, era terrível com sua língua afiada, o que ela não sabia, inventava, e sempre, de uma maneira pior que a outra.

- Há! Bom dia Sra. Carmen! - Virei as costas para a mulher, e corri para o elevador, constatando tarde demais que fora uma péssima ideia. Deveria ter ido de escadas. A odiosa senhora, simplesmente me seguiu, se enfiando no elevador comigo. Apesar do que tudo indicava, a vizinha do 17 era surpreendentemente ágil.

- Então garota Liane, isso são testes de gravidez? - A mulher perguntou, curiosa, apontando para os bastões, presos pela minha mão.

- Isso? - Perguntei à enrolando, por que o elevador estava tão devagar? - São... Termostatos! Isso! Jenna estava com um pouco de febre recentemente... - dei uma risada sem graça, tentando disfarçar o rubor em meu rosto, e a tremedeira em minha voz. - Acho que talvez ela tenha pegado um resfriado.

A Sra. Carmen, me olhou descrente, afiando o olhar.

- Isso não parece um termômetro! Com certeza não! - Afirmou para si mesma. - Está grávida menina Liane... Ou Jenna? - A mulher perguntou com os olhos brilhando.

Ela, tinha como hobbie infernizar a vida de Jenna, é se não conseguisse, infelizmente infernizava à minha.

- Óh não! - Eu ri, um riso sofrido. - É à tecnologia! A evolução! Agora os termômetros modernos são assim! Práticos e econômicos! - Dei um sorriso aberto para a fofoqueira, enquanto sai do elevador, que acabará de abrir, alíviada, enquanto ouvi a mulher gritar atrás de mim;

- Se é assim vou mandar uma sopa caseira para Jenna, uma pena ela não estar grávida ... - Ela disse, pousando a mão na barriga Grande é mole, enquanto as portas do elevador fechava. - Mande melhoras para ela!

- Pode deixar! - Gritei sobre os ombros, prometendo algo que nunca iria fazer. Termômetros, de onde eu tiraria isso? Eu errei o nome do maldito termômetro para inventar uma mentira convincente? E o pior era que eu achava que realmente tinha dado certo. Esperava sinceramente que eu não chegasse a um estado de uma cleptomaníaca mentirosa, porque sinceramente eu podia contar nos dedos o que na minha vida era verdade.

Entrei no apartamento, que eu dividia com Jenna. O lugar não era luxuoso, longe disso, mas com suas paredes azuis e os móveis simples, era bem acolhedor, o que bastava para mim. Tranquei a porta, e me joguei no sofá. Eu ainda era incapaz de largar os malditos testes, eu intercalava os olhares entre minha barriga é os bastões, Eu não tive coragem de os usar ainda, tudo parecia ser somente um sonho louco, e se fosse, eu queria acordar de vez, daquele pesadelo.

Engolindo em seco, eu levantei e fui ao banheiro, aproveitando que eu estava apertada, de novo, para fazer xixi. Fiz o que tinha que fazer, e deixei eles em cima da pia, aguardando os cinco minutos, que estava escrito no manual, para esperar. Não aguentando de ansiedade, eu levantei e fui na cozinha, para beber uma água com açúcar, a ansiedade estava afetando a minha pressão, já que eu sentia que ia desmaiar a qualquer momento.

Enquanto bebia água na cozinha, ouvi a porta bater, sinal de que Jenna chegara da faculdade de meio período de direito, que fazia.

- Lia! - Gritou, da sala. - Já chegou?

- Oi Jenna, cheguei a pouco tempo. - Respondi. Eu deveria contar agora, ou depois?

- Que bom, como foi à consulta? Você acredita que encontrei aquela mulher horrível do 17? Tinha que ver as maluquices que ela tava me falando! - Meu corpo gelou na hora, o que a mulher disse para Jenna? Hô meu Deus!

- É... Mes... mo? O que ela disse? - Gaguejei, meio receosa.

- Aquela mulher é louca! veio enchendo meus ouvidos, com um papo maluco, que a tecnologia, ainda iria se voltar contra nós, que até os termômetros agora eram tecnológicos! Totalmente pirada! Ela não parava de me perguntar se eu estava bem do resfriado. Que resfriado? Ela tava me jogando praga? Eu tenho a saúde de um cavalo! - Me respondeu ainda na sala, o que me fez respirar de alívio, que logo virou pânico, quando ouvi minha amiga, ir na direção do banheiro. - Nossa, essas provas finais da faculdade estão me matando! Vou tomar um banho, pega a toalha para mim?

- Não entra aí! Não entra no banheiro! - Gritei desesperada, correndo em direção ao único banheiro do apartamento. Eu esqueci os testes, os malditos testes de gravidez, eles ainda estavam em cima da pia.

Cheguei ofegante na porta do banheiro, mas tarde demais, Jenna já me esperava com os bastões nas mãos, os dois, mesmo de marcas diferentes, apontavam dois pauzinhos, sinal de positivo. Ela me encarava, os olhos furiosos, mas também descrentes.

- O que significa isso, Liane Shoe? - Grunhiu para mim, com o rosto raivoso, mas, acima de tudo, desaprovador.

- Jenna... eu... - Meus olhos encheram de lágrimas, não só porque eu desapontei minha amiga, como também, porque, os testes de gravidez, indicava que a vida que eu construirá, estava ruindo, aos poucos.- Eu não sei como isso foi acontecer!

- Não sabe? Como assim não sabe? - Gritou raivosa.

- Foi naquela maldita boate! Aquele cara dos olhos azuis, só pode! Eu não estive com ninguém antes disso!

- Peraí, você não conhece o pai? Você se engravidou de um estranho Liane?

- Eu... É. - Disse cabisbaixa.

Jenna respirou fundo, massageando a testa, mas sua cara de raiva passara, minha amiga parecia...Melancólica.

- Olha Lia, eu sinto muito, mas não posso te ajudar... Eu estou na reta final da faculdade, o trabalho me tira todo o tempo, não dá! Não consigo te ajudar com um bebê, eu jamais iria dizer para você abortar...- Ela falou baixo, evitando olhar nos meus olhos. - Mas também não dá para mim, acho melhor você encontrar outro lugar. - Disse por fim, quase sussurrando.

- O quê? - Perguntei com os olhos, marejados. Ela não podia fazer isso, éramos amigas! - Jenna! Eu não tenho para onde ir!

- Eu... eu sinto muito Lia! - Gaguejou, se trancando no banheiro.

Enxuguei minhas lágrimas, sentindo uma raiva odiosa encher meu peito, da maldita escória que um dia eu chamei de amiga, quando eu mais precisava, ela me deixou. Me abandonando.

Fui até meu quarto e enchi uma bolsa grande, com minhas roupas e documentos, tirando um bolo de dinheiro escondido, de dentro de uma das gavetas da cômoda, aquele dinheiro era para que eu conseguisse comprar um carro, mas agora... Teria outros propósitos.

Feito isso, peguei a bolsa, e a coloquei nos ombros, e fui para a saída do apartamento, perto de sair, olhei uma última vez para o lugar, em um olhar carinhoso, eu sentiria saudades dali, tivera boas lembranças. Balancei a cabeça reprimindo minhas emoções com severidade, mesmo sentindo os olhos marejados de novo, sai de vez do meu ex-lar, jurando nunca mais voltar.

Era verdade que eu estava apreensiva com meu eminente e desconhecido futuro, mas eu sabia, eu me sairia bem, por que... Acima de tudo, eu, Liane Shoe, era uma sobrevivente. E, eu não estava mais sozinha.

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