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Chloe Banca o Cupido

— Dança de salão? E por que eu faria dança de salão, Chloe?

— Porque você conhecer um cara legal. E porque foi assim que a Baby conheceu o Johnny.

Mia interrompe seu alongamento de braços para me olhar, por meio segundo, antes de retomar a sequência. 

O Riverside Park é bonito e parece o lugar perfeito para uma corrida matinal. O problema é que são apenas sete horas da manhã. De um domingo. E eu odeio corridas, sejam elas matinais ou não.

Quase dou risada, mas a vontade de chorar é maior. Não acredito que Mia e eu decidimos mesmo fazer isso. Correr pelo parque sem um motivo claro como fugir de um bandido armado? Não é algo esteja no meu ranking de favoritos. A essa hora, eu deveria estar preparando waffles e panquecas com Abigail para o café da manhã. Em vez disso, estou vestindo uma roupa de lycra ridícula que evidencia demais a minha bunda.

— Está legal. Eu, provavelmente, não deveria. Mas vou perguntar. Quem é Johnny?

— Patrick Swayze — eu olho para Mia, desconfiada, dando início a minha própria sequência de alongamentos. Se vou fazer isso, preciso fazer direito para não acabar com dores horríveis o resto da semana. Max me advertiu a respeito e ele é o meu mentor quando se trata de qualquer tipo de atividade física. — Dirty Dancing? Não é possível que você não conheça.

— A pergunta é: tem mais de cinco anos? Então, não. Não conheço.

— Você não tem cultura cinematográfica.

— Não tenho cultura cinematográfica e não gosto de dança de salão. Como posso conhecer um cara que eu goste em um meio pelo qual não tenho nenhum interesse? — ela faz uma careta. — Imagina as conversas estimulantes que nós dois teríamos.

— Mas vocês não precisam falar de dança de salão, o tempo todo. Veja o Max e eu.

— O que é que tem?

— Nós não discutimos as maravilhas do setor automotivo, o dia inteiro — um cara bonitinho passa correndo pela gente e dá uma secada, indisfarçada, na minha bunda. Eu suspiro, com uma pontada dolorosa no estômago. — Na verdade, Max e eu não conversamos sobre nada há muito tempo...

Mia solta um gemido de frustração.

— Ele anda ocupado, não é? É esse contrato com a Miridian...

— Eu sei. Juro por Deus, que não consigo mais ouvir falar desse maldito contrato!

— Me desculpe — ela bebe um pequeno gole de água. Provavelmente eu deveria ter me lembrado de trazer uma garrafinha para mim, também. Acho que sou uma péssima atleta de final de semana. — É que é uma grande oportunidade para a empresa e estamos todos meio que empolgados. Você entende?

— Não, nada me empolga, ultimamente. Minha vida anda um tédio total — confesso, dobrando a coluna para a frente e tentando, inutilmente, tocar os dedos dos pés. — Admito que eu achei que fosse ser muito mais fácil.

— Ser a esposa de um CEO bilionário?

— Sim. Aparentemente, comparecer a jantares e eventos de gala não são o meu ponto forte.

A conversa cessa quando começamos a corrida. Eu faço o possível para controlar a respiração, mas é claro que não consigo. Não conseguiria nem se viesse desenhado como fazer isso em gráficos. Na verdade, acho que eu entenderia ainda menos porque eu odeio gráficos. Eles são a vida e a honra de Max, mas não fazem o menor sentido para mim.

Em pouco tempo, já estou ofegante. E cansada. Dolorida.

Pior, profundamente arrependida de ter começado aquilo.

Para o meu alívio, Mia, ao meu lado, parece tão perdida quanto eu. Ela é alta, com membros esguios que, claramente, não estão sabendo o que fazer para manter a coordenação com o restante do corpo. Seu cabelo escuro e crespo está contido por dois coques laterais que a fazem lembrar uma versão mais moderna da Princesa Leia — que ela, provavelmente, não reconheceria por ter mais de cinco anos.

— Vamos parar? — eu imploro, sem ar, um segundo antes de colocar as mãos nos joelhos com o corpo inclinado para a frente. — Acho que eu deixei meus dois pulmões em algum lugar no meio do caminho.

Mia para, alguns metros adiante, trotando.

— Você não pode parar de repente assim. Tem que ir diminuindo o ritmo, primeiro.

—  E como você sabe tudo isso?

— Sei lá — ela dá de ombros. — Acho que eu vi no Youtube.

Eu começo a dar risada, mas não tenho forças. Por isso, desisto, e Mia se aproxima. Ela me estende sua garrafinha de água, em solidariedade. Eu bebo do gargalo, sem cerimônias.

