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Capítulo 2 - Iron

— Relatório da missão. — solicita Misha.

— O relatório já foi entregue. — rosna Kane, quase não suportando a presença de Misha.

O mausoléu em que estamos é frio e úmido, abaixo de uma estrutura fodida de mais algum bacana metido à babaca. Como na maioria das vezes, se foi pago, vai ser entregue. E Koch tem como costume contratar nossos serviços, o único problema é aguentar Misha. Porque todo velhote cheio da grana, tem que ter uma puta mimada? Puta. Isso mesmo. Puta, não espera, não vou desmerecer o trabalho dessas senhoras. Misha dá sem receber, principalmente se eu estalar os dedos. O fato é que ela não me desce. Chata pra caralho!

— Isso é jeito de falar comigo, Kane? — retruca se sentando ao meu lado, na merda do sofá rasgado, duro e com a porra da minha bunda fincada à beira da madeira. — Iron, diz pro seus cães me tratarem com mais respeito.

Me levantei no momento em que ela se preparava para se encostar em mim fazendo beicinho, ignorei seu pedido falso, cruzei os braços na ponta do peito e vi ela sorrir com o movimento.

— Cadê o pagamento Misha? Seu pai é trouxa, ou o quê? — Ela mexia na ponta dos cabelos curtos, fingindo não me ouvir. — Setenta por cento na entrada, trinta na entrega. O acordo é simples. Se não trouxe a grana, me dê o prazer de tirar sua cabeça do pescoço e dar de troco pro seu velho.

Então ela me olhou ao mesmo tempo que Kane se colocava ao meu lado, e Dominic acionava a trava de um rifle silencioso.

— Eu adoraria ficar sem os trinta por cento, se o troco for a vida dessa cadela. — resmungou Dom, sem nenhuma paciência.

Ela não parou para pensar, e como sempre, estava apenas enrolando. Se levantou a contragosto, passou pela porta de metal e voltou com duas muralhas segurando um baú. O baque pesado do objeto no chão fez os tufos de dinheiro remexer e saltar alguns pelas beiradas.

— Seus trinta por cento, cão de rua! — reclamou cruzando o braço e só agora lhe dei o que queria, uma piscada e um sorriso sacana. — Você é um idiota.

— Saudações princesa. Foi ótimo fazer negócios com você. — respondo irônico.

Kane e Dom se certificaram para ver se os fundos não estavam vazios, remexeram nas notas e verificaram se estas não são rastreáveis. Tudo limpo. Mais um trabalho sujo, bem feito. Logo, já estavam levando o pote para a traseira do carro forte, enquanto Misha tenta mais uma vez me importunar.

— Você não pode fazer isso comigo Iron… Não foi especial pra você? — choramingou em meu ouvido.

Travei os dentes e cerrei a mandíbula, tentando coletar rastros de paciência para me dar com aquilo. Esse é o problema de quem enfia o pau no buraco errado. Trás como peso na consciência, Misha. Aquele tipo de cadela que você só come nas últimas necessidades.

— Não. — respondi seco.

Me juntando ao bando de “cães”, como a própria Misha diz, tomo a direção do volante no carro forte, direciono para a pista de acesso a saída e Misha ordena que levantem o portão, fuzilando minha existência com a força de seu olhar. Grande merda, já que o meu saco não incha para os seus chiliques.

— Você tinha que fazer isso? — iniciou Kane contrariado e falando a mesma merda nos últimos tempos. — Tinha mesmo que fazer isso? Justo a Misha, cara? Koch é um dos nossos melhores fornecedores, se ele souber que você enfiou o pau na Misha, já era.

— A qual é Kane — interferiu Dom —, qualquer um de nós teria feito. Ela se esfregou em todo mundo. Se brincar Koch sabe dessas merdas, e está rezando para que alguém leve a filha pra longe e tire esse inferno de suas responsabilidades.

— Esse assunto de novo? — murmuro desanimado — Vocês não sabem falar de outra coisa?

— Eu não vou com a cara DELA, e toda vez que ela vai fazer a entrega também faz alguma gracinha. — reclamou Kane, ainda zangado.