— Ok, você odeia correr e eu, também — ela me olha, confusa. —  Por que estamos mesmo fazendo isso, Chloe?

— Porque eu quero entrar em forma.

— O que? Por quê?

— Ganhei uns quilos depois do casamento e preciso perdê-los — eu endireito a postura e dou de ombros, tentando encontrar força nas pernas para continuar caminhando pelo menos. O suor escorre pelo meu rosto, pelas costas e pelos seios, por debaixo da blusa. Estou nojenta. Não tem nada de glamouroso em ficar toda suada quando você nem está transando. —  Bom, na verdade, eu sempre fui cheinha. Isso nunca me incomodou. Mas, agora, ao lado daquelas socialites magricelas do clube de golf, eu fico pensando se vou conseguir entrar no meu próximo vestido.

— Nossa, que superficial — ela finge que vai vomitar. Então, franze a testa. — Espera aí, você frequenta o clube de golf?

— Não, é brincadeira. Mas Max joga tênis e faz muitos exercícios. É assim que ele mantém a forma — eu suspiro. Estamos perto da saída do parque, graças a Deus. E não muito longe de casa. Só consigo pensar em tomar um banho e comer alguma coisa hipercalórica. —  Esse é outro problema. Eu acabo parecendo uma garotinha desleixada ao lado do Senhor Deus Grego do Sexo.

— Ei, como você descobriu o apelido dele no escritório?

Eu a fulmino com os olhos.

Mia cai na gargalhada.

— Brincadeirinha. E você não precisa emagrecer, Chloe. Precisa encontrar uma atividade que goste, que te dê prazer. E não estou falando de sexo com o Deus da Morte... porque esse, sim, é o apelido dele no escritório. Estou falando de algo para dar sentido a sua vida. Uma ocupação de verdade. Alguma coisa que roube o seu fôlego.

— Isso rouba o meu fôlego — eu faço um gesto amplo, mostrando nós duas no parque, e Mia ri.

Eu prendo o cabelo de novo. Várias mechas se soltaram do rabo de cavalo, então faço um aperto mais firme dessa vez. Ultimamente, parece que eu ando em guerra com o meu cabelo e com tudo mais no meu visual.

Eu adoraria mudar radicalmente.

Talvez eu devesse raspar a cabeça, colocar alguns piercings e assustar criancinhas no parque.

— Mia?

— O que?

— Como é o Max no trabalho?

Ela dá uma olhadinha de canto para mim.

— Exigente. Cruel. Sanguinário — admite, mas não parece nem um pouco chateada com isso. E sei que não está. Mia é a nova analista junior do setor de robótica, das empresas Lancaster. E ela é tão workaholic quanto o chefe. — Aposto que você não consegue nem imaginá-lo assim.

— Ah, eu consigo, sim. Não se esqueça que eu, também, já trabalhei para ele.

— É verdade  — ela ri, tirando o celular do bolso da bermuda e dando uma olhadinha nele. — Droga, é o Jeremy.

— Seu irmão, Jeremy?

— Sim, ele está vindo de Boston. É o recesso da faculdade e ele vai se hospedar no meu apartamento, por alguns dias, antes de ir para a praia com os amigos.

— Ele não ia para a NYU?

— Ele recebeu uma bolsa em Boston e acabou se mudando.

O nome de Jeremy me faz lembrar a reação estúpida e irracional de Max, um ano antes, quando o irmão de Mia me deu uma carona.

Ah, os velhos tempos...

Não sei se sinto falta do Max ciumento. Mas, com certeza, sinto falta do Max atencioso, que deixava o trabalho de lado e me levava para andar de patins no Rockfeller Center.

Foram tempos confusos, mas também bons tempos.

— Algum problema, Chloe?

— Não. Por quê? — eu pisco de volta para a realidade.

— Porque passamos da entrada da sua rua, há uns cinquenta metros, e você continua andando.

— Ah, merda...

Eu paro e olho ao redor, com um longo gemido exausto.

Ela tem razão.

— Eu preciso sair da rotina, Mia. E urgente — confesso, olhando para ela em busca de ajuda. —  Ou vou acabar pirando, é sério. Ser a Sra. Lancaster está acabando comigo.

— E por quê? O que tem de errado com a vida no clube de golf?

— Nada. Só é... chato — faço bico.

— É chato porque essa não é você. Festas, jantares e perder peso? Me desculpe, mas não se parece nada com a Chloe que eu conheço.

Ela está certa. Mas como vou explicar que me sinto insegura ao lado de um homem que poderia ter qualquer mulher do mundo ao lado dele.