Eu não podia tirar a razão dos caras, pois Misha tem se tornado uma dor no saco. Principalmente depois de uma foda, uma grande bebedeira e o envolvimento dela nos negócios do pai. Misha tomou a liberdade e nos apelidou de cães, tentou nos dar ordens e tomou no cú quando percebeu que sexo e negócios não se misturam comigo. Koch, seu pai e um velho político, mais criminoso do que qualquer um, apenas finge que não sabe. Às vezes, até manda a filha usar a boceta para algum negócio grande. Se ele pensou que ela ia me conquistar, se fodeo. Vou continuar cobrando pelos meus serviços, pois no gratuito não vai sair nada. E se ela não parar de encher o saco, a próxima vai custar o dobro.

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Trabalho, doce trabalho. Abrir os fundos do carro forte, sentir o cheiro da grana e o prazer de um trabalho bem feito, não tem preço. Aliás, tem sim. Só alguns milhões de dólares por vez. Com um único detalhe. Dessa vez temos na traseira do carro o corpo de uma mulher.

— É melhor acordá-la. — sugeriu Dominic.

Ao lado do baú o corpo amordaçado da secretária vadia está adormecido, tivemos que amarrá-la até a conclusão do pagamento, apenas para que não houvesse outra merda de imprevisto. Um relatório de rotina é feito antes de qualquer missão, e nós tínhamos certeza que o prédio estaria vazio naquele horário. Grande fodido engano. Dois filhos da mãe resolveram fazer um happy hour no elevador. Sobrou pra quem fazer o limpa? Pro filho da puta aqui.

Um dos códigos da irmandade é não matar mulheres, pelo menos não diretamente. Existem várias formas de se fazer um trabalho sujo, de um jeito “limpo”. O código, é apenas para manter a ordem, e saber que uma mulher estava lá dentro no momento do bombardeio, foi uma merda de imprevisto.

— Quando foi que erramos desse jeito? — questionou Kane.

E eis que ele falou uma grande verdade. Nunca. Nunca deixamos um fio de cabelo passar, quem dirá uma piranha louca pra foder com o chefe no elevador. Então, como foi que isso aconteceu? Irritado com essa pequena “falha”, subi no baú do carro forte, bati com força na lateral chumbada e o estrondo do metal fez a mulher começar a se mexer. Saquei dos bolsos um punhal e me aproximei o suficiente para cortar suas amarras. Ela se assustou imediatamente, se arrastando para o canto do baú e quase não conseguindo respirar de medo. Na testa, uma mancha de sangue, indicando a batida do blindado durante a fuga na missão.

— Quem é você? — perguntou com medo.

Ela não pode me ver, não o meu rosto como é. Preservar nossa identidade é algo extremamente crucial. Para o nosso prazer e segurança, andamos uniformizados, fardados e armados até os dentes. Então, eu imagino que acordar com uma criatura monstruosamente coberta de preto até os cabelos, não deve ser uma boa visão.

— Não te interessa. — respondi impaciente. — Se quiser viver saia do carro forte, a bela adormecida já dormiu demais.

— Eu não tenho nada — murmurou —, não estou nem mesmo com a minha bolsa, por favor me deixa ir!

— Se eu quisesse algo, não pegaria de você. Agora desce. — ordeno me levantando — Não vou mandar de novo.

Devagar, quase sem saber o que fazer, a mulher conseguiu descer do carro forte, só agora me fazendo ver que estava descalço. A roupa já estava suja e os cabelos bagunçados, uma verdadeira imagem de um estado pós foda. Tenho certeza que se o otário do elevador fizesse um bom trabalho, estaria vendo essa mesma imagem neste momento.

— Quem são vocês? — perguntou baixo, vendo que as três criaturas igualmente vestidas não tinham identidade para ela.

— Sem perguntas madame. — Kane puxa seu braço para distanciá-la, mantém a guarda do lado da garota e observa o nosso trabalho.

Dom e eu fazemos a transferência do dinheiro. Enfiamos o baú pesado sobre um motor dirigível e o homem o leva estrada adentro em direção ao cofre. No meio do trajeto, Kane sobe ao seu lado para ajudá-lo no armazenamento.

— Onde estamos? — pergunta a mulher.

— Não te interessa. — respondo outra vez.

Decidido a não olhar para a moça através dos óculos protetores que o capacete — embutido com a máscara anti tóxica — nos impõem, enfio os dedos nas amarras do pescoço, desfaço o lacre e livro minha cabeça do calor do uniforme.

Como eu imaginei. A cadela é bonita e tão branca quanto uma folha de papel. Os cabelos são mais negros do que a própria noite, os olhos tão azuis quando alguma outra merda bonita que eu não consegui comparar, mas a boca dela… A boca. Me deu vontade de rir. A boca não é grande, só é… Inchada. Inchada ao ponto de ter uma protuberância curvada para fora. Um boquete daquilo me faria gozar até vazar pelos seus ouvidos, e eu sorri com a ideia.

É claro que seu olhar não era o mesmo para mim. Ela tinha nos olhos um misto de horror e nojo, algo muito comum, que já não me incomoda mais. Fora o corte militar, meu rosto está rígido a muito tempo, de uma maneira que não consigo mais relaxar. Mas o pior de tudo, é a cicatriz. Um vergão grosso puxa meu lábio superior levemente para cima, passando à beira do nariz e terminando na beirada do olho esquerdo. Um filho da puta quase conseguiu arrancar minha face e de brinde, eu fiquei com um presente pela vida eterna.

Dei um passo para frente e ela deu dois para trás. Meus pés fincaram com força no chão e por alguma merda de motivo, aquilo me decepcionou. Pra piorar minha mente maldita, a mulher começou a correr. Impaciência, raiva e fúria brotaram de minhas narinas. Aquilo fez minhas mãos descer até as baias de armazenamento da farda, enfiar as mãos no buraco e puxar minhas lâminas finas de longo alcance.

Eu atirei, ela se assustou. Fiz de novo e ela cambaleou, até que na terceira ela finalmente caiu.

O primeiro lance é de aviso, alvo: qualquer coisa na sua linha de visão. Outra de advertência, alvo: qualquer parte que se rasgue sem lhe tirar sangue. A última é pra machucar, alvo: sangue, fruto de um raspão.

Atingi as beiradas de seu ombro, fazendo um corte doloroso e assustador, onde a mulher agora tampava o alto do braço coberto pelo seu sangue. Seu corpo, estirado no chão e agora olhando para mim, era como um jogo em que fui o maldito vencedor.

— Por favor… — implorou por algo que nem ela mesma sabia o que era.

— Não fode. — falei calmamente lhe estendendo a mão — Existem duas coisas que fazem o meu sangue ferver. Sua boca e brincar de “pegue a caça”. — Trêmula ela se pôs de pé, ficou perto de mais e se manteve encolhida.

Movido por um instinto e a sensação de adrenalina no corpo, passei a ponta do dedo no corte em seu ombro, enfiei a ponta vermelha às beiras da boca e senti o doce do sangue quente molhar a língua.

— Prêmio de caça. Iron “1” e secretária vadia “0”.

Ela engoliu em seco, hipnotizada pela cena e talvez com algum vestígio de terror crescendo dentro do peito.

— E se eu conseguir fugir? — murmurou, quase não conseguindo mover a boca.

— Então reze pra eu não te achar, porque o meu prêmio será a sua vida. — respondo direto. — Mova-se. — indico a ela o caminho da saída, onde mais uma vez seus passos permanecem em silêncio. — E nem pense em fugir.

Ela não devia ter fugido. Tentado, aliás. Pois dentro de mim, existe um monstro fodidamente maléfico brotando em minhas carnes. Se eu achei que a secretária vadia era só mais uma dor no saco, agora tenho a leve impressão que ela pode ser um alívio para as minhas bolas.

Uma distração no meio de tanta merda.

— Porque eu? — pergunta de cabeça baixa e choramingando suas palavras.

— Porque o destino é um otário, e nós somos joguinhos de entretenimento para esse sádico fodido.

Abri a porta do carro, dei a ela sinal de entrar e contra sua vontade ela se sentou. Chorou durante todo o trajeto, mas pelo menos parou de fazer perguntas. Ótimo. Agora eu só preciso me livrar dela, sem deixar rastros.

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