O motivo pelo qual Max me colocou em sua vida ainda é um mistério para mim. Lindo, sexy, bilionário. E dono de um tanquinho impressionante.

Por que ele tinha me escolhido como esposa, afinal?

— Tenho uma ideia — eu aviso, com uma vibração pelo corpo, como uma corrente elétrica. — Por que eu não consigo um namorado em potencial para você?

— Você ficou maluca? Quero dizer, mais maluca ainda...

— Por favor, Mia! Isso me daria algo em que pensar. Algo para me ocupar por um tempo.

— Não confio no seu poder de escolha, Chloe — ela arqueia as sobrancelhas grossas. —  Você é doida e impulsiva.

— Mas conquistei um viúvo cobiçado, não foi?

— Isso não é o suficiente — Mia cruza os braços e bufa.

– Sexy, gato e delicioso?

— Ok, isso foi a flecha do cupido — ela sorri. — Prefiro não arriscar, obrigada. Com a sorte que eu tenho, eu acabaria flechando um sapo.

Que pessimista.

Resolvo ignorá-la completamente.

— Eu pensei...

— Ai meu Deus, voce não vai calar a boca, não é?

Vejo a mansão, com suas colunas imponentes e a fachada moderna, e o meu coração se agita quando recordo a primeira vez em que estive ali. Tudo parece ter acontecido há um milhão de anos, mas ainda é tão recente. A prova disso é que ainda não consegui me acostumar ao meu novo papel naquela casa.

— Eu apresento você a alguns caras — sugiro de repente e Mia geme.

— Seus ex amigos barra pesada? Não, obrigada.

— Nada dos meus ex amigos... anotado. Quem sabe os amigos do Max?

— Chloe?

— O que?

— Eu prefiro cuidar da minha própria vida sexual, certo?

Faço uma careta.

— Não estamos falando de sexo aqui. Você quer um romance, só para ficar registrado.

— Isso é você quem está dizendo — ela pisca um olho e eu reviro os meus.

Chegamos a entrada da mansão e o portão é aberto.

Nosso chefe de segurança, Carter Reynolds, está de folga.

Ele é um ex agente do FBI linha dura e eu o detesto. Está sempre tentando encontrar um jeito de ficar na minha cola. Max é maníaco por controle e arrumou um esquema de proteção vinte e quatro horas dentro da mansão. Somos vigiados por um sistema de câmeras bastante moderno e temos uma equipe bem treinada comandada por Carter.

Depois das ameaças de Liv, quase um ano atrás, Max ficou ainda mais rigoroso. Mais travas nas portas, mais câmeras espalhadas e o dobro do número de seguranças. Eles são seis, agora, no total, espalhados pelo lugar.

Quem vem nos receber é Jason Simms. Um pouco mais jovem e muito menos engessado do que Carter, o que me fez simpatizar com ele de cara. Jason foi admitido no mês anterior e tem ótimas referências.

Seu cabelo é escuro e os olhos castanhos, suaves. Eles acompanham os lábios quando estes se abrem em um sorriso amigável.

— Sra. Lancaster. Como vai?

— Olá, Jason. Max chegou?

— Ainda não, senhora.

Suspiro, olhando o relógio.

Max saiu para jogar tênis e já deve estar voltando.

— Esta é minha amiga, Mia — eu apresento os dois.

— Como vai a senhorita?

Ai meu Deus! Provavelmente estou sendo precipitada, mas, pela olhada significativa dele para ela, eu fico achando que já rolou um clima entre eles.

— Bem, obrigada — Mia responde, com um sorrisinho indecifrável. — Chloe, eu não vou entrar.

— Ah, não? Por que?

— Eu só vim acompanhar você. Preciso terminar um trabalho para amanhã.

— Droga — eu digo, decepcionada. Mas uma ideia me ocorre e meu humor muda rápido. — Por que você não leva Mia até em casa, Jason? Tenho certeza que não vai fazer tanta falta por aqui, nos próximos trinta minutos. Ela não mora longe.

Ele olha de Mia para mim, atordoado. Parece relutar com sua resposta até que diz:

— Creio que o Sr Lancaster não aprovaria, senhora.

— Bom, ele não está aqui. Está? — eu ergo as sobrancelhas de leve. — Na ausência dele, sou eu quem dou as ordens.

— Sim, senhora, mas...

— Então você tem permissão para sair e levar minha amiga até a casa dela. Na verdade, não é uma permissão. Mas uma ordem.

Jason não parece convencido. Nem um pouco.

— Certo, senhora. Como achar melhor.

Mia olha para mim como tivesse prestes a me matar.

Ah, ela não faz uma ideia.

Quando eu enfio uma coisa na cabeça, eu nunca desisto.

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